“Everything I do is for the 17-year-old version of myself.”
Virgil Abloh (1980-2021), diretor criativo da Louis Vuitton de 2018 a 2021.
Obama foi o primeiro romântico deste século – e, até agora, o último. Com a sua eleição, em 2008, acreditámos que a América e o mundo poderiam ser melhores. Porém, quase nada melhorou, pelo contrário. Apesar de 2015 ter sido um ano invulgarmente promissor, com a aprovação, pela generalidade dos países, dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e do Acordo de Paris sobre o clima, desde então entrámos numa espiral de derrotas sucessivas. Em fast forward, foi a eleição de Trump e Bolsonaro, o Brexit, a pandemia Covid-19, a derrota do Build Back Better de Joe Biden, o regresso da inflação, a invasão da Ucrânia e o imperialismo de Putin, a ascensão de Le Pen, e o receio de uma Terceira Guerra Mundial aos bocados, na expressão do Papa Francisco. Tantas derrotas em tão pouco tempo geram medo e stress em larga escala, e projetam sobre o futuro questões e sombras do passado.
Cinco anos após ter deixado a Casa Branca, Obama, o último dos românticos, é hoje pouco mais do que uma memória feliz e uma boa playlist de verão. Já a agenda da sustentabilidade de 2015 parece arredada sine die dos palcos globais – e nós assistimos a tudo isto num misto de angústia e indiferença, conscientes de que por menos já se fizeram revoluções, como se o nevoeiro de medo que se instalou nos últimos anos nos tivesse desvitalizado, toldado a visão e a ambição.
Diz a neurociência que perante situações de stress geralmente adotamos como reação a fuga, a luta ou o congelamento. Quando a ameaça é complexa, podemos até oscilar entre essas três reações. Por exemplo, no que toca à emergência climática, duvidarmos da evidência científica – luta –, evitarmos o tema, não alterando os nossos comportamentos – fuga –, e assumirmos que já é tarde demais para se fazer algo – congelamento. Encarar os desafios do futuro – da igualdade e da coesão, dos limites biofísicos do planeta e da revitalização das democracias – não apela a fuga, luta, ou congelamento, mas sim a um olhar atento, compreensão profunda, inteligência no plano, determinação na ação, e emoção genuína com bem-estar dos outros e de todas as formas de vida.
São inquietantes os resultados de um estudo recente sobre crianças e adolescentes. Por exemplo, a constatação de que facilmente reconhecem umas largas centenas de logótipos de marcas de bens de grande consumo, mas não conseguem identificar sequer dez plantas e animais nativos do seu local de residência. Por outro lado, o ideal de prazer e diversão das novas gerações parece cada vez mais pobre e alienado. São resultados inquietantes, porque os limites do nosso mundo serão sempre os limites da nossa linguagem e da nossa imaginação.
A transição para o paradigma da sustentabilidade depende de uma revolução nas políticas dos Estados e das empresas, mas acima de tudo de novas palavras. Para acolhermos o mundo em toda a sua plenitude e fragilidade, precisamos de um léxico em combustão permanente. Não podemos prescindir de nenhuma palavra: nem das gastas, nem das que estão por inventar. Precisamos de todas: das felinas, das diamante, das vertigem, das soluço, das misteriosas. Até das que já desistiram de nós, como diz um verso de Cesariny.
O materialismo capitalista da geração yuppie, que sucedeu ao romantismo algo ingénuo da geração hippie, encolheu palavras como amor, natureza, verdade e poesia. É agora urgente resgatar dos escombros o seu poder sereno, mágico e incendiário para sermos capazes de escrever o futuro.
De agora em diante, o sonho até pode ser mais pragmático e a utopia mais realista – mas, para acontecerem, teremos sempre de permanecer fiéis ao que éramos aos 17 anos de idade. Só esse idealismo romântico, na sua abertura à verdade e ao mundo, a recomeçar vezes sem conta, e a acolher o desconhecido e a incerteza, nos poderá resgatar do medo e da descrença. A Páscoa e o 25 de abril são só sobre isso: sobre permanecermos fiéis a nós próprios e disponíveis para recomeçar. Estranho seria viver de outra forma: como escreveu Hannah Arendt, “os seres humanos, embora tenham de morrer, não nasceram para morrer, mas para começar.”