Uma boa playlist musical é sempre um bom bálsamo para escolhas literárias. E disso damo-nos conta na Livraria Martins, aberta em agosto, na Avenida Guerra Junqueiro, que foi em tempos uma das principais artérias comerciais de Lisboa. O sítio não foi escolhido ao acaso: além da vontade de fomentar o contacto com os livros, o fundador, o empresário Gonçalo Martins, quis também estimular o comércio de rua. Por isso, construiu um projeto pensado ao detalhe, resultado de visitas a várias livrarias do mundo, mas com uma identidade própria.
A Martins é uma livraria independente, eclética, com cerca de 300 chancelas, que vão desde os grandes grupos editoriais às editoras mais pequenas, cujas escolhas são apresentadas sem obedecer aos habituais critérios de novidade. Em caso de indecisão, há uma equipa a aconselhar diferentes leituras. Os livros estão arrumados em dois andares, divididos por temas, com quatro áreas nas quais a Livraria Martins se diz mais forte: História, Biografia, Política e Literatura Infantil. Há ainda uma parede dedicada a Fernando Pessoa, um café com wi-fi e tomadas para trabalhar ao computador, e uma esplanada na rua a convidar a tempos de leitura. Até os cães são bem-vindos e recebidos com taças de água.
Na compra de qualquer livro, oferecem uma obra editada pela própria livraria – em novembro, o escolhido é O Triunfo dos Porcos, de George Orwell –, e estão também de portas abertas para lançamentos de livros e outras atividades.
Não muito longe, entre a Alameda e o Arco Cego, está a Livraria Miosótis, do casal Adelaide e Stevan Nikolic. Ela tradutora, ele autor, foi a paixão pelos livros que os juntou na vida e agora neste projeto, no qual cabem os lançamentos mais recentes, obras de História, Filosofia, Negócio, Economia, Poesia e Romance, mas também livros raros em segunda mão, guardados na vitrina ao pé do balcão, e outros a preços mais acessíveis, “uma forma de democratizar a leitura”, diz Adelaide.
O mobiliário foi herdado da papelaria que anteriormente ocupava este rés do chão na Avenida Rovisco Pais e está recheado de obras de editoras pequenas ou independentes, como a Adelaide Books, fundada, em 2019, por Adelaide e Steven. “Cada edição que pomos no mercado é feita com muito esforço e trabalho. Editamos pouco, mas publicamos aquilo que realmente gostamos e achamos forte”, dizem.
Também apostam na cultura mirandesa. De Astérix e O Principezinho a pequenas tiragens e exemplares bilingues, têm cerca de 30 títulos em mirandês. “Fazia sentido dar visibilidade à língua e são livros muito interessantes, no sentido em que abordam as tradições e vivências de uma região de Portugal”, afirma Adelaide. Já a literatura infantojuvenil tem um lugar especial, a Sala de Pequenos Leitores, que convida as crianças a descobrir livros como Eu Vou Cuidar de Ti, de Maria Loretta Giraldo, com ilustrações de Nicoletta Bertelle, uma edição da Adelaide Books integrada no Plano Nacional de Leitura. O último segredo desta livraria de bairro é a sala polivalente, onde têm lugar sessões de leitura, lançamentos e apresentações. “Aqui podemos dinamizar outro tipo de atividades culturais, complementares aos livros, e usar estas paredes brancas para expor o trabalho de artistas.”
“Parla italiano?”
Mesmo sem saber que livros moram no número 51B da Rua Cavaleiro de Oliveira, no bairro de Arroios, o sotaque dos clientes, e das responsáveis, dá uma pista. “Queríamos uma loja entre os Anjos e Arroios, onde há uma grande comunidade de italianos”, dizem Sara Cappai e Elisa Sartor, 37 anos, as fundadoras da livraria Piena. O espaço é relativamente pequeno, mas enche-se de leitores, entendedores e falantes, que “sentiam falta de uma livraria italiana”, ou de participantes dos clubes de leitura que aqui têm lugar.
A palavra piena tem vários significados e utilizações, entre os quais plena e cheia, que assenta que nem uma luva a esta livraria onde só entram livros escritos em italiano de autores nativos ou estrangeiros.
Elisa chegou a Portugal há mais de uma década, Sara veio em 2020 e na bagagem trazia experiência no mercado livreiro e no setor editorial independente em Itália. Em plena pandemia, começaram com um grupo de leitura. “Encontrávamo-nos em jardins e miradouros da cidade, mas o sonho de Sara era ter uma livraria”, conta Elisa.
A Piena abriu no final de junho deste ano, com uma seleção de livros à volta de temas como o antifascismo, o feminismo ou a diversidade, com os quais se identificam, e também com uma secção dedicada a editoras independentes. Tão livres quanto Sara e Elisa, anfitriãs da língua italiana neste bairro de Lisboa. * Com Mariana Correia de Barros
Onde encontrá-las
1. Livraria Martins
Aposta sobretudo em quatro áreas: História, Biografia, Política e Literatura Infantil. Tem um café com wi-fi e tomadas para trabalhar ao computador. Av. Guerra Junqueiro, 18, Lisboa > seg-dom 9h-21h
2. Livraria Miosótis
Tem uma boa oferta de livros infantojuvenis e também de livros em mirandês. Av. Rovisco Pais, 14 A, Lisboa > T. 91 829 8273 > seg-sáb 10h-19h
3. Piena
Livraria italiana, organiza encontros à volta dos livros. R. Cavaleiro de Oliveira, 51 B, Lisboa > T. 21 813 0755 > seg-sex 11h-19h30, sáb 10h30-18h30