Apesar da pandemia, da guerra e da inércia dos maiores poluidores mundiais, a União Europeia (menos de 9% das emissões mundiais) continua a perseverar num modelo de crescimento sustentável.
A parte do mundo onde as decisões se tomam democraticamente – responsável por cerca de metade das emissões – fá-lo num quadro de liberdade política e económica, ou, dito de outro modo, em economia de mercado capitalista.
Logo, é evidente que só a regulação desse mercado pode trazer resultados. E se o Comércio Europeu de Licenças de Emissão foi o primeiro passo, está em larga medida concluído o tripé de financiamento sustentável a partir dos recentes instrumentos que vão impactar de imediato a vida dos Bancos, das Instituições Financeiras, das mais de mil empresas portuguesas com mais de 500 trabalhadores e todas as pequenas e médias empresas (PMEs) que quiserem fazer parte da cadeia de valor das primeiras.
No quadro do pacote de medidas apresentado no Pacto Ecológico Europeu, a União Europeia desenvolveu um quadro de reporte de sustentabilidade, que chega agora a obrigações novas ainda mal percebidas.
Dentro deste quadro de divulgação de informações de sustentabilidade, destacam-se a Corporate Sustainability Reporting Directive (Diretiva CSRD), que se aplica a empresas financeiras e não financeiras, o Sustainable Finance Disclosure Regulation (Regulamento SFDR), aplicável ao setor financeiro, e o Regulamento da Taxonomia.
A Diretiva CSRD, já em vigor, reforçou em muito os requisitos de divulgação de informações não financeiras, vindo exigir que, de forma faseada, as grandes empresas e as PMEs cotadas num Estado-Membro, empresas-mãe de um grande grupo e, em determinadas circunstâncias, até sucursais ou filias de empresas de países terceiros, passem a divulgar nos seus relatórios de gestão informações relevantes em matéria de sustentabilidade.
A CSRD deve ser complementada por normas de relato de sustentabilidade comuns e obrigatórias, a fim de garantir uma maior uniformização e fiabilidade do relato de sustentabilidade.
No passado dia 31 de julho, a Comissão adotou o primeiro conjunto de Normas Europeias de Relato de Sustentabilidade, obrigatórias para todas as empresas abrangidas pelo âmbito da CSRD, que especificam os requisitos de relato de sustentabilidade que as empresas abrangidas devem utilizar.
Em harmonia, a CSRD e as normas de relato de sustentabilidade consubstanciam-se num passo significativo para a UE, definindo um caminho mais claro de reporte não apenas para as empresas obrigadas, como ao mesmo tempo proporciona aos utilizadores dessas informações, os investidores e as partes interessadas, uma melhor compreensão da evolução, do desempenho, da posição e do impacto da empresa, aumentando a confiança nas informações divulgadas, proporcionando uma melhor informação para decisões de investimento e combatendo o “greenwashing“.
São as próprias empresas que beneficiam da elaboração de relatórios de elevada qualidade sobre questões de sustentabilidade. Face ao aumento da procura por produtos financeiros que promovem características de sustentabilidade ou que visam alcançar objetivos de sustentabilidade (do artigo 8.º e 9.º do Regulamento SFDR), um bom relato de sustentabilidade é fundamental para melhorar o acesso de uma empresa ao capital financeiro. Mas, sobretudo, o relato de sustentabilidade vai ajudar as empresas a identificar e a gerir os seus próprios riscos e oportunidades relacionados com questões de sustentabilidade.
E, ainda que, para já, as PME (não cotadas) pareçam ficar de fora da viagem, a sustentabilidade faz-se atravessar no seu caminho. Apesar de não estarem abrangidas, para já, pelo escopo de aplicação da CSRD, sofrerão o “efeito cascata” destas novas obrigações de divulgação por fazerem parte da cadeia de valor das entidades obrigadas, sendo, deste modo, também influenciadas a divulgar informações sobre sustentabilidade que permitam às empresas obrigadas compreenderem os impactos, riscos ou oportunidades relacionados com a sustentabilidade da empresa.
A intervenção de muitas vozes menos habilitadas e a circunstância de serem muitas as novidades tem por cá criado o típico efeito “depois logo se verá”. Esta nossa “qualidade”, que nos leva muito a reagir quando vemos a meta, é perigosa desta vez.
Na verdade, sente-se a disfarçada esperança que tudo se dilua em relatórios cheios de pias intenções. É um erro tremendo que o mercado vai fazer pagar caro aos que ficarem para trás.