Portugal é um país de paradoxos: tem uma das mais altas taxas de produção de energia elétrica a partir de fontes renováveis da Europa (quase 60% no ano passado); é um importante exportador de tecnologia verde; foi um dos primeiros e mais ambiciosos a traçar planos para a mobilidade elétrica (ainda no tempo de José Sócrates); situa-se entre os países mais bem-comportados na emissão de dióxido de carbono (apesar de a crise económica desempenhar aqui um importante papel).
E ao mesmo tempo tem, há meio século, mais de cem mil metros cúbicos de solos contaminados com substâncias perigosas, como chumbo, mercúrio, arsénio e crómio, nos antigos terrenos da Siderurgia Nacional, no Seixal.
“A incapacidade de resolver estas situações retira-nos credibilidade para falarmos dos novos temas ambientais, como alterações climáticas, energias renováveis, eficiência energética, cidades sustentáveis e reabilitação urbana”, diz à VISÃO Jorge Moreira da Silva, ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, durante um périplo por alguns dos “passivos ambientais” mais antigos do País, como o Seixal e o Barreiro.
“Esta agenda, que gera riqueza e emprego, não nos deve fazer perder de vista a obrigação moral de eliminar os passivos que estão connosco há muito tempo.” A atual época de crise seria precisamente a altura errada para resolver problemas com dezenas de anos de existência, não fossem as verbas europeias, que comparticipam os dispendiosos trabalhos em 70 por cento os seis passivos visitados por Jorge Moreira da Silva têm um custo de resolução superior a 50 milhões de euros.
“Estas intervenções são reclamadas pelas populações há décadas e não há razão para que não se aproveite o financiamento comunitário ainda disponível este ano e no próximo, do quadro comunitário vigente.” É uma corrida contra o tempo: todas as empreitadas (ou as respetivas fases aprovadas) têm de estar concluídas até ao final de 2015, para não se perderem os fundos.
Dar um preço à poluição
Tratar lamas tóxicas e recuperar antigas minas são o tipo de tema que costuma estar arredado do atual discurso ambiental, praticamente todo virado para o novo paradigma de desenvolvimento sustentável, em que o Ambiente faz parte da cura e não da doença (do ponto de vista económico, obviamente).
“O nosso desígnio é proporcionar a proteção ambiental e, simultaneamente, uma carteira de atividades económicas e de emprego”, defende o ministro, dando como exemplo o cluster eólico exportador, criado em Portugal. A ideia é limpar a casa antes de tratar da decoração. Foi também nessa linha que se chegou recentemente ao número de 835 casas no litoral, em risco ou construídas ilegalmente, que deverão ser demolidas nos próximos meses, a propósito do Plano de Ordenamento da Orla Costeira. Daqui, o País poderá dar o passo seguinte com outra convicção. “Vamos lançar um plano de ação para o crescimento verde”, diz Moreira da Silva, acenando com os 4% de subida anual do setor, a nível mundial.
Esta aposta, no entanto, não se limita ao melhor aproveitamento da água, do vento e do sol “o nosso petróleo”, sustenta, “e em que Portugal já é visto como um campeão.” O governante avisa que, cada vez mais, a competitividade estará alinhada com a sustentabilidade. “O preço da poluição irá repercutir-se no preço final dos produtos.
Quem quiser vencer nesta economia terá de poluir menos.” Para justificar as suas palavras, Jorge Moreira da Silva cita um estudo recente de uma associação da indústria automóvel alemã que atribui apenas 10% dos custos do produto final aos salários, enquanto os recursos pesam 30 por cento.
Um país que pretende estar no primeiro mundo da tecnologia limpa, no entanto não pode ter problemas ambientais de terceiro mundo por resolver. Mas este é apenas um passo. Passivos ambientais como o da Quimiparque, no Barreiro, ou a Siderurgia Nacional, no Seixal, não deverão ficar totalmente resolvidos antes do final desta década.
OS PASSIVOS
Os seis problemas ambientais visados pelo Ministério do Ambiente são de diferentes tipos e escalas. Nas antigas minas de carvão de São Pedro da Cova (Gondomar) e na área industrial de Alcanena, há dezenas de milhares de toneladas de resíduos e lamas perigosas, que serão transportadas para a Chamusca e tratadas pelo CIRVER (Centro Integrado de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos).
Em Santo André, encontra-se em fase terminal a remoção de 265 mil toneladas de lamas oleosas, ali depositadas há 32 anos. Também na reta final estão os trabalhos de recuperação da Mina do Lousal.
Por fim mas ainda longe do fim, encontram-se em resolução os maciços passivos ambientais da Quimiparque e da Siderurgia Nacional, situações com 30 e 50 anos de vida.