Desde que o novo coronavírus foi descoberto – no final de 2019 na China – até agora, já foram encontradas cerca de quatro mil variantes no mundo inteiro. As mutações do SARS-CoV-2 estão na origem do desenvolvimento de novas variantes, como a britânica, a sul-africana, a brasileira ou californiana que, segundo os epidemiologistas, chegam a ser 20 vezes mais contagiosas do que outras.
Em Portugal, o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), em parceria com os laboratórios da Unilabs, está a vigiar as variantes genéticas do vírus e a última sequenciação genómica, realizada na segunda semana de janeiro, revelou resultados surpreendentes, admitiu um dos responsáveis pela investigação, o epidemiologista João Paulo Gomes, esta terça-feira, no auditório do Infarmed.
No primeiro mês do ano, 16% dos casos de Covid-19 detetados em Portugal tinham uma ligação à variante do Reino Unido, dois à da África do Sul e 6,8% a uma mutação da variante da Califórnia. O motivo de destaque é o último resultado: “não estávamos à espera disto”, admite João Paulo Gomes, que explicou ainda que, na última sequenciação que o INSA fez, em novembro, tinham sido encontrados apenas dois ou três casos associados a esta mutação do vírus e que agora já são 6,8% e estão “espalhados por 32 concelhos”.
Este é o historial das variantes que foram encontradas em Portugal:
Variante do Reino Unido
Surgiu em setembro e rapidamente se disseminou por todo o Reino Unido. A chamada variante britânica inclui uma alteração na proteína do pico, que é usada para se ligar ao recetor ACE2 humano; inclui 23 alterações, entre elas uma mutação chamada N501Y (ligada a uma maior transmissibilidade). Desde que foi descoberta já se espalhou por, pelo menos, 73 países.
De acordo com João Paulo Gomes, entre 1 de dezembro e 7 de fevereiro, o INSA estima que tenham circulado por Portugal “cerca de 120 mil casos com padrão de mutações associadas à variante do Reino Unido”. O que fica aquém da previsão de que, por esta altura, 65% dos casos de Covid-19 em Portugal estariam ligados a esta mutação do vírus. “Desviámo-nos completamente da curva projetada na altura [última reunião do Infarmed] e isso são otimistas noticias”, disse, perante um auditório vazio, pois desta vez apenas os especialistas entraram na sala e os políticos e parceiros sociais encontram-se a acompanhar a reunião por videoconferência.
A variante britânica representa 16% dos casos de Covid-19 em Portugal
Mas, mesmo que um pouco mais contida, não é de descartar que a variante do Reino Unido tem uma carga viral 20 vezes superior à das outras variantes, tal como as da África do Sul e do Brasil, o que faz com que sejam as três mais facilmente transmissíveis. “A causa de tudo são as tais mutações, que provocam uma maior afinidade do vírus pelas nossas células, o que depois resulta numa maior carga viral. Com uma maior carga viral, no contacto social temos maior capacidade de expelir maior quantidade de vírus”, explicou o investigador.
Em Portugal, em dezembro, entre 50 mil testes de rastreio à Covid-19 positivos analisados pelo INSA, nove mil estavam associados à variante do Reino Unido, apontou o especialista, que criticou ainda o alerta demorado das autoridades de saúde internacionais para esta nova mutação.
Mutação da variante da Califórnia
A mutação que partilha caraterísticas com a variante californiana representa 6,8% dos casos portugueses
No final do ano, os cientistas da Califórnia começaram a analisar amostras de SARS-CoV-2 numa tentativa de explicar a rápida propagação do vírus na costa oeste dos Estados Unidos e encontraram-na. A chamada variante da Califórnia – também designada como CAL.20 – diferencia-se das outras em circulação por causa da mutação L452R; que tinha sido inicialmente identificada no verão, na Dinamarca, e permanecera de baixo perfil até novembro, altura em que começou a espalhar-se muito rapidamente. Esta nova variante deixa também os cientistas preocupados por ter efeitos bloqueadores de anticorpos.
Embora Portugal não esteja a registar casos desta variante, têm sido descobertos infetados que partilham uma mutação com os casos da variante californiana. Na última sequenciação que o INSA fez, em novembro, tinham sido encontrados apenas dois ou três casos associados a esta mutação do vírus (0,7% do total estudado) e agora estes já são 6,8% e estão “espalhados por 32 concelhos”.
“Naturalmente, estaremos atentos para perceber se vai continuar a disseminar-se”, comprometeu-se o epidemiologia do INSA João Paulo Gomes.
Variante da África do Sul
Tal como acontece na variante britânica, também esta tem uma mutação genética que faz com que o vírus chegue melhor às células e, por isso, também tem uma transmissibilidade elevada. Tem duas mutações e uma delas pode ter capacidade de fintar o nosso sistema imunitário, dificultando o desenvolvimento de anticorpos, segundo investigações preliminares.
A circulação desta variante ainda é muito limitada no nosso País. Foi a 7 de janeiro que se detetou o primeiro caso da variante da África do Sul em Portugal, num homem de 36 anos, natural da África do Sul, mas residente em Lisboa, segundo informações disponíveis no site do INSA. Entretanto foi encontrado outro infetado, mas não há, até agora, notícia de um terceiro.
Variante do Brasil
Ainda não foi detetado nenhum caso relacionado com a variante brasileira em Portugal, no entanto, o País é considerado uma possível porta desta variação para o continente Europeu, dada a relação privilegiada entre as duas nações e o movimento de cidadãos.
Esta variante foi, inicialmente, detetada na região de Manaus, capital do estado do Amazonas, e está associada a muitos casos de reinfeção. Tem alterações genéticas semelhantes às variantes britânica e da África do Sul.