Há, no mundo, quase 50 mil espécies de plantas comestíveis. Dessas, só 150 a 200 têm valor comercial e são efetivamente consumidas. E apenas três – trigo, arroz e milho – representam mais de metade das calorias consumidas pela humanidade.
É esta pobre agrobiodiversidade que o RADIANT quer combater. O projeto europeu, coordenado pelo Centro de Biotecnologia e Química Fina da Escola Superior de Biotecnologia (Universidade Católica no Porto), está a ajudar agricultores a recuperarem espécies e variedades agrícolas que caíram em desuso. A ideia é fomentar a biodiversidade na agricultura, suavizando um pouco o paradigma atual de monoculturas, em que o setor é dominado por uma ínfima parte das plantas disponíveis para consumo.
“Queremos promover espécies e variedades que não são mainstream, promovendo a agrodiversidade e práticas mais sustentáveis”, explica à VISÃO Marta Vasconcelos, a investigadora que coordena o RADIANT. O plano passa por incentivar o cultivo e consumo de leguminosas (como feijão, grão e lentilhas) e sobretudo de variedades quase esquecidas de hortícolas, fruta e cereais. “Algumas são culturas alternativas que não são assim tão alternativas: são culturas subutilizadas. E há situações em que é possível produzi-las em grande escala.”
Arma contra as alterações climáticas
Algumas destas variedades estão a ser promovidas já com as mudanças no clima em mente, acrescenta a investigadora. “Há uma variedade de tomate mais adaptada aos efeitos das alterações climáticas em Portugal, como as secas, e que tem um excelente sabor. Outra variedade com potencial é a bambara groundnut, uma leguminosa africana muito resistente à seca, típica de países áridos, que pode ser comida diretamente ou como farinha, e pode substituir alguma soja.”
A saúde é outro pilar do projeto. Marta Vasconcelos dá o exemplo de “uma variedade de trigo muito antiga, que vem da Hungria, com muita fibra”.
O projeto tem em atenção toda a cadeia de valor dos produtos – afinal, não vale a pena incentivar o cultivo de uma variedade se não se criar mercado para ela, tornando-a rentável. “Ajudamos os agricultores a chegarem aos consumidores”, diz a coordenadora da iniciativa. As redes sociais são uma das formas de chamar a atenção para estas novas velhas espécies, mas passa igualmente pela sua promoção junto dos meios convencionais. “ Alguns grandes distribuidores estão muito interessados, até porque percebem o valor da produção local.”
O RADIANT envolve 29 entidades de 12 países (Eslovénia, Reino Unido, Hungria, Espanha, Grécia, Itália, Alemanha, Irlanda, Bulgária, Países Baixos e Chipre, além de Portugal) e tem como parceira a FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. O financiamento vem do Horizonte 2020 (H2020), o programa-quadro comunitário europeu para a Investigação e Inovação.
Marta Vasconcelos sublinha que este é um projeto de agricultura participativa, pelo que “qualquer agricultor se pode juntar”.