Ninguém gosta de estar stressado. No trânsito, no trabalho, em casa ou, ainda, quando se está em multitasking, a apagar vários fogos ao mesmo tempo. Embora seja o pão nosso de cada dia, a resposta ao stresse, ou seja, a estímulos e situações que percecionamos como ameaças no quotidiano, é normal e gera algum desconforto, mas o mais certo é adaptarmo-nos à sua presença e aprendermos a lidar com ele. Se assim é, porque tem tão má fama?
“Stress não é sinónimo de doença e, muito menos, de doença mental”, esclarece a psiquiatra Maria Veludo Chai, do Hospital CUF Tejo, em Lisboa, e “relaciona-se com fatores ambientais, atuais, externos ao indivíduo”. E, apesar de se poder pensar o contrário, até pode ser positivo, pois “faz-nos acelerar para chegar a horas ou cumprir prazos”. Trata-se de uma resposta fisiológica complexa, que envolve reações físicas e psicológicas, e é comum ter uma conotação negativa, “por oposição às pessoas que são tranquilas”.

No campo da Saúde Mental, “temos a reação aguda ao stresse e o stresse pós-traumático, hoje encarado como a resposta normal a um evento traumático que ameaça a integridade física, pela sensação de perda de controlo, como sucede num assalto, acidente violento, abuso, violência sexual ou em cenários de guerra”.
O problema começa quando o stresse se torna “intenso, frequente e crónico, por predispor a doenças mentais como a ansiedade e a depressão ou, sendo no contexto laboral, ao burnout”. Aí, converte-se num inimigo da saúde, sendo um fator de risco para o aparecimento de outras doenças, cardiovasculares, neurológicas, metabólicas ou outras. Problemas como a síndrome do cólon irritável, o refluxo gastroesofágico, as úlceras, a diabetes, a queda de cabelo, entre outros, “atingem um grande número de pessoas”.
O que podemos fazer para amortecer os efeitos do stresse nas nossas vidas e aprender a fazer dele um aliado, em vez do nosso pior inimigo?
Mecanismos de adaptação
A reação ao stresse é individual. “Uma pessoa mais organizada e pontual sente stresse só na iminência de estar atrasada; outra, que não é pontual, pode estar meia hora atrasada e com várias pessoas à espera, encara a situaçao como inofensiva”, exemplifica a médica.
A forma como se lida com os stressores também varia: “A primeira vez que se anda de avião pode ser stressante mas se o fizer muitas vezes deixa de sê-lo, porque se arranja estratégias para lidar com isso”.
Ter uma doença crónica compromete a qualidade de vida e é, também, um fator de stresse. Dar a volta é possível e implica encontrar novas formas de adaptar-se a ela: “Se a doença limitar a atividade física, mesmo que não se faça noitadas é possível organizar um jantar em casa.” A ideia é reinventar-se e “manter mecanismos saudáveis, em vez de entrar em modo de compensação, alimentar, por exemplo, que aumenta o stresse e agrava a doença.”
Na esfera profissional, o stresse é um tema, como atestam os dados mais recentes divulgados pela Ordem dos Psicólogos Portugueses: em dois anos, os problemas psicológicos aumentaram 60% e terão custado às empresas até 5,3 mil milhões de euros.
“Chegam-me queixas de que não são donos da própria agenda, por haver sempre imprevistos, multitasking e imposição de prontidão absoluta e no período de descanso nunca sabem se ele vai acontecer; tudo isto gera muito stresse”, confirma Maria Veludo Chai, deixando uma nota: “Um trabalhador que esteja tranquilo, calmo e com a sensação de autocontrolo vai ser mais eficiente.”
Escapes e estratégias
Uma das razões que leva as pessoas a perderem o pé é quererem resolver tudo, deixando-se para o fim. “Em situações de stresse, prioriza-se o trabalho e o apoio à casa e à família, mas abdica-se dos escapes que permitem geri-lo, como a socialização, os hóbis e a atividade física”, observa. Estes escapes são fundamentais e é deles que a médica fala nas consultas: “Ao partilharem problemas percebem que não estão sós e aprendem a banalizar a desvalorizar e a conviver com o stresse. “
Na prática, basta estar tranquilo para ser mais funcional, “criando distanciamento para lidar com imprevistos e ter algum controlo pessoal”. O perfecionismo deve ficar fora da equação – “Se não ler o romance inteiro, ler um capitulo; se não for todos os dias, durante dois ou três” – e o princípio aplica-se à a atividade física: “Não é preciso ir para o ginásio, só o facto de fazer caminhadas aumenta a resistência física, reduz sintomas e aumenta a sensação de bem-estar.”
O ambiente doméstico e a vida conjugal e parental. A ciência está em reduzir o nível de expetativas e, mais uma vez, em normalizar situações comuns, como aceitar que os conflitos, equívocos de comunicação e críticas fazem parte do processo. Fazer ajustes dinâmicos é o caminho.
Por fim, algo sem o qual nada destas coisas funciona: Dormir bem. “Uma pessoa que esteja tranquila, descansada e tenha dormido bem tem muito maior capacidade de conseguir encontrar soluções e mecanismos naturais para lidar com a sobrecarga.”
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