Desengane-se quem espera de Beaumarchais uma ópera ao pé da letra. O espetáculo desenvolve-se a partir de três textos do dramaturgo francês – O Barbeiro de Sevilha, As Bodas de Fígaro e A Mãe Culpada –, com libreto, composição e direção musical de Pedro Amaral, e interpretação da Orquestra Gulbenkian, mas não se fica por aí. Jorge Andrade, da mala voadora, que assina a encenação e o texto original, retira a ação das peças do ambiente que lhes seria natural e transporta-a para um estúdio, montado no palco do Teatro Nacional D. Maria II, onde se prepara a sua gravação.
Daí surge um jogo teatral hilariante, criado a partir do confronto entre os músicos e os trabalhadores do estúdio de gravação (técnicos, relações públicas, etc.), com interpretações de Anabela Almeida, Bruno Huca, Isabél Zuaa, o próprio Jorge Andrade, entre outros. “Além de contarmos a história destas três óperas, interessava-me também explorar alguns elementos da obra de Beaumarchais: os equívocos, as intrigas e o conflito entre a classe trabalhadora e, neste caso, os músicos”, explica o encenador. O resultado é um jogo de teatro dentro do teatro, em que a dramaturgia se deixa contaminar pelo universo das peças de Beaumarchais, repleto de enganos e desenganos.
O espetáculo, uma encomenda da Fundação Calouste Gulbenkian, é o primeiro trabalho de Jorge Andrade numa ópera, mas o registo não está assim tão longe do seu modo de fazer teatro. “Trabalho muito a meta teatralidade, a desconstrução, os limites da linguagem… E a ópera tem esse lado em que já está a desconstruir uma qualquer realidade porque o género já é, em si, bastante artificial.”
Beaumarchais > Teatro Nacional D. Maria II > Pç. D. Pedro IV, Lisboa > T. 21 325 0800 > até 2 jul, qua 19h, qui-sáb 21h, dom 16h > €5€ a €17