Reconhecer o Planeta Terra como Mãe e eleger um Dia Internacional à Mãe de todas as Mães deveria ser encarado como um hino à nossa existência. Deveria originar um programa global, de todas as instituições, como denominador comum, consciencializando a humanidade da urgência em respeitá-la e dignificá-la ao longo de toda a sua vida.
Quem visita a Herdade do Freixo do Meio, área protegida privada com mais de 400ha, e tem a sorte de ser brindado por uma visita guiada pelo seu mentor e proprietário, Alfredo Sendim, leva sempre como inspiração a pergunta: se não tratamos mal a nossa Mãe, então porque escravizamos a nossa Terra?
O Planeta Terra, com mais de 4,5 mil milhões de anos, já sofreu um número infindável de alterações, quer na sua base física (o planeta propriamente dito) quer no seu sistema de funcionamento (sistema terrestre), tendo este chegado a um padrão de funcionamento estável em que foi capaz de criar as condições necessárias para que a vida existisse e as espécies evoluíssem, entre as quais a nossa. Este planeta único, incluído num singular sistema solar de entre triliões de outros sistemas e galáxias, a 150 milhões de km do Sol, intitulado como o berlinde azul (the blue marble) pela equipa da missão Apollo 17, em 1972, após a primeira fotografia de silhueta completa sem sombras.
Foram precisos 4 milhões de anos para que o Homem iniciasse a sua viagem de Homo habilis para Homo sapiens, até há cerca 200 mil anos, sendo que só foi possível criar os primeiros aglomerados “urbanos” após a 1ª revolução agrícola, ou seja, há pouco mais de 10 mil anos.
Segundo as Nações Unidas, neste momento já somos mais de 8 mil milhões, prevendo-se os 8,5 mil milhões em 2030 e atingindo os 10 mil milhões na próxima década de 50. Além disso, conseguimos criar megacidades, com mais de 10 milhões de habitantes, algumas delas com menos de 200 anos de existência.
Toda a civilização que construímos só foi possível tendo como suporte a estabilidade climática e um equilíbrio entre vários sistemas e ciclos. Hoje, a ciência permite-nos ter a noção do impacto que as interferências causadas pela ação da Humanidade têm neste funcionamento, e que resultam na destruição da nossa Mãe.
O excesso de emissões de gases de efeito de estufa, provocado pela nossa opção energética baseada em combustíveis fósseis, criou um desequilíbrio no sistema climático terrestre, através do aquecimento global, que deve ser revertido quer pela redução de emissões desses gases, quer pelo aumento da capacidade de sequestro.
Em 1970, há pouco mais de 50 anos, quando foi criado o Dia da Terra, apesar dos alertas, respirávamos, ainda assim, apenas 325 ppm de CO2, sendo que hoje temos já 416 ppm, além de que naquele ano, emitíamos 14 Gt de CO2 e hoje emitimos 37 Gt.
A última vez que a Mãe Terra tinha estes níveis de concentração foi há mais de 15 milhões de anos, estimando-se que existia uma temperatura média global superior em 3 a 6 o C à que temos atualmente e os oceanos 25 a 40 metros acima do nível atual. Curioso é que nós, Humanidade, ainda não existíamos.
Ter a noção desta escala, da nossa origem e desta ordem de grandeza deveria fazer-nos pensar na nossa ação e nas nossas escolhas, sejam elas individuais ou coletivas.
É verdade que desde 1970 muita coisa piorou, mas é igualmente verdade que muita coisa melhorou e continua a melhorar. O que é preciso estarmos todos a caminhar na mesma direção. Não adianta 1/3 do mundo ir mais rápido na direção da sustentabilidade e os outros 2/3 atrasarem o caminho da remediação.
Começámos a recuperar a camada de ozono, hoje evitam-se muitos poluentes químicos, aumentámos a eficiência energética, estamos a caminho de uma transição para energias renováveis, 197 países assinaram o Acordo de Paris em 2015 e desde aí assumiram-se compromissos para sermos neutros em carbono. Foram já recuperadas populações de algumas espécies em vias de extinção, apesar de muitas perdas, estimando-se que o histórico acordo alcançado em dezembro último em Montreal, por 195 países, para a meta 30% de área protegida de todo o planeta até 2030 venha a permitir uma maior progressão na recuperação de mais ecossistemas e habitats naturais.
Existe, no entanto, uma ação que o Homem ainda não apreendeu da natureza. Chama-se COOPERAÇÃO. Se entre as nossas instituições, seja na ação individual e global, mimetizássemos os processos resultantes da natureza, tal como acontece em cada célula, árvore ou floresta, em cada relação entre bactérias ou espécies, em que nada se perde, nada se rejeita e tudo se transforma, em perfeito equilíbrio e simbiose, numa perfeita economia circular, tudo seria melhor.
No mundo dos homens faz falta a cooperação institucional, faz falta a abordagem multidisciplinar, integrada e holística. Faz falta a implementação de modelos de ecogovernança e ecoeconomia. Nos mais diversos níveis, não existe uma lógica que permita um crescimento coletivo organizacional. Portugal não é exceção e muito poderia ser feito dentro e fora de portas, desde logo aproveitando a visita do líder do País com um dos maiores ativos ambientais do Planeta, a amazónia, no Dia da Terra. Não foi por acaso que o ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e Floresta, através da sua Missão Natureza 2022, colocou num dos seus objetivos a cooperação internacional, pois faz falta a todos os níveis.
A Mãe Terra, a terceira rocha, ou simplesmente “Home”, lembrando o E.T. que analogamente chamava referindo-se à saudade de viver no seu planeta, está nas mãos dos seus filhos e por isso, como diz a música “Mãe”, de Caetano Veloso, “eu canto, grito, corro, rio, e nunca chego a ti”.