Toda a gente sabe que o Portugal dos últimos tempos da ditadura travou em África uma longa Guerra Colonial de 13 anos. Também ninguém ignora que esse conflito deixou marcas profundas no tecido social – físicas, psicológicas, sociais, identitárias.
No que se pensa menos é no facto de essa guerra, assente em argumentação falaciosa e levada a cabo contra a lógica e a dinâmica da História, ter representado um esforço muito para além das potencialidades do País – grande duração no tempo, três teatros de operações, enormes distâncias, mobilização de recursos de toda a ordem. Dir-se-á que os movimentos independentistas das colónias eram militarmente mais fracos, mas essa análise precipitada não resiste a uma breve reflexão. Num tempo de Guerra Fria, eles tinham por detrás o apoio do bloco Leste e da China, quando não de setores do Ocidente defensores de uma nova e mais justa ordenação do continente africano, também na mira de não deixar prevalecer ali os interesses de Moscovo ou de Pequim.
Como foi então tão duradouro o esforço de guerra do Portugal de Salazar e de Marcelo Caetano? De duas formas: por um lado, contando com o apoio encoberto de países ocidentais como a Alemanha, a França e a Espanha e de potências regionais racistas como a África do Sul e a Rodésia; por outro envolvendo-se em guerras secretas no interior dos países vizinhos de Angola, Moçambique e Guiné, quantas vezes com o apoio dos também secretos serviços de informações de países ocidentais. É sobre esses apoios camuflados e essas guerras secretas de Portugal em África que se debruça este número da Visão História.
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SUMÁRIO
Um longo braço-de-ferro Ao longo de quase 20 anos, a diplomacia do Estado Novo opôs-se com unhas e dentes ao reconhecimento do direito à autodeterminação e independência das colónias. Nem o grande aliado norte-americano conseguiu demover Salazar e os seus seguidores. Por Pedro Vieira
Armamento: orgulhosamente bem acompanhados Ao contrário do que Salazar proclamou, Portugal nunca esteve completamente isolado durante os 13 anos da Guerra Colonial. Foi o armamento fornecido pela França e pela Alemanha que permitiu combater. Por Francisco Galope
A Espanha na guerra ‘portuguesa’ Sem o auxílio do regime de Franco, Portugal teria tido maiores dificuldades em manter durante tantos anos a presença nos teatros de operações africanos. Por María José Tíscar
O coração das trevas Assim intitulou Joseph Conrad a sua descida aos abismos do mais negro dos colonialismos. Propriedade privada de um europeu que nunca lá se deslocou, depois laboratório de experiências coloniais e pós-coloniais, o Congo é o paradigma da História africana no último século e meio. Por Luís Almeida Martins
Portugal-Catanga, a aliança escondida O Governo de Salazar viu na secessão catanguesa, em 1960, uma oportunidade de obter em África um aliado precioso, e auxiliou Tschombé com todos os meios – inclusive militares – de que podia dispor. Por Ricardo Silva
Tschombé ao poder A PIDE organizou, em 1966, uma operação para derrubar o novo Governo de Mobutu. Por Ricardo Silva
E Angola ali ao lado Como os protagonistas e os lances do conflito no Congo foram vistos pelos jornais portugueses. Por Emília Caetano
Guerra do Biafra, a morte mediatizada Em 30 de maio de 1967, os Igbos do Sudeste da Nigéria declaravam a secessão. O conflito e o bloqueio impostos pelo poder central provocam mais de um milhão de mortos. Em janeiro de 1970, a «República do Biafra» era apagada do mapa. Por Pedro Caldeira Rodrigues
Mercenários para o Biafra A troco de bons pagamentos, pilotos e engenheiros portugueses qualificados viveram aventuras arriscadas durante o conflito nigeriano. Por Ricardo Silva
Voos com armas e alimentos A ponte aérea autorizada por Salazar e levada a cabo por traficantes de armas com uma componente alimentar, ajudou o Biafra a resistir aos federalistas nigerianos. Por Ricardo Silva
Matar a fome em São Tomé Durante cerca de ano e meio, a província portuguesa acolheu mais de 400 crianças vindas do Biafra, que assim escaparam à morte. E os habitantes da ilha viram pela primeira vez leite em pó. Por Cláudia Lobo
A ‘guerra’ da Beira O apoio português à Rodésia «branca» de Ian Smith envolveu a ação direta de Salazar e desencadeou um bloqueio britânico nas águas de Moçambique que se prolongou por quase uma década. Por Ricardo Silva
O 007 de Salazar Jorge Jardim era o homem certo para as operações mais secretas do Estado Novo. Formou uma «mini CIA» e tornou-se o «dono» de Moçambique. Para sobreviver, jogou uma última cartada – que falhou. Por J. Plácido Júnior
A ação encoberta da PIDE/DGS Uma das táticas utilizadas pelo Governo português foi, recorrendo ao uso de estrangeiros, desestabilizar e promover golpes nos países que apoiavam os movimentos de libertação. Por María José Tíscar
Os ‘espiões’ da Aginterpress Fascistas europeus ‘sobreviventes’ à II Guerra Mundial encontraram em Portugal campo fértil para colaborar ativamente nas operações de desestabilização em África. Por José Duarte de Jesus
Um mar de equívocos A Operação Mar Verde, através da qual as forças armadas portuguesas desencadearam – em novembro de 1970 – uma ação de guerra direta (embora encapotada) contra outro país, resultou estrategicamente num falhanço. Aqui se recorda a história do estranho ataque à Guiné-Conacri. Por Luís Almeida Martins
Uma aliança secreta O país do apartheid foi determinante para Portugal ter podido manter-se em Angola e Moçambique durante tanto tempo. Mas o ‘Exercício Alcora’, que também incluía a Rodésia, era top secret. Pot Aniceto Afonso
Os ‘Terríveis’ do Batalhão Búfalo Na hora dos ajustes de contas pós-independência, angolanos e portugueses comprometidos com o regime colonialista combateram pela própria sobrevivência numa famosa unidade militar da África do Sul do apartheid. Por Ricardo Silva
Para saber mais Quatro obras indispensáveis