
Da minuciosa biografia política de Álvaro Cunhal, encetada por José Pacheco Pereira em 1999, saiu agora o 4.º volume, dedicado aos anos de 1960 a 1968. Os passos do líder comunista português continuam a ser seguidos, não já pela PIDE mas pelo leitor interessado, ora na cadeia ora naquela relativa liberdade que é a vida sobressaltada dos clandestinos. Poucos temas, na nossa História do séc. XX, terão tanto interesse como a guerra surda entre um poder autocrático tentacular e um punhado de resistentes decididos a sacrificarem a vida pessoal pelo brilho de uma causa tida como redentora da Humanidade. As décadas em que os amanhãs cantavam e em que o perigo cimentava as coragens individuais de que é feita a coragem coletiva são escalpelizadas nos múltiplos encontros, desencontros, desvios, cisões, traições, terrores e mitos de que se fez o combate entre um punhado de corajosos e a polícia política do Estado Novo nos seus diversos avatares (PVDE, PIDE, DGS).
Como tabernáculos da Liberdade, os franceses têm a Resistência, que pouco mais é do que um curto conto de fadas, e os americanos o western, forma rude de cultuar valores nem sempre solidários. Nós poderíamos ter esta odisseia de so few contra so many, desde que assumida em liberdade de consciência. Este volume inicia-se após a fuga de Cunhal de Peniche, em 1960, e encerra com os debates em torno da invasão de Praga pelos tanques do pacto de Varsóvia, que o líder comunista português defendeu contra as posições de muitos camaradas. Desenvolvia-se por essa altura o conflito sino-soviético, que cindiu o movimento comunista e levou ao nascimento de uma nova extrema-esquerda. Exatamente ligado na juventude às correntes maoistas, Pacheco Pereira seguiu depois a estrada de Damasco de muitos resistentes do tempo do marcelismo, mas, à diferença de outros, sem nunca esquecer, se não as raízes, pelo menos o lado da barricada em que a sua consciência o posiciona. Ficamos a aguardar o próximo volume, com o 25 de Abril e o aparecimento de Álvaro Cunhal à luz do dia.
Depois de Daniel, o Jovem Revolucionário (1913-1941), Duarte, o Dirigente Clandestino (1941-1943) e O Prisioneiro (1949-1960), chega agora Álvaro Cunhal, Uma Biografia Política. O Secretário-Geral (Temas e Debates/Círculo de Leitores, 470 págs., €24,40)