“Confirmo a doença [cardiopatia reumática] e que o exame ocorreu em 2012, mas nada disto faz ainda parte das nossas submissões. Apresentaremos em devido tempo os relatórios necessários ao tribunal”, afirmou a advogada June Marks à Lusa, assinalando que “o novo relatório contém informações médicas confidenciais, como tal não deve ser discutido”.
Em causa está a notícia avançada hoje pelo Público, que deu conta da junção de dois documentos pela defesa: uma carta assinada em fevereiro por um cardiologista a confirmar que observou o antigo banqueiro em 2012, em que um ecocardiograma revelou fibrose da válvula aórtica e mitral; e um relatório médico assinado pelo psiquiatra João Vilas Boas, que atesta que João Rendeiro tem cardiopatia reumática, recomendando condições seguras e de baixo risco.
Este especialista foi já condenado em 2012 pelo Supremo Tribunal de Justiça em 100 mil euros por ter feito sexo sem consentimento com uma paciente grávida de oito meses em pleno consultório, depois de ter sido condenado em primeira instância, em 2010, a cinco anos de pena suspensa e uma indemnização de 30 mil euros pelo crime de violação e de o Tribunal da Relação do Porto o ter absolvido em 2011, tanto na parte criminal como cível.
Confrontada com esta situação, a mandatária de João Rendeiro desvalorizou, garantindo que “não tem relevância nem qualquer efeito” sobre as pretensões da defesa do antigo presidente do BPP, que aguarda o julgamento do processo de extradição na prisão de Westville, em Durban, na África do Sul, onde está detido desde dezembro de 2021. O julgamento irá decorrer entre 13 e 30 de junho, com uma audiência preparatória agendada para 20 de maio.
“A tentativa de criar um escândalo sexual é muito infeliz e é, claramente, uma tentativa de causar embaraço, nada mais. Não é relevante. De qualquer forma, não íamos utilizar esse relatório. O aspeto sexual não tem qualquer relevância. Só se destina a embaraçar”, disse. Contudo, June Marks recusou comentar o facto de o relatório médico relativo a uma doença cardíaca ser assinado por um psiquiatra.
Em relação a este aspeto, a Lusa questionou também o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, que, sem se alongar em comentários, admitiu que “qualquer médico de qualquer especialidade pode passar um atestado” relativamente a um doente e que esse é “um ato médico básico”.
“Quando é confrontado com a doença de uma pessoa que o consulte, se o médico achar que não está em condições de trabalhar, pode passar-lhe um atestado, mesmo que, presumivelmente, a situação clínica daquele doente não seja da sua especialidade”, referiu.
O psiquiatra chegou a ser expulso em 2013 pelo Conselho Disciplinar da Ordem dos Médicos do Norte, mas, de acordo com o Público, a expulsão foi anulada em 2020 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, por considerar que o prazo para instaurar o processo disciplinar já havia prescrito, inviabilizando assim também a sanção aplicada.
O ex-banqueiro foi condenado em três processos distintos relacionados com o colapso do BPP, tendo o tribunal dado como provado que retirou do banco 13,61 milhões de euros. Das três condenações, apenas uma já transitou em julgado e não admite mais recursos, com João Rendeiro a ter de cumprir uma pena de prisão efetiva de cinco anos e oito meses.
João Rendeiro foi ainda condenado a 10 anos de prisão num segundo processo e a mais três anos e seis meses num terceiro processo, sendo que estas duas sentenças ainda não transitaram em julgado.
O colapso do BPP, em 2010, lesou milhares de clientes e causou perdas de centenas de milhões de euros ao Estado.
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