Tirando o gosto por forrar cadernos ou uns desenhos “sinistros” que rabiscava, distraída, nas aulas do curso de Economia, sempre achou que o jeito para as artes tinha ficado na mãe. Nesse caminho, havia talvez um pormenor que funcionava como escape criativo.
Joana Dornellas chegou a ter um blogue chamado A Refinaria (transformado depois numa conta no Instagram), no qual publicava todos os dias alguma coisa que visualmente lhe interessava: arte, arquitetura, roupa, ideias, textos… “Tenho uma cabeça um bocado obsessiva, pode ser com o trabalho, com a família, com o número de pessoas contaminadas com Covid…”, confessa. “Percebi que precisava de fazer alguma coisa com as mãos.”
Os primeiros desenhos que fez foi com as aguarelas dos filhos. Frente a uma folha em branco, pintava sem grandes expetativas de que dali saísse algo perfeito. “Comecei a ter prazer naquilo que estava a fazer. O que partilho é a minha celebração de que consegui fazer qualquer coisa, mas também não tenho falsas modéstias porque os meus desenhos não são perfeitos, nem são bem feitos.”
Joana pinta flores despenteadas (“são simples e coloridas”), aventura-se nas naturezas-mortas e em mesas de pequeno-almoço, brinca com pratos cada um de sua nacionalidade. Mais recentemente, pegou em frases soltas que se ouvem por essas pastelarias e cafés de Lisboa e desenhou-as em folhas A4: “A mousse é caseira?”, “Queria, já não quer”, “Passa a duas”, “O doce da casa leva o quê?”…
Nos momentos em que não ouve a palavra “mãe” nem “Joana” (é gestora de marketing), pega no pincel e solta a mão esquerda. “Sai muita borrada”, diz, “são muitas folhas que viro ao contrário para fazer cadernos de rascunho, mas saem muito mais coisas do que alguma vez imaginaria”.
“Acho que tenho sensibilidade. Sei o que gosto e o que não gosto, tenho noção de espaço e de cor, que fui aprendendo com o que vi, com as secas nos museus que a minha avó me dava”, ri-se. A sua mente obsessiva dá-lhe para ir estudar sobre o assunto, ver o que andam a partilhar as suas artistas preferidas (a portuguesa Graça Paz e a norte-americana Sandi Hester).
Hoje faz um croissant em três tempos com acrílico, o material que tem a intensidade de cor que precisa. “A pintura é um treino, dizem os artistas, não eu.” Joana sabe que as suas pinturas são para quem gosta desse lado “descontraído e trapalhão” do seu trabalho e que até acham graça a uma jarra que não está centrada.
Tudo o que lhe parecer difícil de desenhar, soa-lhe a desafio. “É como fazer caramelo na cozinha”, compara. Só não lhe peçam para pintar uma mesa com uma língua de vaca.
À venda na Apaixonarte e no Atelier Cebola, em Lisboa, e também na loja online joanadornellas.com