“Encontrei Mário Cesariny numa das estações da minha viagem pessoal e daí fiz já com ele o meu caminho, embora numa classe diferente (pode aplicar-se a Mário o que ele disse uma vez de Pessoa: que viajou sempre em primeira classe; claro que a seguir acrescentava, em jeito de consolação, que isso das classes só tinha interesse para os que não viajavam nunca). Falar de Mário é falar do Surrealismo, e falar do Surrealismo é falar duma moral, duma ética e duma subsequente política, é falar, em termos bretonianos, de um projeto que ainda não foi, um projeto que continua a ser, que será sempre.” São palavras do tradutor e académico Perfecto E. Cuadrado sobre o poeta, “um homem livre e luminoso que cada dia inaugurava o dia na noite da caverna e que soube encontrar mil tempos novos para o verbo amar”. Ele encontrou Cesariny (1923-2006), primeiro nos livros e nas “falas de amigos já transformados pela sua magia”.
Agora, faz a evocação do “seu” Mário em Poesia, uma edição anotada, iluminadora da obra que admite as palavras como efetivo “metal fundente”, “hélices”, “altas flores venenosas”, dando conta das interpretações inerentes à sua escrita. Este belo volume, que segue a ordem de publicação dos livros originais autorizada pelo próprio Cesariny, não é uma obra completa (pictopoemas, poemas-colagem e manifestos serão integrados em volumes futuros), mas é um ambicioso objeto de desejo, encerrado com Outros Poemas (poemas dispersos), para um reencontro jubilatório com os leitores, os de sempre e os que serão agora bem-vindos em Elsinore e arredores.
Poesia (Assírio & Alvim, 776 págs., €44) reúne os livros fundamentais de poesia de Mário Cesariny, a abrir com Manual de Prestidigitação, passando por Pena Capital, Nobilíssima Visão, A Cidade Queimada, Primavera Autónoma das Estradas e O Virgem Negra.