É , sem dúvida, das alturas que Lisboa ganha outro encanto e o Tejo parece sempre novo. Ainda assente no que resta de muralha fernandina, esta torre do século XVIII é uma lufada de ar fresco num bairro claustrofóbico durante o dia, com apenas meia centena de moradores, mas milhares de turistas ruínas acima, vielas abaixo. Não precisamos de entrar no Castelo de S. Jorge para descobrir a renovada Igreja de Santa Cruz do Castelo e a sua torre sineira. Basta passar as bilheteiras do monumento, seguir até um pouco mais à frente e encontrar um amplo largo com a igreja pintadinha de fresco.
Abrir o património à vida cultural e turística dos bairros está na génese do trabalho diário do padre Edgar Clara, pois manter igrejas fechadas ou cobrar bilhete também não lhe faz sentido. Degradada, a Igreja de Santa Cruz do Castelo, no lugar onde se julga ter existido uma mesquita, estava ao abandono e a servir de poleiro aos pombos. “Tenho criado projetos sustentáveis para obter receita para as obras e a manutenção dos lugares”, explica o pároco da freguesia. Nesta igreja foi escuteiro e nessa altura tinha de se sentar no coro alto, perto do órgão, tal era a lotação esgotada nos bancos. “Agora, só celebro uma missa, ao sábado às cinco e meia, e quando tenho 15 pessoas sinto-me o Papa no Vaticano”, brinca.
Em parceria com a Signinum, empresa especializada em gestão de património cultural, o padre Edgar Clara garante o restauro da igreja, mais uma equipa de oito funcionários para vigiar e guiar as pessoas nas visitas diárias, cobrando bilhete apenas para subir à torre. É com a receita da torre que vai gerindo a manutenção da igreja, e trabalho de restauro não lhes falta. Apesar de esta não ser a igreja original (não sobreviveu ao terramoto de 1755) – nota-se que o telhado foi substituído nos últimos 40 anos ou que as colunas que parecem pedra afinal são de madeira – há algumas raridades a salientar. O batistério com uma escultura da Santíssima Trindade, em pedra de Ançã, do século XV ou um São Jorge de dimensão humana e as pernas arqueadas, pronto a ser levado pelos militares da GNR a cavalo na procissão de Nossa Senhora da Saúde, a mais antiga de Lisboa.
A subida à torre faz-se sem grande dificuldade, apesar dos 54 degraus da exígua escadaria. Lá em cima podem estar até 15 pessoas, em simultâneo. Os quatro sinos de bronze são de 1789, uma década após a construção da igreja. A panorâmica estende–se a São Vicente de Fora, à Ponte Vasco da Gama, ao terminal de cruzeiros de Santa Apolónia, ao Mar da Palha – ali estamos mais elevados do que nos miradouros da Senhora do Monte ou da Igreja da Graça. E só o repicar dos sinos interrompe o momento de contemplação.
Torre e Igreja do Castelo de S. Jorge > Lg. de Santa Cruz do Castelo, Lisboa > T. 21 580 6032 > seg-dom 9h-21h (verão), até 18h (inverno) > €2, €3 (acesso rápido, sem espera), €6 (visita guiada) > torredaigrejadocastelo.pt