Pode alguém ter nascido para viajar? Quirino Tomás começa a acreditar que sim. Há três meses apanhou um avião para Pequim e desde então anda pela China sozinho, explicará por Skype em Cantão, depois de atravessar a cidade para comprar o bilhete de autocarro do dia seguinte. Três meses no país com mais habitantes do mundo já sobram para perceber que, por ali, os transportes ficam rapidamente superlotados.
E ele quer ir à região de Guilin e depois passar por Haikou, Sanya, Nanning e Kumming, esta última etapa na verdade só para apanhar mais um autocarro até Shixuanbanna, na fronteira com o Laos.
No Laos, onde os falantes de inglês e os ocidentais como ele de mochila às costas e pouco dinheiro no bolso são mais numerosos, entrará numa fase mais fácil da viagem. Uma viagem que começou com Quirino a sentir-se analfabeto como a avó que deixou em Rio Maior e agora o traz de ego inchado.
“Não sou um suprassumo do desenrascanço mas se calhar nasci para isto.” O balanço é superpositivo, diz. “Ainda não fui vítima de nenhum esquema irreversível para a minha carteira nem notei que me tivessem tirado nenhum órgão importante”, resume com uma gargalhada.
Quirino segue uma rota pré-definida com a ajuda de um português que viveu na China. “Deve haver uma planificação mínima sob pena de andar sempre ao sabor do vento. Porque a China é muito grande e, como alguém disse, ‘Transports are killing me!‘.” Daqui a uns nove meses, deverá chegar a Istambul. A ideia de uma viagem longa vinha de há bastante tempo (“O mundo é grande e eu quero vê-lo “) e a altura ideal chegou aos 27 anos, quando terminou a bolsa de investigação de três anos em engenharia civil.
Com o dinheiro que conseguira amealhar pensara percorrer Istambul-Pequim mas inverteu o percurso ao ver a mãe entrar em pânico com a ideia de que entraria no Paquistão com pouca estaleca. Condescendeu. “Pode ser que esteja mais bem preparado. Mas nisto de viajar também é preciso sorte.”
Roleta-russa à mesa
No blogue www.historiasdovento.com Quirino conta o que lhe vai acontecendo. Como é habitual nos relatos de viagem não será preciso procurar muito nas entrelinhas para encontrar dicas úteis a futuros viajantes. A mais importante talvez seja perder as peneiras ocidentais. Convém aprender umas palavras de mandarim, preparar o dia seguinte com os nomes dos sítios já escritos em chinês e sobretudo acabar de vez com a pretensão de “Ai, eu não estou a ir por um sítio turístico”, ensina.
“Aqui nunca podemos dizer ‘Cheguei ao fim da estrada, não existe ninguém’. Os chineses são uma massa humana grande que se move muito. Talvez num parque natural eu consiga ficar sozinho se me desviar dois ou três quilómetros porque eles andam muito em grupo, com guia e bandeirinha.” Num cruzamento é quase certo que o grupo vai para um lado e o português para o outro.
Por ordem de importância a segunda dica será misturar o campo com a cidade. “A maneira certa para não deitar a China pelos olhos é ir metendo pelo meio alguma natureza. Façam isso porque as belezas naturais aqui são espetaculares. Há lugares tão bonitos que chegam a ser comoventes.” Só não contem com ele para conselhos gastronómicos. Como nunca foi esquisito a comer, e tem como único objetivo encher a barriga sem ser enganado (financeiramente falando), Quirino vai a restaurantes com tudo em chinês e aponta para uma coisa qualquer no menu. “Gosto de jogar à roleta-russa e às vezes corre muito mal”, ri-se. Quando corre bem sente-se feliz e pensa: “Gostava que isto fosse a minha vida. É uma utopia?”
99 dias de férias
Foi o que Jorge Vassallo pensou há dez anos quando ainda estava na publicidade e tinha mais ou menos a idade de Quirino. Decidiu largar a agência e dar uma volta ao mundo mas o dinheiro acabou na América do Sul.
Nos cinco anos seguintes trabalhou como freelancer e sobrava-lhe tempo e dinheiro para passar uns três meses por ano fora de Portugal. O seu blogue www.fuidarumavolta.blogspot.pt tornou-o conhecido no meio (ganhou o Super Blog Awards de 2008) e o livro escrito com Carlos Carneiro (Onde vais com 1000 euros?, relato de um Lisboa-Dakar de bicicleta) foi o empurrão que faltava para ser convidado para líder de viagens, em 2009.
Um líder de viagens não é um guia. Não tem um saber enciclopédico mas sabe improvisar à frente de um grupo pequeno de pessoas (no máximo dez a doze). Jorge faz quatro vezes por ano uma viagem pela Indochina que esgota com meses de antecedência na Nomad (na agência há mais onze colaboradores como ele). Este ano estreia-se na Birmânia (também já esgotada), destino que junta à Turquia e ao Transiberiano. “A Nomad é o concluir de um processo”, diz.
Aos 36 anos, Jorge está sempre a viajar. Nunca fica parado em Portugal mais do que dez ou quinze dias. Nos pedidos de visto à frente da palavra “profissão” já se habituou a pôr writer (escritor) mas houve tempos em que escrevia traveller (viajante) ou mesmo dreamer (sonhador). Quando falámos por Skype encontrava-se numa praia colombiana junto das Caraíbas, a gastar os últimos dos 99 dias pela América do Sul, com um amigo indiano.
Caía uma tempestade má para os planos de se pôr de papo para o ar. Eram as suas férias antes de embarcar em mais um Transiberiano mas continuava a escrever no blogue, a alimentar a página no Facebook e a resolver questões logísticas relacionadas com a Nomad (o voo para Moscovo é já no dia 23). “Não consigo desligar”, confessava. “E por defeito de profissão começo logo a identificar possíveis programas.”
O carisma de ‘Valentina’
Chegáramos ao Jorge Vassallo por sugestão de Inácio Rozeira, também líder da Nomad que em março deste ano começou uma volta pela América do Sul numa pão de forma. O seu blogue (www.daravolta.com) transborda de boas histórias. Entre 2010 e 2011 já viajara com a namorada, Helena Pimentel, de sidecar pela Índia. Essa foi a primeira aventura juntos.
Há uns dias Inácio e Leninha haviam chegado a Punta Arenas, onde foram recebidos com cinco graus negativos. Mudaram-se para um quarto aquecido num hostel e disseram “até já” à Valentina, comprada em S. Paulo.
O nome foi escolhido por quem segue o casal no Facebook. Faz sentido ao ouvir Inácio dizer: “Para mim viajar não é um ato egoísta. Não sou adepto do viajante sacrificado que anda sozinho de mochila e sem dinheiro. Com o Facebook, além da promoção [são patrocinados pela Nomad] absorvemos a energia positiva das pessoas.” Nas grandes cidades Inácio e Helena vão conseguindo ficar alojados em casa de portugueses e de brasileiros.
Em qualquer lugar onde parem fazem-no com um objetivo: procurar boas histórias. Em Cateura, no Paraguai, conheceram a Orquestra de Instrumentos Reciclados. E em Punta Arenas já sabem que há caça à santola e pescadores que caçavam baleias. “Queremos descobrir a ‘alma sul-americana’.” O resultado será muito provavelmente um documentário. “Um livro seria fácil”, descarta Inácio. Bastaria compilar o que vai sendo publicado na internet. Quase todos os dias o casal filma novas histórias. Inácio escreve no blogue e Leninha usa o Instagram e vai alimentando as redes sociais. Fazem-no com disciplina porque existe um compromisso com quem acreditou neles.
Antes de viajar Inácio rapou o cabelo mas que ninguém veja nisso uma tentativa artificial de mudar alguma coisa aos 36 anos, por favor. “Uma viagem transforma-nos mas não é necessário. Viajar é um processo de aprendizagem. É a única coisa em que gastas dinheiro e sais mais rico.”
À boleia de um veleiro
Dinheiro é coisa que não entra na equação de Francisco Pedro, 26 anos, jornalista voluntário da rede Indymedia que por estes dias está na Bélgica depois de um imprevisto familiar interromper a viagem que fazia com a namorada pelos Andes venezuelanos. Em dezembro do ano passado Francisco apanhou boleia num veleiro a caminho dos Barbados; dali partiu para a Martinica e mais tarde para a Venezuela, a bordo de um outro barco. Tinha ouvido falar do bateaustop e decidiu procurar uma boleia nas marinas algarvias.
Enquanto esperava foi trabalhando em quintas até arranjar lugar a bordo do Marie des Isles, propriedade de um casal, Jacques e Katty, que já foram hippies e agora se fazem pagar para levar mochileiros ao outro lado do mundo. O português trocou a boleia numa regata transatlântica de barcos clássicos por um filme que realizou durante a travessia e editou na Martinica.
Francisco é um ativista que viaja como vive: em clara dissidência com a sociedade de consumo. Quase não usa dinheiro, a tenda é a sua casa mais fixa e quando não recebe géneros em troca de trabalho alimenta-se de comida recuperada em supermercados.
Desde 2009, ano em que fez um estágio em Timor ao abrigo do programa INOV-Mundus, que não apanha aviões. “Seria batota”, diz pelo Skype, ainda na Venezuela. Mas conta que o clique aconteceu anos antes, durante o Erasmus: “Bruxelas abriu-me os olhos para muitas coisas. Naquela altura havia grupos de imigrantes sem documentos que ocupavam igrejas.
Senti-me patético. Eu, branco europeu, tenho uma bolsa para passar fronteiras e estudar. E uma pessoa que só quer enviar dinheiro para a família é tratado mal.” Após o curso este filho de professores da Linha de Sintra passou três meses na Guiné (numa ONG), em Timor e no Luxemburgo (como voluntário).
Aproveitou a passagem por Timor para viajar pelo Sudeste asiático e o Luxemburgo para conhecer a Europa. E ficou viciado. “Só me dá vontade de conhecer mais pessoas e formas de viver diferentes daquelas com que cresci em Portugal.”
Uma última aventura
O clique de João Marques mete um livro de Isabel Allende, Paula, uma carta de 200 páginas à filha doente. A escritora chilena teve uma vida de viajante pela América Latina que descreve de maneira fabulosa. Eram outros tempos. Ainda assim João e a mulher, a mexicana Sol (de Soledad), ficaram encantados com a sua visão da cidade boliviana La Paz. “Íamos trocar o México por Portugal. Percebi que seria difícil regressar à América Latina e propus à Sol uma grande viagem.”
João era diretor financeiro numa empresa de construção portuguesa e trabalhava na Cidade do México há quatro anos. Tinham algum dinheiro de lado, não muito, o suficiente para uma viagem low cost que implicava comprarem uma pão de forma (combi, diz-se por ali). Na internet encontraram uma à venda em Guadalajara, a 700 quilómetros da Cidade do México, onde sabiam de um mecânico. O homem aceitou ser ele a adaptá-la com a ajuda do casal que acampou no quintal da sua casa durante três meses.
A Amália Frida começou a mover-se em agosto do ano passado, iniciando o périplo pelas terras de familiares e amigos de Sol, como se pode ler no blogue www.1000destinos.net. Depois do México aceleraram pela Guatemala, Salvador e Honduras. Na Nicarágua ficaram um mês e outro tanto na Costa Rica e no Panamá. Era Natal quando chegaram a Bogotá e aceitaram o convite de uma família colombiana para se juntarem a eles na noite de 24.
No Equador a Amália Frida cansou-se. Foi preciso mudar-lhe algumas peças e João e Sol aproveitaram para passear de autocarro. A combi fez-lhes falta. Têm dormido nela 70% das noites. “Morar num carro é algo fora dos padrões de qualquer um”, nota João. “Mas quando voltamos à estrada tudo se torna mais fácil e lembramo-nos porque é que viajamos. Com uma certeza: a vida que se segue não vai dar para muitas aventuras destas.”
Pela ‘Ruta del Che’
Dez meses de estrada e com apenas mais uns seis pela frente deixam João nostálgico. À conversa no Skype em Asunción, capital do Paraguai, tenta o balanço de uma viagem que já ganhou os adjetivos “dura” e “incrível”.
De memória elege três locais: Machu Pichu, no Peru, onde chegaram depois de umas horas de autocarro e dez km de caminhada (“Apesar de tantas vezes vermos as fotografias o lugar é uma surpresa”); as ilhas feitas de tutora do lago Titicaca, acessíveis pelo lado peruano (“Hoje é para turistas mas continuam impressionantes”); e a Ruta del Che, na Bolívia (“O acesso é complicado porque não desenvolveram em termos turísticos mas podese ter a nossa sorte e apanhar um taxista que conheceu o Che Guevara”).
Na Bolívia João e Sol sentiram-se encurralados ao fim de quinze dias de bloqueo (são famosos os protestos da população bloqueando estradas e ruas). E confessam que quase só cruzaram a Argentina para comer carne ótima e barata. Planeiam passar o fim de ano no Brasil mas o percurso pode ser alterado. “Nesta altura nem fazemos planos”, conta João. “São as pessoas que nos dizem para onde ir.” Quando chegaram a Asunción, por exemplo, sabiam apenas que queriam visitar antigas missões de jesuítas.
12 mil km num ‘tandem’
Bem longe dali, algures na Europa do Norte (em princípio já a sair da Lituânia), deverão estar Telma Pereira, de 23 anos, e Tiago Lyrenkönen, de 25, a pedalar um bocadinho ao sabor das dicas dos donos nos sofás onde vão dormindo de graça. Partiram do Cabo da Roca há três meses e meio rumo ao Cabo Norte, na Noruega. Ao longo dos 12 mil quilómetros querem parar em todas as capitais europeias.
Percorrem entre 40 e 85 quilómetros por dia na Abília, a bicicleta tandem que compraram a preço de custo por intermédio da Casa Abílio Bike, de Tavira. Na Alemanha a Abília foi soldada porque começava a rachar com tanto peso e quilómetros de estrada; na Polónia ganhou um pneu e vários raios novos; e quando conversámos por email andava sem um travão por ter uma roda empenada.
“A sorte no meio do azar é que os polacos são pessoas espetaculares e ajuda foi coisa que não nos faltou”, escreveu Tiago, enquanto Telma contava as últimas peripécias ao dono da casa onde estavam alojados, que pertencia à comunidade Warm Showers (semelhante ao Couchsurfing mas destinada a viajantes de bicicleta).
Telma e Tiago meteram-se a caminho com um orçamento reduzido. Vale-lhes o apoio dos amigos no Facebook que lhes transferem uns euros em troca de postais das cidades por onde passam (a página no Facebook está mais atualizada do que o blogue www.8milparanorte.blogspot.pt).
Em Lisboa os dois trabalham na Red Carpet, um empresa de fotorreportagem de eventos e concertos que Tiago criou com um amigo. É a primeira vez que saem numa aventura do género e sentem-se “pintainhos a sair do ovo”, confessa ele. “Vemos isto como um estágio. A Europa é o primeiro passo para os grandes viajantes que depois percorrem a América, África, Ásia. Para nós tudo era desconhecido mas assemelha-se ao que já conhecíamos.”
Pelo sudeste asiático
Ana Pio, de 31 anos, e o marido, Zé, de 45, arriscaram logo tudo. No final do ano passado ela vendeu o seu pequeno café-pastelaria em Teixoso (uma vila a 8 km da Covilhã), ele despediu-se da Pousada da Juventude das Penhas da Saúde (na serra da Estrela) e em fevereiro enfiaram-se num avião em Madrid rumo à Tailândia, com duas mochilas de 40 litros cada. A ideia era conhecer o máximo que pudessem do Sudeste asiático e, se eventualmente encontrassem um sítio de que gostassem muito, deixar-se ficar.
Em Banguecoque bateram à porta da embaixada portuguesa com uma lista de perguntas, na ideia de começarem a fabricar e a vender pastéis de nata na cidade (Zé é pasteleiro). Mas quem os recebeu despachou-os com a falta de tempo (“Acabei de regressar de férias, não posso ajudá-los”) e um conselho: “Não se metam nisso, isto é um país de corruptos.” Ana escreveu uma carta a contar o que se passara a Pedro Passos Coelho (a que o primeiro-ministro nunca respondeu) e continuaram caminho.
À Tailândia seguiu-se o Camboja e o Vietname. Adoraram Ho Chi Minh City mas foi quando subiram ao Norte e chegaram a Hoi An, vila património da humanidade desde 1999 e onde ainda há vestígios da presença portuguesa, que decidiram parar por uns tempos. Um ou dois meses, calcularam, que afinal vão traduzir-se em pelo menos seis porque só assim conseguiram arrendar uma casa.
A perspetiva não lhes desagradou. “Somos de uma terra pequena, gostamos de sítios calmos”, admite Ana, naquele final de tarde num quarto de hotel na antiga Saigão, após 24 horas de autocarro. Iam passar dois ou três dias na maior cidade vietnamita, às compras de material para a loja de desporto que vão abrir no rés-do-chão da casa. Na estação das chuvas os finais de tarde são quase sempre chuvosos, aquele não era exceção.
Em Hoi An irão em breve aproveitar o segundo piso da casa para inventar uma guest house “muito informal” onde Ana promete inundar os hóspedes de dicas úteis. Afinal fez o curso de Recreação, Lazer e Turismo e trabalhou numa agência de viagens.
Pastéis de nata em Hoi An
Ana anda sempre com dois caderninhos, um para os desabafos e outro para os preços. Compila e compara tudo quanto compram e passa o mais relevante para o blogue (www.charmingdoces.blogspot.pt). “É importante os europeus conhecerem os hábitos e as artimanhas daqui”, justifica. “Por exemplo, regateia-se sempre mas até onde? Há coisas por que o estrangeiro paga 150 dongs e devia ser 70.” O tempo que levam de Vietname deu-lhes jeito nas compras para a loja.
E a viagem num sleeping bus só com camas vale mais uma dica aprendida na pele: escolham sempre o andar superior porque de dia o autocarro vai apanhando e largando passageiros. Ah, e não estranhem se for preciso trocar de viatura a meio da noite. Enquanto não procura um lugar de pasteleiro num dos hotéis de Da Nang, cidade com aeroporto internacional que dista apenas 24 quilómetros de Hoi An, Zé tem tempo para ensinar futebol aos miúdos da terra e surpreender os amigos portugueses.
Há quinze dias pôs no Facebook fotografias de vizinhos a experimentarem os primeiros pastéis de nata que fez no Vietname. “Só vos digo que nunca tinham provado nada parecido!”, comentou. “Ficam a olhar até com medo de comer :) Depois de trincarem não querem é largar!”
Voluntários na quinta
O uruguaio Leandro Fans, de 34 anos, também já se pôs à frente de um forno na viagem que iniciou em fevereiro com a portuguesa Rita Caupers de Bragança, 29, mas antes construiu o próprio forno. A estreia do chefe de cozinha aconteceu numa quinta que pertence à WWOOF (World Wide Opportunities on Organic Farms), em Itália, e deu-lhe gozo, escreva-se.
Era também a primeira vez que embarcavam neste programa de intercâmbio que põe em contacto pessoas que querem ser voluntárias com locais onde se faz agricultura biológica.
No início do ano ele disse “até já” no restaurante Sul, no Bairro Alto, em Lisboa, e ela avisou que durante dois anos não iria aceitar trabalhos de freelancer em produção de cinema e publicidade. Pela frente havia 50 países para conhecer, em 15 deles a fazer woofing. Para concretizar o Green Brick Road Project (projeto da estrada dos tijolos verdes) escolheram a Amarela, uma carrinha que anda a óleo vegetal usado. “Sempre nos considerámos viajantes com trabalhos que financiavam as nossas viagens.
Agora queríamos ir por um caminho que nos permitisse ser sustentáveis e autossuficientes”, explica Rita. Chegaram há pouco à Grécia, à região do Peloponeso, no sul, e adivinha-se que Leandro não vai conseguir manter-se longe da cozinha. “É mais forte que ele”, conta Rita. “E cada lugar onde passamos é um mundo novo de comidas e tradições culinárias.” Depois seguem para a Turquia, subindo pelo leste europeu até à Mongólia.
Não deverão ir na Amarela o tempo todo porque a carrinha precisa de um documento para entrar na Índia e em quase todos os países africanos que lhes custaria 20 mil euros. O óleo alimentar não vai faltando mas os apoios são bem-vindos na página www.greenbrickroadproject.wordpress.com é possível doar “pequenos tijolos”.
De carrinha, de mochila às costas ou de bicicleta Rita e Leandro continuarão a conhecer o mundo e a aprender com as comunidades locais. A fazer o que já faziam em Portugal. “Fomos turistas em Lisboa, não nos cansámos de passear e tirar fotografias. E o elétrico 28 era o nosso transporte para casa.” A curiosidade é o motor dos viajantes.
‘Bora pedalar?
Rafael Polónia, 36 anos, e Tanya Ruivo, 31, marcaram pontos quando fizeram Ovar-Instambul-Ovar de bicicleta, oito meses a dar ao pedal entre 2009 e 2010. E voltaram a marcá-los percorrendo Ovar-Macau ao longo de um ano e meio. Hoje desdobram-se em palestras e workshops em que ensinam como é isso de pedalar para viajar. E a agência Papa-Léguas convidou Rafael para líder de viagens faz Camboja-Tailândia e Irão-Istambul em duas rodas.
“A bicicleta é a melhor aproximação às pessoas”, defende. Quando não estão fora de Portugal Tanya é atriz no Teatro Regional da Serra de Montemuro e Rafael é diretor de cena. Em viagem levam dois computadores para irem escrevendo na página pessoal (www.2numundo.com) e colaborando em sites de jornalismo de viagens (incluindo o da VISÃO). Rafael sonha poder um dia largar o teatro. “Sou um viajante que vou tentar fazer das viagens profissão.”
Sempre a aprender
Na página www.osmeustrilhos.pt Sérgio Lopes e a namorada, Sandra Saraiva, dizem-se viajantes a tempo inteiro e juristas nas horas vagas. Na realidade trabalham na Segurança Social, em Lisboa, mas já não se lembram de umas férias passadas em Portugal. “Viajamos acima de tudo pela viagem, pelo que ela reserva e não à procura de lugares”, diz ele. “Viajamos para aprender e não para conhecer. E chegamos sempre mais cansados porque as nossas férias são uma aventura.”
Em maio passearam pela Alemanha e pela República Checa e agora já só esperam que chegue depressa setembro, mês em que vão atravessar a América Latina de costa a costa, do Atlântico ao Pacífico. Para quem tem de optar pelo low cost como eles, deixam um conselho: escolham locais mais próximos das populações, são habitualmente os mais baratos.
SUGESTÕES DE LEITURA
- A VOLTA AO MUNDO EM 80 DIAS, Júlio Verne
- VIAGENS, Marco Polo
- O GRANDE BAZAR FERROVIÁRIO, Paul Theroux
- SAHARA, Michael Palin
- VENEZA, Jan Morris
- CRÓNICAS DE UMA PEQUENA ILHA, Bill Bryson
- NA PATAGÓNIA, Bruce Chatwin
- O MUNDO É FÁCIL, Gonçalo Cadilhe
- A ARTE DE VIAJAR, Alain de Botton
- O JAPÃO É UM LUGAR ESTRANHO, Peter Carey
- O LADO SELVAGEM, Jon Krakauer
- O IMPÉRIO, Riszard Kapuscinski
- A TERRA VISTA DA TERRA, Seth Stevenson
- ATÉ ONDE VAIS COM 1000 EUROS?, Carlos Carneiro e Jorge Vassalo
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