No ano de 1360, o poeta inglês William Langland publicou o poema Piers Plowman. Nesta alegoria, que descreve um homem à procura da sua fé, Langland utilizou a frase “a paciência é uma virtude” – frase esta que continuamos a ouvir até aos dias de hoje. No entanto, ao contrário do que Langland escreveu há mais de 600 anos, a paciência pode não depender apenas de uma virtude humana, mas sim de fatores biológicos que nada têm a ver com a moralidade.
A descoberta foi feita por um conjunto de investigadores do Japão, que concluíram que, após injetarem a hormona da serotonina em ratos, eles se tornavam mais pacientes. Para além disso, a equipa também verificou que há duas áreas diferentes do cérebro responsáveis por avaliar separadamente os benefícios de aguardar pacientemente por uma recompensa.
A hormona em causa é a serotonina, que é um neurotransmissor – uma substância química que transmite impulsos nervosos ao longo do espaço entre as células nervosas, cujo fenómeno é denominado sinapse. A importância desta hormona reflete-se no controlo da nossa capacidade de aprendizagem, humor, ou no nosso sono – apesar de também estar ligada à ansiedade, dores de cabeça e falta de apetite.
Ratos com paciência
A equipa japonesa, coordenada pelo neurocientista Katsuhiko Miyazaki, do Instituto de Ciência e Tecnologia da Universidade de Okinawa, tinha realizado testes no passado em que treinou ratos para “jogos de paciência” – os ratos tinham de colocar o seu nariz dentro de um pequeno buraco enquanto esperava que uma porção de comida (a recompensa) lhes fosse entregue.
Em três quartos dos testes, os ratos eram recompensados por esta ação – mas, nos restantes testes, os investigadores não lhes davam quaisquer alimentos. Ao longo da investigação, a equipa percebeu que o nível de serotonina injetado nos ratos – mais especificamente, numa zona do cérebro chamada “núcleo dorsal da rafe” – aumentava o número de tempo que os ratos estavam dispostos a esperar pela sua recompensa, cuja probabilidade de receberem era alta, mas cujo tempo de espera era incerto.
O núcleo dorsal da rafe é a zona do cérebro cujos núcleos são responsáveis pela libertação de serotonina – e contém neurónios que atingem outras áreas do cérebro. Como explica Miyazaki, “a serotonina é um dos mais famosos neuro moduladores de comportamento – ajuda a regular o humor, os ciclos de sono e o apetite.” Assim, a paciência é apenas mais um dos comportamentos que são afetados pelos níveis serotonina – quanto maiores os seus níveis, mais paciência demonstraram os ratos enquanto aguardavam pela comida.
Impactos diferentes consoante a zona do cérebro
Paralelamente, a equipa também analisou o impacto da libertação de serotonina em diferentes áreas dos cérebros dos ratos, com um foco particular em áreas que são conhecidas por conduzir a comportamentos impulsivos quando são danificadas – nomeadamente, o córtex orbitofrontal e o córtex pré-frontal.
A libertação de serotonina no primeiro córtex levou a maiores níveis de paciência, à semelhança da experiência original. No entanto, a libertação teve um efeito diferente no córtex pré-frontal: só houve um aumento do nível de paciência quando o tempo de espera pela recompensa era variável – não se verificou o mesmo em testes com tempos fixos, em que os ratos sabiam em que momento iam receber a comida.
Os investigadores concluíram que a reação de cada área do cérebro a esta libertação de serotonina revelou impactos diferentes na paciência dos ratos – cada córtex cerebral calculou a probabilidade de uma recompensa (o alimento) de uma forma independente do outro – e estes cálculos independentes combinados determinaram quanto tempo é que os ratos estavam dispostos a esperar.
De acordo com os cientistas, esta compreensão do impacto da serotonina nas diferentes áreas do cérebro pode ser fundamental para desenvolver os “inibidores seletivos de recaptação de serotonina” – um tipo comum de medicamento antidepressivo. “Ao localizarmos estas regiões, podemos abrir portas a tipos de tratamentos mais direcionados a certas áreas do cérebro, em vez de se aplicarem a todo o cérebro”, concluiu Miyazaki.