Bióloga e ilustradora científica, Davina Falcão decidiu criar o grupo Cobras de Portugal como uma forma de divulgar informação sobre estes animais e de melhorar a sua imagem pública – desde tempos imemoriais que a humanidade olha para eles como um inimigo a abater. “A cobra é um animal útil para controlar pragas, como ratos. Tem de deixar de ser considerado um vilão. As pessoas têm de deixar de as considerar um vilão e dar-lhes valor.”
Esta desconfiança (até na Bíblia a serpente é o primeiro inimigo do Homem) pode ter tido origem na pré-história, diz a bióloga. “Evoluiu com um mecanismo de defesa de ter cuidado com as serpentes, e reagimos instintivamente contra elas. É intrínseco a nós, está no nosso instinto.”
O primeiro passo para acabar com desconfianças é saber identificar cada cobra, até porque, das dez espécies que se encontram em Portugal, nem todas são completamente inofensivas. “Temos duas víboras que podem ser consideradas perigosas, apesar de não terem um veneno mortífero. Mas [quem é mordido] precisa de cuidados médicos. O veneno provoca reações adversas e tem de ser levado a sério.” Das duas, uma, a víbora-de-seoane, também chamada de víbora-negra, vive apenas no Gerês; a outra, a víbora-cornuda, encontra-se espalhada por todo o País.
Há alguns truques para distinguir as cobras venenosas das outras, mas que “só funciona com as que existem em Portugal e Espanha”, avisa. “Se tiver pupila redonda, é uma espécie inofensiva; de tiver pupila vertical, é uma víbora. As escamas também são diferentes: as víboras têm muitas escamas cefálicas fragmentadas na cabeça.” A víbora-cornuda também tem uma característica muito particular: “Um cornito na ponta do nariz.”
Ao contrário do que muita gente julga, a cabeça triangular não é garantia de que seja um animal venenoso. “Quando se sentem ameaçadas, a maior parte das serpentes tendem a achatar a cabeça, para ficar mais larga, e por causa disso parece uma cabeça triangular.”
Outro mito que se recusa a morrer é o de que as cobras gostam de leite. “Por alguma razão desenvolveu-se a ideia de que as cobras adoram leite, mas não é verdade”, garante Davina Falcão.
Inimigo: o gato
Há em Portugal dez espécies de cobras. “A maior é a cobra-rateira, que pode atingir 2,30 metros. É imponentes, as pessoas assustam-se bastante quando as veem. A cobra-de-ferradura e a cobra-de-água atingem 1,80 metros. Algumas espécies são consideradas vulneráveis, como a víbora-de-seoane, a víbora-cornuda e a cobra-lisa.”
Estes répteis são ameaçadas pela atividade humana, além da perseguição direta de que são alvo. “Um dos grandes problemas é o isolamento das populações. Quando se faz uma estrada, fragmenta-se o habitat. As serpentes têm dificuldade em atravessar a estrada, e as pessoas fazem questão de as atropelar.”
Os incêndios também são um problema, “porque perdem o seu habitat e ficam mais suscetíveis a predadores: são mais facilmente vistas pelas aves de rapina”.
E há ainda uma ameaça surpreendente. “Os gatos domésticos estão a causar problemas. A presença de gatos errantes está a causar um grande impacto na biodiversidade de animais pequenos, incluindo serpentes. Temos de chamar a atenção das pessoas, mas as pessoas gostam muito dos seus gatos e não gostam de cobras…”
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