É um jogo de sedução, com pouco romantismo, uma espécie de one-night stand no reino animal. Neste ritual, deveras pouco amoroso, os jaguares envolvem-se numa luta simulada pré-coito, durante a qual a fêmea mostra os dentes e faz vocalizações guturais. Um casal de jaguares passa, normalmente, dois ou três dias alternando entre ataques e acasalamento. Há dois anos, em fevereiro, por altura do Dia dos Namorados, o amor andava no ar entre as Panthera onca (nome científico do jaguar ou onça-pintada), na Reserva Natural Hato La Aurora, na região de savana tropical da Colômbia, quando dois grandes felinos caíram na relva, soltando fortes grunhidos de acasalamento. Mas, quando Diana Stasiukynas, ecologista especialista em vida selvagem e cientista de conservação da Panthera, organização mundial de conservação de felinos selvagens, viu os vídeos do encontro ficou preocupada. Antes, os observadores tinham fotografado a fêmea jaguar a rosnar, a caçar e a brincar com a cria bebé de cinco meses. E, enquanto ela seduzia o macho adulto, a sua prole deixou de ser vista. Só quando a cria reapareceu com a mãe alguns dias depois, Diana Stasiukynas percebeu que podia ter testemunhado uma estratégia de engate anti-infanticídio nunca antes vista.
Por vezes, os machos adultos predadores matam filhotes que não são seus para acasalarem com as mães. Essa violência liberta um potencial parceiro e pode eliminar um futuro concorrente, mas tem elevadas desvantagens para as fêmeas. Não é apenas entre os jaguares que esta guerra dos sexos entre felinos acontece. Também as mães leoas e as pumas escondem as suas crias durante o ato sexual para evitar o infanticídio. Fingir o cio e deixando-se cortejar, as fêmeas levam os machos a acreditar que um filhote é deles e assim desencorajá-los a matá-lo. Enquanto o macho aumenta a sua autoestima graças ao sucesso sexual, fica menos propenso a cometer infanticídio por desespero.
“Acasalar com vários machos para criar um status de paternidade incerto e proteger os seus filhotes é um comportamento comum em várias espécies”, diz Diana Stasiukynas. “Em grandes felinos, a promiscuidade usada como contra-estratégia ao infanticídio foi relatada em leões, leopardos e pumas.”
Mais recentemente, Diana Stasiukynas e outros colegas relatam na revista científica Acta Ethologica a partilha de histórias com outros investigadores do Brasil. Também no Pantanal Norte as mães foram observadas a reunirem-se com os seus filhos depois da relação sexual efémera. Por enquanto, os investigadores ainda não sabem como é que as crias escondidas passam os dias, provando a habilidade para se esconderem em tocas que são segredos bem guardados, mas causando preocupação, pois os bebés jaguares podem perder até 20% do seu peso enquanto a mãe vai namoriscando os pretendentes.
“Precisamos concentrar esforços para reunir mais dados deste tipo sobre a história natural dessa espécie”, diz Ronaldo Morato, investigador do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Para o doutorado em Medicina Veterinária é importante explorar como esse comportamento pode mudar consoante o ambiente, sobretudo onde o desenvolvimento e a presença humana afetam os esconderijos disponíveis. As pessoas podem agrupar os jaguares em áreas florestais menores, onde os felinos enfrentam uma competição mais veemente por comida e parceiros. Essa proximidade pode provocar mais infanticídio e inspirar diferentes estratégias para evitá-lo. “Se soubermos um pouco mais sobre a reprodução do jaguar, talvez possamos realizar ações de conservação nos seus primeiros anos de vida”, alerta Diana Stasiukynas.