Uma das explicações mais justificadas pelos médicos para a causa da depressão está agora a ser posta em dúvida, no seguimento de um novo estudo realizado por especialistas da University College, em Londres.
Os baixos níveis de serotonina per si não são a principal causa de depressões, conclui o novo estudo, composto de vários níveis de análise ao neurotransmissor cerebral que estabelece a comunicação entre as células nervosas. A molécula, também conhecida por hormona da felicidade, produzida a partir do aminoácido triptofano (obtido através dos alimentos) regula o humor, o sono, o apetite, o ritmo cardíaco, a temperatura corporal, a sensibilidade e as funções cognitivas, por isso, quando a sua produção escasseia, o mais natural, é que a boa disposição não seja a melhor, provocando também dificuldade em dormir, ansiedade ou depressão.
É comum tratar o estado depressivo com um grupo de antidepressivos, ao qual se dá o nome de inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), sendo o Prozac um dos mais conhecidos em todo o mundo.
A investigação de um conjunto internacional de cientistas, sedeados na Divisão de Psiquiatria, da londrina University College, no Reino Unido, alerta agora de que a teoria da depressão da serotonina deve ser descartada, uma vez que não existem evidências fiáveis, de acordo com a sua mais recente revisão publicada na revista científica Molecular Psychiatry.
Este grande estudo, liderado por Joanna Moncrieff, psiquiatra e académica britânica, abrangeu diversas vertentes de pesquisa sobre a ligação entre a serotonina e depressão, ao rever as 17 principais linhas de pesquisa sobre o assunto, publicadas anteriormente.
Foram analisados os níveis de serotonina e a sua degradação no sangue e no líquido da medula espinhal, relacionando-os com a quantidade no cérebro, que não é seguro medir diretamente em pessoas vivas. A conclusão não mostrou diferença entre os doentes clinicamente deprimidos e os saudáveis.
Depois de os neurónios reabsorvem a serotonina, cabe à molécula fazer o seu trabalho, que graças aos ISRS está mais disponível. Num outro nível, o estudo examinou as proteínas recetoras que respondem à serotonina e aos transmissores, através dos quais ela é reabsorvida. Ocasionalmente, encontraram indicações de maior atividade da serotonina em pessoas com depressão, o oposto do que se poderia esperar. Joanna Moncrieff calcula que isso pode resultar do uso de antidepressivos, algo que nem sempre é levado em conta quando comparadas pessoas com e sem depressão.
Uma terceira linha de pesquisa centrou-se na evidência de a serotonina ser feita a partir de triptofano, um aminoácido que o corpo não consegue sintetizar e, portanto, deve ser ingerir através da alimentação, em queijo, frutos secos, ovo, abacate, batata ou banana, por exemplo. Nessa experiência, os níveis de serotonina dos participantes ficaram reduzidos ao serem privados de triptofano. Mas, dessa forma, a redução da serotonina não levou à depressão em centenas de voluntários saudáveis.
Por último, também a questão genética foi esmiuçada pelos investigadores, não tendo sido encontradas diferenças entre os genes que regulam o transmissor de serotonina em quem está deprimido e em quem está de bom humor.
“A teoria do desequilíbrio químico da depressão ainda é apresentada por profissionais, e a teoria da serotonina, em particular, formou a base de um considerável esforço de pesquisa nas últimas décadas. A ideia de que a depressão é o resultado de um desequilíbrio químico também influencia as decisões sobre tomar ou continuar a medicação antidepressiva e pode desencorajar as pessoas a descontinuar o tratamento, potencialmente levando à dependência dessas drogas ao longo da vida”, afirmam os investigadores.
Por tudo isto, conclui o Economist, se a serotonina não é a causa da depressão, é tempo de questionar os ISRS, classe de medicamentos que inclui fluoxetina, citalopram e sertralina, capaz de ajudar alguns novos pacientes, mas não todos, e com possíveis efeitos colaterais consideráveis, como sejam a perda de libido, a incapacidade de atingir um orgasmo e a própria dependência da substância.
Com a prática clínica a alterar a forma de prescrever tratamentos, tendo em conta os gatilhos ambientais para a depressão, a mesma publicação sugere que é necessário entender quem mais beneficia com a produção de ISRS, pois sem a hipótese da serotonina, os profissionais de saúde voltam à estaca zero.