Beatas de cigarro, escovas de dentes, garrafas de todos os tamanhos e feitios, palhinhas, tampas, pedaços de mobiliário, embalagens de alimentos, centenas de detritos plásticos indistintos e coloridos deixaram Luís Quinta, conhecido fotógrafo de natureza, angustiado com o estado da praia da Fonte da Telha, popular areal da costa sul do Tejo. Era fevereiro e o mar bravo de inverno devolvia à terra uma ínfima parte do que os terráqueos à água continuam a deitar.
Tirou fotos, publicou-as nas redes sociais, no seu blogue e chamou a atenção de Ana Pêgo, bióloga marinha, que se tem dedicado a ações de educação ambiental sobre a poluição nos oceanos. Ela tinha andado a investigar o tema do plástico nos oceanos e mostrou-lhe fotografias de umas esculturas feitas com lixo apanhado na praia, nos Estados Unidos da América. Não se conheciam, mas daí a decidirem construir algo impactante com os detritos que chegam à costa nacional, foi um passo.
Resolveram criar uma escultura semelhante ao esqueleto de uma baleia de barbas. A instalação seria integralmente feita com plástico marinho. Demoraram um mês e meio para lhe dar forma. Durante seis dias caminharam pelas praias de Almada, onde mora Luís, e da zona do Guincho (Cascais), onde reside Ana. Recolhiam apenas objetos de plástico branco: copos e garrafas de iogurte, garrafões de lixívia, chinelos, esferovite. Guardaram tudo numa garagem, pediram ajuda à irmã de Ana, que é escultora, e meteram mãos à obra.
Com o apoio de Câmara Municipal de Almada (para a qual Quinta já tinha co-realizado, com Ricardo Guerreiro, um documentário sobre a vida selvagem do concelho), rapidamente se instalaram nos estaleiros da autarquia e, com ajuda dos serralheiros camarários, criaram a estrutura metálica que suporta os 250 peças de lixo marinho de “Balaena plasticus”.
“Acho que a minha missão vai ser alertar para o problema do lixo marinho. É uma coisa medonha, local e global” inquieta-se Luís Quinta. Para Ana Pêgo, atuar contra a poluição nos oceanos também é urgente: “Durante a pesquisa que fiz sobre o tema fiquei surpreendida sobre o estado da poluição causada pelo plástico, a maioria das pessoas não está alerta. Os compostos tóxicos que estão na sua composição entram na cadeia alimentar, por bio-acumulação: dos peixes pequenos para os maiores, depois para os mamíferos, até aos predadores do final da cadeia. Fiquei muito alarmada com alguns documentários que vi, como “Addicted to Plastic” (Viciados em Plásticos, em tradução literal).
A instalação já foi apresentada ao público, na “Semana Verde” organizada pelo município almadense, entre 29 de maio e 5 de junho. Esteve exposta na Praça da Liberdade e Ana explicou os porquês daquela construção a mais de 4000 crianças das escolas do concelho. “Não conhecem o esqueleto de uma baleia e não reconheciam logo o que era, pensavam que era um dinossauro. Mas quando percebiam que tudo aquilo era feito com lixo que vinha do mar ficavam muito surpreendidas”.
A partir de 22 de julho, “Balaena plasticus” vai mostrar-se no Centro de Monitorização e Interpretação Ambiental da Costa de Caparica (junto ao Jardim Urbano, em São João da Caparica) integrada na exposição “Mar Sem Lixo, Oceanos de Vida”, que pretende alertar para a importância da preservação dos oceanos e dos ecossistemas costeiros. Se por lá passar, depois um dia de praia, não se esqueça de colocar o seu lixo no contentor apropriado.