Termina hoje a brevíssima consulta pública sobre a Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas 2030 (ECO360), um tema decisivo para se alcançarem os exigentes compromissos de equilíbrio e sustentabilidade ambiental assumidos até 2030.
A UE assumiu pela primeira vez a importância da contratação pública ecológica em 2007. As entidades públicas encontram-se entre os maiores consumidores a nível europeu, despendendo anualmente cerca de 16% do PIB da UE (quase 2500 mil milhões de euros) na aquisição de bens e serviços. Por isso, desde 2007, passou a ser possível a inclusão de critérios ambientais nos contratos públicos, isto é, as compras podem ser efetuadas não apenas com base no preço e as instituições públicas podem exigir certificados de desempenho ambiental aos operadores económicos, fixar standards ambientais mínimos, exigir rótulos ecológicos, e avaliar o custo total do ciclo de vida das obras, bens ou serviços a adquirir, tendo em consideração todos os impactes ambientais até ao fim do seu período de vida útil.
Como se sabe, até 2030, os países da UE estão comprometidos com metas muito exigentes, entre as quais as que decorrem do Acordo de Paris sobre o clima, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da Agenda 2030 das Nações Unidas, e do Pacto Ecológico Europeu. Só no que toca à neutralidade carbónica, a UE terá de reduzir as emissões em 55%, até 2030. É neste contexto – muitíssimo exigente – que as compras públicas têm um papel decisivo. Não basta ao Estado legislar, é fundamental que também dê o exemplo – sendo as aquisições uma excelente forma de o fazer, tanto pelo seu valor, como pela sua capacidade de influenciar estruturalmente os nossos sistemas económicos e sociedades.
Em Portugal, começou por ser aprovada, em 2007, uma Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas 2008-2010. Nada mudou, porém. Depois, já com António Costa, foi aprovada, em 2016, a Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas 2020 (ENCPE 2020). Infelizmente, e mais uma vez, nada mudou. O Relatório Final de Monitorização da ENCPE 2020 não podia ser mais claro e deprimente. Ficámos muitíssimo longe de atingir os oito indicadores de performance adotados. Ao ponto de haver indicadores para os quais a meta era 60% (por exemplo, % de procedimentos pré-contratuais que incluem critérios ambientais), tendo o setor empresarial do Estado alcançado valores inferiores a 1%. Curiosamente, acabou por ser o próprio Tribunal de Contas a lançar um apelo ao Estado, na sua Auditoria às Compras Públicas Ecológicas (2020), no sentido da incorporação de critérios ambientais nas compras públicas. Seria cómico, se não fosse trágico.
É com este historial miserável que o Governo colocou recentemente em consulta pública a Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas 2030 (ECO360). Dada a importância do tema, é incompreensível que a mesma tenha demorado tanto tempo a ser publicada e que tenha estado apenas oito dias úteis em consulta pública. Acresce que não partir das recomendações que resultam do Relatório Final de Monitorização da ENCPE2020 e não se fazer acompanhar de um Plano de Ação faz temer o pior quanto à sua implementação. Parece apenas mais uma ilustração de um Governo mestre na ilusão e pouco comprometido com a ação. Se o Governo tivesse um compromisso sério com as compras públicas ecológicas – e, já agora, também com a dívida pública verde –, o País podia mesmo acelerar a sua transição para um modelo de desenvolvimento sustentável e ser um exemplo para o mundo. Porém, isso obriga a tomar decisões e a ser persistente – o que não é o forte de António Costa.