Gaba-se de ter “o mais antigo foral de que há memória”, anterior ainda à fundação da Nacionalidade e de ser o concelho com maior área dentro do território do Alto Douro vinhateiro, reconhecido pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade. Mas, a “Pesqueira”, como é carinhosamente tratada pelos que lá vivem e pelos muitos mais que de lá saíram, tem outros motivos para se orgulhar. Em vésperas da realização da VIII edição da VINDOURO, a festa do vinho, que decorre este fim-de-semana, a vila começa a engalanar-se para receber mais do que os 15 mil visitantes que por lá andaram no ano passado.
Antecipada para o mês de Agosto, por reclamação dos muitos emigrantes do concelho, a festa é uma celebração do vinho e da vinha, uma espécie de cerimónia de boas vindas às vindimas que se aprestam para começar. Além da animação de rua o destaque do programa vai para o Mercado Pombalino que se realiza durante três dias no centro histórico, com figuras vestidas a rigor, em homenagem ao marquês, que por ali passou e foi o grande responsável pela criação da primeira região demarcada do mundo. A festa finaliza com o leilão de vinhos generosos, um momento sempre muito aguardado pelas gentes do Douro.
Como quase tudo o que vale realmente a pena, São João da Pesqueira não fica à mão de semear. Não é lugar de passagem, é preciso querer mesmo lá ir. Tanto de sul como de norte, a auto-estrada fica-se pela Régua. Daí até às portas do Pinhão ainda faltam uns bons quilómetros para palmilhar. Porém, o verdadeiro teste para quem está decidido a perder o fôlego só chega com a sucessão de curvas e contra-curvas da subida da serra até ao cimo da vila. A Pesqueira fica mesmo no alto, logo depois de passada a placa para o monte da Senhora do Vencimento.
E é daí, do alto, que melhor se avista também a aldeia de São Xisto. Ao longe, do miradouro de São Salvador do Mundo, ou simplesmente “o Ermo”, como o designam os locais, a paisagem é soberba. De um lado o rio que vem de Leste contornando as encostas agora cobertas de vinhas carregadinhas de uvas mesmo a pedir pelo começo da vindima. Do outro o cachão da Valeira, o local onde, depois do barco virar, morreu o Barão de Forrester, dizem, porque tinha o cinto e os bolsos carregados de moedas. Dona Antónia Ferreirinha, que o acompanhava, livrou-se da mesma sorte flutuando até à margem com a ajuda das saias de balão. Outros tempos, que agora as águas foram amansadas pelas barragens.
É por isso um rio mais tranquilo aquele que corre bem juntinho à aldeia que Narciso Lopes e o filho, Mário, parecem dispostos a recuperar. Logo após o cais da Ferradosa, a pouco mais de meia centena de metros da margem fica “São Xisto, Aldeia de Portugal”, lê-se na placa de…xisto, claro. Há cerca de duas dezenas de anos a aldeia chegou a ter quase 50 pessoas, hoje não são precisos os dedos de uma mão para os contar. Três, para ser mais exacto: o senhor Valdemar, Maria Adelaide, a mulher e a prima Adília Sequeira. Proprietários da Quinta de São Xisto, que abrangia algumas das casas da aldeia, Narciso e Mário Lopes, aos poucos têm vindo a adquirir e recuperar parte significativa do edificado. Manter a traça típica, com o exterior em xisto, sem reboco, preservando as tradições, “com os melhoramentos necessários ao conforto” foi, garante Mário, o lema que procuraram seguir. Até ao momento, a aldeia tem já sete casas prontas e a funcionar em regime de turismo rural. Da casa do Palhal, a mais pequena, até à casa Senhorial, a maior – com capacidade para oito pessoas – passando ainda pela da Forja e Pélebe, da Raposa, do Joanito ou do Caseiro. Equipadas com o fundamental, ou até o acessório, como o serviço de televisão por satélite, as casas são também servidas por uma piscina e um espaço de churrascos que pode ser utilizado por todos os hóspedes. Além disso, na parte mais baixa da quinta há ainda duas camaratas para quatro pessoas que Mário Lopes ocupa quase sempre com amigos e ainda uma lavandaria. O objectivo, resume o proprietário, “é que as pessoas se sintam confortáveis e sejam perfeitamente autónomas”.
Foi também esse o desejo de Narciso, o pai, fundador da confraria “O Rabelo”, criada com o objectivo de preservar e difundir a cultura duriense. E é isso que este empresário, dono de uma das primeiras empresas de reciclagem de plásticos do País, não se tem cansado de fazer. “É um verdadeiro relações públicas e uma das pessoas, senão mesmo, a pessoa que mais tem procurado levar a cultura do concelho bem longe”, garante, suspeita, a mãe. De uma simpatia transbordante, Angelina Sequeira é, aos 82 anos, um poço de sabedoria. Apesar de viver uns quilómetros mais acima, em Vale Figueira, tem uma visão privilegiada sobre a aldeia e sabe tudo o que lá se passa, desde os hóspedes que lá estão, em que casa e até quando. Ferroviária de quase toda a vida como, de resto, muitos dos que ali nasceram, Angelina está sempre disposta alinhavar mais uma história. E nem é preciso puxar muito por ela.
O que fazer
Com a chegada de Setembro, quase todas as atenções dos durienses estão viradas para as vindimas. O mesmo acontece com boa parte das actividades destinadas aos turistas. No concelho de São João da Pesqueira há diversas quintas abertas ao público onde é possível inscrever-se para participar. A Quinta Senhora do Rosário, (www.quevedo.pt) por exemplo, possibilita a participação no corte da uva, bem como a visita à adega e às caves de envelhecimento, terminada com uma prova de Vinho do Porto em casco. A Real Companhia Velha, (www.realcompanhiavelha.pt/quintas.cfm) proprietária da Quinta das Carvalhas e da Quinta de Ventozelo (www.quintadeventozelo.com) também lhe possibilita isso além de uma novidade estreada em finais do ano passado: percursos pedestres. O programa proposto pela RCV custa 30 euros e inclui os passeios pelos vinhedos, almoço tradicional e provas de vinho. De resto, um pouco por todo o concelho, bem como no resto do Alto Douro vinhateiro, diga-se, não faltam quintas que abrem as suas portas para as tradicionais lagaradas, a pisa das uvas no lagar, acompanhadas de cantoria.
De visita quase obrigatória é também o armazém da Messias, mesmo junto ao cais da Ferradosa. A avaliar pela inscrição num dos tonéis, datado de 1853, é de supor que seja um dos mais antigos de toda a região duriense. Narciso Lopes, um dos mais fiéis visitantes chama-lhe mesmo “a sinagoga do Messias”. Além de que é uma magnífica oportunidade de provar alguns dos bons e antigos vinhos generosos.
Se sentir vontade de maiores caminhadas pode sempre optar pelos tradicionais percursos pedestres pelo concelho. A Pesqueira tem até ao momento cinco caminhos reconhecidos pela federação: a rota dos Castanheiros, a dos Vinhos, das Amendoeiras, das Oliveiras e a grande rota dos Vinhos da Europa. Sobre qualquer um dos percursos pode solicitar mais informações no Posto de Turismo da vila.
Com 203 quilómetros de extensão, a linha férrea do Douro, grande parte dela desenvolvida mesmo junto às margens do rio, é outro dos atractivos e um passeio no Comboio Histórico é quase obrigatório. As reservas e programas podem ser consultados na página da Douronet (www.douronet.pt).
Na Pesqueira merece também uma visita o museu da vila onde estão expostas obras do grande mestre da arquitectura Eduardo Tavares e a sala de arqueologia.
Entre os dias 9 e 13 de Setembro, vai ter lugar a 1º edição do Douro Film Harvest com uma homenagem ao realizador Milos Forman. Uma das secções em exibição tem por título “Wine Films” e visa demarcar a simbiose entre a indústria do cinema e o património vinícola existente no mundo. O festival decorre em Vila Real, Lamego, Torre de Moncorvo e Santa Marta de Penaguião.
Programa radical
Numa zona tão propícia a desportos de aventura, também não faltam actividades mais radicais. A Naturimont (www.naturimont.com), a Pesqueiraviva (www.pesqueiraviva.com) e a Trat (www.trat.pt) são algumas das empresas responsáveis pela organização de vastos programas onde se destacam, naturalmente, os passeios de barco.
Outros alojamentos
Uma das maiores carências da Pesqueira está mesmo ao nível do alojamento. Para além do turismo de habitação da aldeia de São Xisto, na vila há apenas a Residencial do Marquês . A alternativa surge nos vizinhos concelhos de Penedono ou Tabuaço ou então no parque de campismo do Parque da Mata do Cabo. Além de espaço para campismo e caravanismo, o parque dispõe também de piscina ao ar livre, parque infantil, circuito de manutenção, um relvado sintéctico para futebol, courts de ténis e campo de mini-golfe.
O mais ambicioso projecto para o concelho, o Decanter Douro Hotel, um empreendimento das Caves Messias, que prevê 31 quartos, junto ao cais da Ferradosa, ainda está em fase de avaliação.
Onde comer
Um dos mais afamados e melhores restaurantes do Douro fica mesmo a caminho da Pesqueira, na EN 222, em Folgosa (Armamar). O DOC, do chefe Rui Paula tem, ainda para mais, um belíssimo enquadramento, mesmo na margem do rio. Mais em conta, o Soto Queimado, em Ferradosa, é uma excelente alternativa. No Verão, a esplanada, junto a um braço de rio em que a água está quase parada, pede mesmo um mergulho antes de se deliciar com os petiscos que vão desde o peixe do rio até ao javali.