
Colo, filme de Teresa Villaverde, fala dos efeitos da crise nos afetos
A crise económica portuguesa, que teve o seu auge durante o período de intervenção da Troika, deixou marcas profundas na sociedade e muitas histórias. Teresa Villaverde, em Colo, filme do início de 2017 mas que só agora chega às salas, aborda a crise de forma particularmente subtil e elegante, indo muito além dos motivos meramente económicos ou descobrindo as suas sequelas. Colo é um filme que fala de um dos efeitos mais graves da carência financeira – a crise dos afetos, o desmoronamento das famílias, a queda dos pilares das pontes que unem as pessoas. E, com isso, torna o seu filme universal e intemporal, porque as suas premissas são válidas para qualquer crise, global ou particular.
Encontramos uma família já em queda, com um desequilíbrio estrutural difícil de remediar: ele não tem emprego, ela trabalha de dia e de noite para compensar. A filha, adolescente, cai no buraco que se abre entre a ausência física da mãe e a ausência psíquica do pai. Vemo-los derrapar numa progressiva carência afetiva, que só pode levar a uma implosão.
Os protagonistas não têm uma reação política contra o Governo, não buscam culpados para a sua situação, não dão qualquer sinal de consciência política, não se fala da Troika nem de nenhum governante. Eles apenas sofrem e acumulam progressivamente as mazelas; as feridas afetivas são ainda mais difíceis de sarar do que as financeiras. Vão caindo até que chegam ao fundo. E, então, reinventam- -se. Reconstroem-se em posições trocadas, numa espécie de instinto de sobrevivência. E é assim que este filme em queda – ao contrário de outros filmes negros da realizadora, como Os Mutantes – mesmo que termine num plano rasante, dá sinais de esperança. Ainda há qualquer coisa que se pode salvar.
Colo é um dos grandes filmes do cinema português recente, que demorou demasiado tempo a estrear. Tem um argumento subtil, magnífica fotografia e interpretações de excelência, sobretudo de Beatriz Batarda e João Pedro Vaz, mas também das jovens Alice Albergaria Borges e Clara Jost.
