O que têm em comum Sofia Teixeira Gomes, Ana Cunha, Cristina Carvalhal, Daniela Ruah e Fabiana Tavares? Apesar de trabalharem no meio artístico – encenação, produção, representação, fotografia ou publicidade –, nunca tinham estado atrás das câmaras na realização de um telefilme, à exceção da atriz Daniela Ruah, que, entretanto, realizou um episódio da série norte-americana Investigação Criminal: Los Angeles.
A ideia de convidar mulheres portuguesas a realizar as suas primeiras obras em televisão, a partir de livros de autores de língua portuguesa, surgiu na cabeça de Pandora da Cunha Telles, da Ukbar Filmes (produtora, entre outras, da série A Espia), durante o confinamento. Nessa altura, com as bibliotecas fechadas, valeram-lhe os alfarrabistas, que lhe enviaram os livros para que os lesse e selecionasse as histórias que dariam “um bom telefilme”. “Podíamos ter feito uns 30”, admite Pandora da Cunha Telles à VISÃO.
Para o projeto Contado por Mulheres foram escolhidos dez: os primeiros cinco telefilmes (com menos de 60 minutos) estão a ser exibidos, até meados de dezembro, às quartas, às 21 horas – o primeiro, As Vizinhas, realizado por Sofia Teixeira Gomes, estreou-se no passado dia 16, na RTP1. Os restantes cinco chegam em março do próximo ano.
“Foi a primeira experiência [só com mulheres] na realização de ficção de média metragem para televisão. Há um desequilíbrio no mercado e é esse o desafio que está a ser lançado à Europa inteira: o de descentrar os protagonistas que contam as histórias, demonstrando que pode ser igualmente interessante ter uma mulher ou um homem a contá-las”, aponta.
Do drama à comédia ou sátira, cada telefilme aborda temas que não escapam à atualidade: um jovem padre expulso do patriarcado, mas defendido pelo povo (inspirado em Bernardo Santareno), a condição de uma mulher viúva com uma filha (obra de Maria Judite de Carvalho), a crítica social num festim durante o jogo Portugal-Angola com um elenco de atores negros (Ondjaki) ou uma sátira à ganância e avareza (baseado no livro de Mário de Carvalho). “São realizadoras fantásticas, cada uma com um olhar e uma maneira de trabalhar diferente”, sublinha Pandora.
Descentralizar histórias
A seleção dos espaços cénicos – todos filmados na Região Centro – antecedeu a própria escolha das realizadoras. “Fomos num périplo tentar encontrar elementos para cada história”, conta Pandora da Cunha Telles.
Para As Vizinhas, uma adaptação do conto homónimo de Teolinda Gersão, sobre o reencontro na velhice de duas amigas de infância (interpretadas por Margarida Carpinteiro e Natalina José), a escolha recaiu sobre Avecasta, em Ferreira do Zêzere, muito por causa de um moinho debaixo do qual as duas protagonistas faziam promessas. Covilhã e a aldeia de Teixoso (A Traição do Padre Martinho), Ovar (Armários Vazios), Torres Vedras (Os Vivos, o Morto e o Peixe Frito) e Guarda (Quando o Diabo Reza) foram os restantes palcos escolhidos para esta primeira temporada.
“Queremos descentralizar histórias, quem as conta e onde é que as contamos. E trazer para o ecrã novos universos e novos territórios. Estamos muito centrados nos principais centros urbanos de Lisboa e do Porto, e isso também influencia o tipo de histórias que vemos”, continua a produtora.
Tomar, Oliveira do Hospital, Miranda do Corvo, Alcobaça e Cantanhede serão os cenários da segunda temporada, para a adaptação das obras A Hora dos Lobos, Serpentina, O Pio dos Mochos, Há-de Haver uma Lei e Jogo de Enganos, realizadas por Maria João Luís, Rita Barbosa, Laura Seixas, Anabela Moreira e Diana Antunes, respetivamente.
A antestreia de cada telefilme decorrerá, em cada um dos municípios, na segunda-feira anterior à sua estreia na RTP1, juntando-lhe oficinas e masterclasses nas escolas. “A ideia é que possamos devolver aquilo que nos foi dado, quer pela população quer pela cidade”, remata Pandora. “Este projeto foi uma experiência extraordinária, diria que um projeto de vida.”
Os 5 telefilmes
“As Vizinhas” De Sofia Teixeira Gomes, adaptação do conto de Teolinda Gersão (Ferreira do Zêzere) > 16 nov
“A Traição do Padre Martinho” De Ana Cunha, inspirado na obra de Bernardo Santareno (Covilhã) > 23 nov
“Armários Vazios” De Cristina Carvalhal, inspirado na obra de Maria Judite de Carvalho (Ovar) > 30 nov
“Os Vivos, O Morto e o Peixe Frito” De Daniela Ruah, inspirado na obra de Ondjaki (Torres Vedras) > 7 dez
“Quando o Diabo Reza” De Fabiana Tavares, inspirado na obra de Mário de Carvalho (Guarda) > 14 dez