Emile Bacha, cirurgião e diretor de cirurgia cardíaca pediátrica congénita do Centro Médico de Irving da Universidade da Columbia, escreveu uma carta onde relata como o coronavírus forçou os médicos a racionarem o atendimento dos pacientes, que apesar de não terem o vírus, precisam de um acompanhamento médico.
Segundo a CNN, o cirurgião escreve que “temos que tomar decisões que eu nunca tinha contemplado antes”. “Tivemos que racionar os cuidados e tomar decisões sobre quem é considerado um caso urgente ou emergente”.
Bacha explica que os enfermeiros foram enviados para cuidar de pacientes com coronavírus e que os equipamentos de segurança são escassos. “A falta de equipamento de proteção pessoal é exasperante. Quem imaginaria que uma simples máscara cirúrgica, algo que usamos e descartarmos várias vezes durante o dia durante o horário normal, tornaria-se num produto racionado numa das cidades mais ricas do mundo?”.
O cirurgião declara que o seu programa de cirurgia pediátrica resume-se a “apenas” uma equipa operacional. “As mais recentes diretrizes do hospital informam que são permitidos tratar apenas problemas verdadeiramente fatais”, escreve. “E temos que decidir o que fazer com os outros casos.”
Embora a cidade de Nova Iorque tenha sido o epicentro do surto do coronavírus nos EUA, os hospitais da região, mesmo com poucos casos diagnosticados com novo vírus, foram obrigados a adiar alguns procedimentos médicos para se prepararem para o surto. Os governadores de vários estados ordenaram que os procedimentos não urgentes fossem adiados. A questão é que muitas vezes existe uma linha muito ténue sobre o que é considerado não urgente ou o que salva uma vida.
Mary Devorak, de 33 anos, nasceu com vários defeitos cardíacos, realizou cinco cirurgias ao coração e vários cateterismos cardíacos. Atualmente, mora no Minnesota, onde existe uma ordem executiva específica para adiar todas as “cirurgias e procedimentos não essenciais” que utilizem equipamentos de proteção individual ou ventiladores. Nos últimos meses, Mary tem sentido um batimento cardíaco irregular, e da última vez que o teve significava que a bateria do pacemaker estava a acabar. Não é um problema imediatamente fatal, e, em novembro, a paciente adiou as consultas para o dia 17 e 23 de abril para que os exames fossem realizados. No final do mês passado, Mary recebeu um telefone a informar que as suas consultas tinham sido cancelas. “É assustador porque me faz perceber o quão dependente eu sou de um sistema médico em funcionamento”, disse. “É aterrorizante pensar que se algo acontecesse agora, eu não poderia fazer nada”.
Jolene Baxter sente o mesmo que Mary. Tem uma filha, Marlee, com um defeito cardíaco congénito e o lado direito do coração da criança não funciona. Antes de completar 2 anos, Marlee foi sujeita a três cirurgias e até há umas semanas atrás, estava estável e bem. Contudo, os níveis de saturação no oxigénio – quantidade de oxigénio no sangue – começaram a diminuir. No inicio de março, o cardiologista pediátrico de Marlee marcou um cateterismo cardíaco mas, no dia anterior, cancelou a consulta e disse que não sabiam quando seria remarcado. Em Oklahoma, existe também uma ordem executiva para adiar todas as cirurgias não urgentes. Baxter mede os níveis de oxigénio da filha várias vezes ao dia e espera que tudo fique bem até que a pandemia passe. “É uma época muito, muito assustadora”, disse ela.