À medida que a crise climática se intensifica, potenciar a biodiversidade nas áreas urbanas tornou-se uma necessidade “para ontem”, como diríamos em bom português. De acordo com o relatório Impacts a perda de biodiversidade está a acelerar em todo o mundo e reverter este declínio constitui-se um grande desafio, especialmente nas cidades, que é onde reside a maioria da população mundial. O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) salienta a necessidade de uma redução de 45% nas emissões de GEE até 2030 e 100% até 2050 para evitar o pior cenário associado ao decorrer das mudanças climáticas.
Um mundo natural saudável é vital para criar locais urbanos resilientes. Esta sinergia está a ser levada de forma cada vez mais séria pelas cidades, nomeadamente desde a pandemia. Espaços verdes e cursos de água limpos, bem como regeneração de territórios podem ser a resposta que necessitamos. As plantas e árvores reduzem a poluição e a temperatura e a paisagem natural pode ser uma aliada na mitigação de inundações. Por outro lado, zonas verde, parques naturais e jardins, promovem variedades de resposta no suporte do nosso bem-estar mental e físico.
Quando a biodiversidade é incorporada nas políticas de gestão, na alocação de recursos e na gestão de territórios, os resultados estão à vista. Um exemplo claro desta metodologia foi a restauração dos recifes de ostras em Hong Kong, onde uma única ostra pode filtrar 200 litros de água poluída por dia, melhorando a qualidade deste elemento essencial à vida, enquanto revitaliza espécies.
A necessidade de estabelecer uma relação sólida entre a natureza e as metrópoles é muito real. Muitas cidades globais estão já a fazer progressos com abordagens criativas de forma adotar soluções baseadas na natureza, que nos protegem das alterações climáticas e visam a redução das emissões globais de gases com efeito de estufa.
Na cidade de Lisboa, o projeto de introdução de espécies autóctones vegetais no jardim Teófilo Braga, traduziu-se num arrefecimento na ordem dos 2,4 ºC, um resultado notório quando se trata de reduzir temperaturas na cidade. Este estudo consistiu na exploração de quais os tipos de espécies vegetais que se colocam ou substituem nos espaços verdes de forma a obter bons resultados.
É inegável que as cidades dependem da natureza e dos serviços dos ecossistemas não só para sustentar a vida, mas também para melhorar a qualidade de vida. Os ecossistemas protegem e até regeneram os sistemas naturais, aumentando assim os serviços ecossistémicos que prestam e criando comunidades ecologicamente resistentes e capazes de resistir e recuperar de inundações episódicas, secas, incêndios florestais e outros eventos catastróficos.
Este caminho pode ser trilhado através de uma aposta na biodiversidade, incorporando uma fauna e flora ativas, regeneradoras e promotoras de novas espécies, valorizando as espécies arborizadas locais. A adaptação das novas soluções viárias, como por exemplo as ciclovias, é também um fator preponderante, a par da pré-existência das linhas verdes, que valorizam cada arvore como património natural. É, por isso, necessário promover o “continuum naturale” em meio urbano com a criação e revitalização dos diversos espaços verdes e da realização de atividades que aproximem as comunidades, incluindo apoio a iniciativas locais de sensibilização.
Um dos objetivos do Novo Quadro Global para a Gestão da Natureza das Nações Unidas até 2030 é conservar pelo menos 30% das paisagens terrestres e marinhas para a restauração ou proteção de áreas biodiversas. Parques, locais abandonados, rios, jardins privados e até parques rurais próximos dos Distritos Centrais de Negócios (CBDs) podem contribuir significativamente para este propósito, multiplicando também o número de espécies de plantas e insetos e, por outro lado, removendo dióxido de carbono do ar.
Por outro lado, a gestão da água surge como fator crucial em qualquer estratégia de desenvolvimento urbano. A ONU prevê que 68% da população mundial viverá em áreas urbanas até 2050, um fenómeno de rápida urbanização que está a levar as cidades a procurar novas fontes de água limpa e a aumentar a descarga de águas residuais, causando efeitos secundários nas comunidades e ecossistemas circundantes.
Simultaneamente, as mudanças climáticas estão a afetar o abastecimento de água e o saneamento como nunca antes visto. Eventos extremos como secas e inundações, a par de contaminações estão a reduzir a disponibilidade de água. Ao contrário do desejado, o planeamento urbano não está a acompanhar o crescimento populacional e por isso, as estratégias de desenvolvimento urbano sustentáveis são essenciais para fazer face ao atual panorama, devendo priorizar a gestão da água, o controlo da poluição, o ambiente construído e a gestão de resíduos sólidos.