“Depois de as medidas de confinamento chegarem ao fim, será inevitável”. Para Chris Whitty, o diretor geral da saúde inglês, a quarta vaga acabará por surgir, mal volte a ser permitido o ajuntamento de pessoas em espaços fechados – algo que, no Reino Unido, está previsto para meados de maio, segundo o plano de desconfinamento anunciado pelo primeiro-ministro britânico Boris Johnson.
Segundo disse Whitty aos deputados britânicos esta semana, será mesmo muito “perigoso” acelerar o roteiro anunciado, arriscando novo pico nas hospitalizações e mortes, apesar de o plano de vacinação estar a ser considerado “um sucesso”. Ou seja, mesmo com quase todos os britânicos mais vulneráveis já vacinados, alguns continuarão a ser suscetíveis de desenvolver doença grave – já que, como se sabe, a vacina não é cem por cento eficaz.
Daí que, quando questionado se as medidas poderiam ser revogadas mais depressa, à luz da rápida queda do número de casos oficiais, Whitty tenha insistido nas cinco semanas entre cada fase, para garantir que “a flexibilização das regras não conduza a novo pico”. E lembrou que os países mais bem-sucedidos estão a apostar numa estratégia diferente – como é o caso de Hong-Kong e da Nova Zelândia, que têm conseguido manter os seus números muito próximos do zero porque “têm decretado bloqueios locais sempre que uma nova infeção é descoberta”.
São declarações que vão ao encontro dos receios revelados pela Organização Mundial da Saúde, no final da semana passada, ao alertar para uma subida de 9 por cento de novos casos na Europa, depois de várias semanas em queda. Segundo referiu Hans Kluge, diretor regional europeu da OMS, no Twitter, os dados decretam “o fim de um promissor declínio” que durava já há seis semanas. “Estamos a assistir a um ressurgimento de casos na Europa Central e Oriental – tal como em outros países na Europa Ocidental, onde as taxas já eram elevadas”, acrescentou. A razão? A variante detetada no Reino Unido, agora responsável por mais de metade das infeções locais.
Tendência generalizada…
Em causa estão os aumentos bastante acentuados em países como a República Checa (o pior país da União Europeia), tal como as Estónia ou a Hungria – além dos aumentos, embora mais ligeiros, também detetados na Alemanha, Bélgica ou França. Também no Luxemburgo, notou aquele responsável, havia um aumento de 5 por cento de casos, confirmando a tendência generalizada no continente.
Um cenário que também não está propriamente afastado em Portugal, depois da diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, também ter reconhecido que “o País poderá enfrentar uma nova vaga nos próximos meses”, mesmo com a atual campanha de vacinação em curso.
“Depende muito, claro, de como decorrer o nosso desconfinamento”, comenta Henrique Lopes, especialista em saúde pública e membro da task-force para a Covid-19 da Associação de Escolas de Saúde Pública da Região Europeia (ASPHER), assumindo que é o caso já tanto do longínquo Irão como da bem mais próxima República Checa – e que os casos sobem igualmente de forma preocupante na Eslováquia, na Polónia e até em Israel, onde boa parte da população já está vacinada. É que, como explica, “as vacinas são fundamentais para travar a epidemia, mas não são um manto de proteção total. Mal as pessoas baixaram a guarda, o número de casos voltou a subir. E o número de casos graves também não desceu tanto como se desejaria…”.
…na Europa e na América?
Também nos Estados Unidos, voltaram a soar os alarmes. Depois de Estados como o Texas e o Mississipi terem anunciado o levantamento de restrições e a abertura a 100 por cento, não demorou a que Anthony Faucci, o epidemiologista chefe dos EUA, tenha considerado tais políticas de “uma enorme imprudência”, antecipando assim um maior risco de uma nova vaga.
Como disse Faucci em entrevista à CNN, isso já acontecera antes, “sempre que se tentou abrir o país”, com “ressaltos muito problemáticos”. Rochelle Walenski, uma das responsáveis do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC), também reconheceu que, ao fim de um ano de restrições, havia uma “preocupante” mudança de comportamento. “A resistência esgotou-se”, disse, em conferência de imprensa, “a fadiga está a vencer e as medidas que tomámos para travar a pandemia estão agora a ser ignoradas com demasiada frequência e de forma flagrante”.