Em maio de 2020, a VISÃO escrevia que, apesar de não existir, até àquele momento, evidência científica que comprovasse uma maior vulnerabilidade das grávidas à infeção por Covid-19 ou uma maior probabilidade de desenvolverem doença grave, sabe-se que durante a gravidez as mulheres sofrem alterações imunológicas e fisiológicas que podem torná-las mais suscetíveis a infeções respiratórias virais, como a Covid-19.
A febre alta durante o primeiro trimestre pode aumentar o risco de problemas congénitos do bebé, tendo sido observados problemas gestacionais em mães contagiadas com outros coronavírus, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) ou a Síndrome Respiratória do Médio Oriente (MERS), mas não existia, até ao momento, informação sobre eventuais consequências adversas provocadas pela Covid-19.
Em julho do ano passado, um estudo realizado pelo Hospital Santa Maria, em Lisboa, durante os meses de abril e maio, e publicado no Journal of Maternal-Fetal & Neonatal, revelou uma percentagem baixa de grávidas em trabalho de parto positivas à Covid-19 e todas sem sintomas da doença
Yalda Afshar, obstetra especialista em gravidezes de alto na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, EUA, foi uma das pioneiras do país a iniciar trabalhos de acompanhamento de mulheres grávidas com teste positivo para o coronavírus. Ao lado de vários colegas de todos os EUA, recrutou e acompanhou participantes, com o objetivo de tentar perceber as implicações deste vírus nas mulheres grávidas e de que forma podia ajudá-las. Ela própria estava grávida, conta à Nature.
Vários outros estudos foram surgindo, por todo o mundo, ao longo de um ano de pandemia, com alguns a indicarem que as mulheres grávidas têm maior risco de hospitalização no caso de estarem infetadas com Covid-19 relativamente a mulheres da mesma idade que não estão grávidas.
UCI
Em setembro do ano passado, uma análise de quase 80 estudos que envolveu dados de mais de 11 mil mulheres grávidas que foram hospitalizadas e que tinham teste positivo à Covid-19 concluiu que a probabilidade de este grupo ser colocado nas Unidades de Cuidados Intenstivos era 62% maior relativamente a mulheres não grávidas, em idade reprodutiva.
Sintomas persistentes
Um estudo publicado em outubro de 2020 na Obstetrics and Gynecology por investigadores da Universidade da Califórnia, em São Francisco, EUA, concluiu que uma em cada quatro mulheres grávidas fica com sintomas persistentes depois da infeção por Covid-19. Das quase 600 voluntárias que participaram no estudo, metade ainda apresentava sinais da doença três semanas depois da infeção, enquanto 25% ainda estava a recuperar depois de dois meses ou mais.
Risco de morte
Em novembro de 2020, o Centro para Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA também concluiu, a partir de um grande estudo, que o risco de doença grave e morte por Covid-19 em grávidas é bastante maior do que em mulheres não grávidas. Porém, concluiu-se que o risco de doença grave e morte é significativamente inferior ao de doentes com idades mais avançadas ou doenças graves associadas.
Bebés
Mas, relativamente aos bebés, as notícias são boas, com estudos a revelarem que raramente ficam com infeções respiratórias graves. Amostras da placenta, cordão umbilical e sangue de mães e bebés indicaram, também, que o vírus raramente passa da mãe para o feto – um estudo realizado pela equipa de Yalda Afshar descobriu que a maioria dos bebés nascidos a partir de mães infetadas era saudável no momento do nascimento e também entre seis a oito semanas depois – apesar de alguns dados preliminares sugerirem que a infecção pelo coronavírus pode danificar a placenta, o que pode ter consequências para o bebé.
Parto pré-termo
Uma investigação que acompanhou mais de 4 mil mulheres nos EUA e Reino Unido, publicada no fim do mês passado, concluiu que, nas grávidas com suspeitas ou confirmação de infeção por Covid-19 houve taxas mais altas de partos prematuros relativamente às mulheres sem a infeção.
Raça e etnia
As taxas de doença grave e morte também se revelam mais altas em mulheres grávidas de certos grupos raciais e étnicos minoritários do que em grupos não minoritários. Mas permanecem várias dúvidas e incertezas relativamente aos dados de Covid-19 em mulheres grávidas, também porque a maioria deles é recolhido quando as mulheres grávidas se deslocam as hospital por algum motivo.
Vacinas
Relativamente às vacinas contra a covid-19 em grávidas, os investigadores afirmam que também faltam dados seguros (nos primeiros testes, nenhum dos fabricantes de vacinas incluiu as grávidas, devido às normas estabelecidas, embora alguns testes atuais já as incluam).
Em janeiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que as vacinas por RNA mensageiro, criadas pela Pfizer/BioNTech e Moderna fossem administradas apenas às mulheres grávidas com maior risco, ou seja, profissionais da linha da frente ou com problemas de saúde já existentes. Mais tarde, afirmou que as vacinas não apresentavam, até ao momento, riscos específicos para as grávidas
No site da Direção Geral de Saúde, no ponto do plano de vacinação contra a Covid-19 dedicado às grávidas, explica-se que “uma vez que o desenvolvimento de vacinas não envolve o recrutamento nem de crianças nem de grávidas, ainda não há dados relativamente à vacinação em grávidas” e que, por isso, “a administração da vacina em mulheres grávidas deve ser avaliada pelo médico assistente, de acordo com a relação benefício-risco”.
Ao site Nature, um porta-voz da OMS explicou que, por falta de dados, a organização ainda “não pode fornecer uma recomendação ampla para a vacinação de mulheres grávidas”.