Desde o início da pandemia de Covid-19 que os problemas respiratórios, no qual se insere a asma, têm sido uma preocupação para a comunidade científica, mas, também, para quem deles sofre. Como explica a Organização Mundial de Saúde (OMS) entre as pessoas que mais temiam a infeção por SARS-CoV-2 estavam as que já sofriam de doenças respiratórias, especialmente asma.
Apesar de não haver consenso se a asma agrava (ou não) a infeção causada pelo vírus e a consequente hospitalização, com o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA a afirmar que sim, e a OMS a contrapor que ainda não há dados suficientes para o dizer, há um aspeto em que os vários estudos parecem concordar: com a pandemia de Covid-19 os ataques de asma reportados nos hospitais diminuíram.
Essa conclusão está presente em três diferentes estudos publicados na revista médica especialista em medicina respiratória, a Thorax, e num estudo na OMS. O primeiro estudo foi realizado no Reino Unido, com um maior foco em Inglaterra; o segundo na Escócia e no País de Gales; o terceiro trata-se de uma pequena investigação da Coreia do Sul. E há ainda um estudo da OMS, também realizado no Reino Unido.
Os três estudos da Thorax analisaram a procura de cuidados médicos no que refere a ataques de asma, comparando os dados existentes pré-Covid-19, com os reportados durante a pandemia. Apesar de nenhum dos estudos apresentar uma conclusão concreta do porquê desta diminuição, os investigadores apontam algumas hipóteses tais como: as mudanças comportamentais na procura de cuidados médicos (devido ao medo dos hospitais) ou na gestão da asma, a menor poluição do ar e menor exposição a alergias sazonais (uma vez que as pessoas começaram a passar mais tempo em casa).
Reino Unido (Inglaterra)
No estudo realizado no Reino Unido foi possível observar que o número de incidentes baixou dos 46 por 100 pessoas para os 23. Foi analisado o período entre janeiro de 2016 e agosto de 2020. O confinamento foi imposto no Reino Unido a 23 de março e, assim, foi entre março e agosto que os investigadores notaram essa diminuição nos cuidados primários, mantendo-se igual no que refere às hospitalizações.
“Não é claro se isto se tratou de uma melhoria da asma, devido à redução da poluição e [menos] possibilidades de os vírus respiratórios se espalharem, ou, se os pacientes tinham medo das consultas de cuidados primários e ficaram em casa. Mais estudos irão ajudar a explicar as razões por detrás da nossa descoberta”, afirmou Syed Shah, autor do estudo à revista BMJ. Acrescentou, ainda, que outro fator poderia estar relacionado à melhor autogestão da asma, devido ao medo da Covid-19.
Escócia e País de Gales
Também o estudo realizado na Escócia e no País de Gales envolveu um período temporal semelhante. Analisou a média entre 2015 e 2019, comparando-a com as primeiras 18 semanas (mais de quatro meses) de 2020, no que diz respeito às hospitalizações em urgências e mortes devido à asma. Os investigadores chegaram à conclusão que os internamentos tinham descido em média 36% (41% na Escócia e 30% no País de Gales), não havendo nenhuma mudança significativa no que refere às mortes.
“Esta descoberta é particularmente impressionante uma vez que, no início da pandemia, havia uma preocupação que a Sars-CoV-2 pudesse funcionar como um gatilho para as exacerbações da asma, da mesma forma que os vírus respiratórios”, escrevem os autores.
Os investigadores também mencionam que, uma semana antes de ser anunciado o confinamento nos países (a 23 de março), subiu, ultrapassando os 100%, a compra de medicamentos, como por exemplo inaladores, para a asma. Apesar de admitirem a possibilidade de se tratar de uma forma de armazenamento, os autores encaram como uma tentativa de as pessoas de gerirem melhor a sua asma.
Coreia do Sul
Na comunicação emitida pela Coreia do Sul, os cientistas explicam que olharam para as hospitalizações semanais causadas pela asma, mas também por pneumonia, pelo influenza e por doença pulmonar obstrutiva crónica durante a pandemia. Foi analisado o período entre janeiro de 2016 e janeiro de 2020, comparando-o com fevereiro e julho de 2020. Tal como os restantes estudos, os sul-coreanos observaram uma diminuição substancial nas admissões hospitalares das quatro doenças respiratórias.
“A descida significativa nas admissões hospitalares da influenza, pneumonia, doença pulmonar obstrutiva crónica e asma sugerem os benefícios não intencionados das medidas [para o controlo da Covid-19]”, escrevem os autores.
OMS
Também a OMS apresenta um estudo realizado no Reino Unido em que um médico da região de Kent (próximo de Londres) afirma que os pacientes “elevaram a fasquia” para o “desafio” (da Covid-19) que iam enfrentar. Assim, é reportado que quem tinha asma começou a usar a medicação de prevenção mais regularmente e mais eficientemente, uma vez que, temiam a hospitalização devido à infeção. Como resultado os ataques de asma diminuíram, tal como as consultas da mesma.
Tal como os três estudos prévios, o da OMS apresenta como fatores que contribuíram para esta diminuição as restrições impostas pela pandemia, que permitiram não só baixar a poluição do ar, mas que as próprias pessoas ficassem mais resguardadas. Assim, o uso de máscara, bem como os meses de confinamento são vistos como formas de baixar a exposição dos asmáticos a infeções virais, que, muitas vezes desencadeiam os ataques. Também a diminuição das deslocações, nomeadamente de carro, permitiu baixar os níveis de poluição do ar.
Acrescenta-se, ainda, o facto de, no Reino Unido, os asmáticos terem sido considerados pessoas de risco elevado de contrair Covid-19 e, como tal, tiveram de, durante três meses, permanecer em casa, sendo-lhes assegurada alimentação e medicação.