Um novo estudo realizado no Qatar sugere que a vacina da gripe pode ajudar a prevenir a transmissão do vírus SARS-CoV-2. No âmbito do estudo, que tinha como objetivo principal comparar o nível de resistência à Covid-19 entre pessoas que tomaram, ou não, uma vacina contra a gripe, foram observados por volta de 30 mil profissionais de saúde daquele país.
Os resultados foram claros: os que optaram por uma vacina contra o vírus influenza tiveram menos 90% de probabilidade de contrair casos mais graves de Covid-19 e menos 30% de probabilidade de ser infetado por SARS-CoV-2, pelo menos nos primeiros meses após a toma. Para alcançar esta conclusão, publicada inicialmente a 10 de maio, os cientistas observaram e contrastaram com maior atenção a evolução do estado clínico de 518 pessoas que contraíram Covid-19 e 2 mil que testaram negativo.
A equipa de investigadores escolheu apenas observar profissionais de saúde de forma a minimizar as assimetrias entre os participantes em termos de exposição individual à Covid-19. A lógica é a seguinte: devido ao seu local de trabalho, os profissionais de saúde têm todos, em teoria, níveis muito semelhantes de exposição a pessoas infetadas com SARS-CoV-2 (pelo menos durante o dia). Desta forma, é mais fácil localizar o efeito da vacina da gripe quando se comparam os dados de um largo espetro de participantes, sendo também possível diminuir algum potencial viés na futura interpretação – como o gerado quando, por exemplo, se compara um enfermeiro que trabalha diariamente numa ala hospitalar de Covid-19 e uma pessoa em regime de teletrabalho que evita sair de casa.
O estudo, liderado por Laith Jamal Abu-Raddad, epidemiologista na Weill Cornell Medicine–Qatar, na cidade de Doha, não pode deixar de ser visto no contexto da procura mundial por alternativas credíveis às vacinas de Covid-19, especialmente as que tenham menos custos associados e possam ser mais facilmente distribuídas pelos países em desenvolvimento. Vários outros estudos já observaram esta suposta relação entre as vacinas da gripe e a resistência ao coronavírus, daí Günther Fink, um epidemiologista na Universidade de Basileia, na Suíça, afirmar que a análise de dados do Qatar deixa a medicina mais perto de provar a validade desta conexão.
Mesmo assumindo que as vacinas contra a gripe ajudam no combate pandémico, Abu-Raddad e os seus colegas assinalaram que não foi possível precisar por quanto tempo duram os benefícios das mesmas. Segundo as observações, alguns dos trabalhadores começaram a ser infetados com SARS-CoV-2 passadas, em média, 6 semanas após terem tomado a vacina da gripe, pelo que o médico admitiu que “não estou de todo à espera que este efeito dure muito tempo”.
Para Mihai Netea, uma investigadora dos Países Baixos que se tem dedicado precisamente à mesma linha de investigação, os efeitos positivos poderão prolongar-se entre 6 meses e 2 anos. Netea sugere também uma razão para a aparente eficácia das vacinas da gripe na limitação do contágio de Covid-19: as vacinas convencionais fortalecem os mecanismos de defesa antiviral do corpo humano, deixando as pessoas que as tomam mais resistentes à transmissão e mais capazes de lutar contra as infeções já contraídas.