Apesar de vários inquéritos à escala nacional e europeia colocarem o ruído entre as maiores preocupações dos portugueses, este é um tema raramente mencionado na comunicação social ou pelas associações de ambiente, estando praticamente excluído na política governamental.
Comparativamente com os resíduos ou a política da água ou do ar, o ruído é um parente pobre, apesar dos enormes impactes que causa na saúde pública. De facto, a poluição acústica é responsável por um grande conjunto de efeitos, onde o mais óbvio é a surdez, mas a que se pode acrescentar o stress, perturbações do sono, aumento da tensão arterial, maior incidência de doenças cardiovasculares, dificuldade de aprendizagem nas crianças, entre outros problemas. Há estudos que reportam 50 mil mortes prematuras na Europa por ano devido a ataques cardíacos decorrentes do ruído, existindo vários documentos da Organização Mundial da Saúde a confirmarem a mesma preocupação e a fornecerem dados semelhantes.
Curiosamente esta é uma temática em que Portugal foi (e nalgumas vertentes ainda é) progressista, embora infelizmente só no papel. Já no ano 2000, Portugal publicou legislação que obriga ao desenvolvimento de mapas de ruído por parte de todos os municípios, nos quais estão definidos limites, extremamente ambiciosos, com implicações nas novas áreas de construção, impedindo-as de avançar se os valores fossem excedidos. Em 2002, a União Europeia publicou finalmente uma Diretiva estabelecendo regras e objetivos comuns. Em 2006 e depois em 2007, Portugal viria a integrar as novas regras europeias e a reduzir algumas das exigências.
Assim, de acordo com as regras atuais, todos os municípios e um conjunto vasto de infraestruturas rodoviárias, ferroviárias e aeroportuárias, deveriam ter desde o início de 2008 mapas de ruído, seja de acordo com a legislação europeia, seja com a nacional. Mais ainda, deveriam já estar disponíveis planos de ação (para os casos abrangidos pela Diretiva europeia) ou planos municipais de redução de ruído para os restantes, onde medidas diversas permitissem cumprir os valores-limite onde os mapas tenham revelado excedências. Por último, os municípios deveriam classificar zonas sensíveis, correspondentes a áreas com escolas, hospitais, ou habitação, com valores menores (e portanto mais exigentes) dentro dos indicadores de ruído global (ao longo de 24 horas) e ruído noturno (das 23h às 7h), definindo também limites, menos exigentes, para as zonas mistas (as restantes).
Esquecendo por agora as infraestruturas de transporte, só cerca de 70 municípios de Portugal Continental têm mapas de ruído, quando a obrigação da legislação nacional é para todos, no novo formato compatível com as regras europeias, desde 31 de Dezembro de 2007. Em Dezembro de 2011 não havia nenhum plano municipal de redução recebido e aprovado pela Agência Portuguesa do Ambiente, entidade nacional responsável pela área do ruído.
Mais ainda, o ruído é um tema quase tabu para muitas autarquias, porque as medidas de redução de ruído exigem um esforço para serem incluídas no planeamento municipal e por vezes também são difíceis de aceitar pela própria população (como sejam restrições de tráfego, nomeadamente obrigando a uma redução da velocidade). Assim, o facilitismo tem sido a regra e, em muitos casos, classifica-se como zonas mistas muitas áreas onde se exigia uma classificação como zona sensível.
Entre uma ambição que não se concretizou e o remeter para o esquecimento de um problema ambiental fulcral, é fundamental que as autoridades, em particular as autarquias, as entidades responsáveis pelas infraestruturas de transporte e o Ministério do Ambiente se tornem mais ativos em relação a este tema. Menos importante é o trabalho de sensibilização que as Organizações Não Governamentais têm desenvolver, como é o caso da Quercus que tem um projeto nesta área com a Federação Europeia de Transportes e Ambiente (T&E).