Quem tem hemocromatose tem duas cópias de um gene defeituoso que faz com que o ferro se acumule. Detetada precocemente, a doença tem um tratamento simples e eficaz, mas os sintomas comuns, como cansaço extremo e dores nas articulações, fazem com que seja, frequentemente, confundida com sinais normais de envelhecimento.
Agora, uma análise dos dados de quase 3 mil pessoas, entre os 40 e os 70 anos, com esta mutação genética, no Reino Unido, permitiu aos investigadores compreender melhor as consequências da hemocromatose, com um em cada cinco homens e uma em cada 10 mulheres com este gene a desenvolver doenças no fígado, incluindo cancro, diabetes, e osteoartrite ou artrite reumatoide. Julga-se que o facto de perder sangue na menstruação e nos partos seja a explicação para a menor incidência nas mulheres.
A equipa liderada por David Melzer, da Universidade de Exeter, em Inglaterra, concluiu que, além de o problema ser mais comum do que se acreditava, as pessoas com esta mutação desenvolvem mais doenças à medida que envelhecem, aumentando o risco de morte prematura.
No caso dos homens, o número de mortes por cancro do fígado foi significativamente mais elevado do que o esperado.
O ferro é ingerido normalmente através da alimentação e é absorvido pelo intestino. A hemocromatose faz com que o portador da mutação absorva demasiado ferro e, nesse caso, a absorção do ferro pelo intestino diminui por forma a evitar a sua acumulação, como explica a Associação Portuguesa de Hemocromatose. Quando isto acontece, o organismo continua a absorver ferro, levando a uma sobrecarga progressiva, que, percebeu-se agora, danifica os órgãos.
Até aqui, como afirma David Melzer, “pensava-se que as mutações da hemocromatose raramente causavam problemas de saúde”. “Mostrámos que a hemocromatose hereditária é uma doença muito mais comum e furtiva”, acrescenta, no estudo publicado no BMJ e no The Journals of Gerontology: Medical Sciences.
A investigação conjunta das universidades de Exeter e de Connecticut, EUA, e do Instituto nacional norte-americano do Envelhecimento, sugere que passe a ser rotina um exame de despiste da condição, como uma análise de sangue, já que o tratamento, depois, passa simplesmente pela remoção regular do sangue sobrecarregado com ferro.
Atualmente, acredita-se que a hemocromatose se desenvolveu no passado em populações que se fixaram em sítios onde não havia carne suficiente e que, por isso, passaram a conseguir absorver mais ferro a partir de uma dieta pobre em carne, facilitando a reprodução. É comum no norte da Europa, embora também se encontre no sul. Na Irlanda, é conhecida como “a maldição celta”.