Entre 2008 e 2019, o mês de abril era sinónimo de Peixe em Lisboa. Foram 12 edições de um festival dedicado ao peixe e marisco da nossa costa, trabalhados em ementas especiais por chefes de cozinha convidados, e que contava ainda com apresentações e um mercado gourmet.

Olhando para o programa do novo festival Heróis do Mar, que decorre entre os dias 3 e 6 na Doca da Marinha, é impossível não lhe ver semelhanças. “É um bocadinho a ideia original do Peixe em Lisboa”, admite Duarte Calvão, responsável pelo já desaparecido festival e que é curador deste Heróis do Mar, ao lado do jornalista Rafael Tonon. Mas há uma diferença, sublinha: “Lisboa é hoje uma cidade diferente em termos gastronómicos, com mais restaurantes, mais chefes, maior diversidade de cozinhas, pessoas mais interessadas, e mais clientes por conta do turismo e dos residentes estrangeiros.”

A seleção dos dez restaurantes, todos da região de Lisboa, pretende mostrar a qualidade e essa diversidade, reunindo chefes de cozinha que praticam uma cozinha de receituário tradicional – caso de Justa Nobre (O Nobre), Luís Gaspar (Pica-Pau) e Vítor Adão (Plano) – ou com influências do mundo – Paulo Morais (do japonês Kanasawa) e Kiko Martins (A Cevicheria e Las Dos Manos), por exemplo. Os outros restaurantes que estarão presentes são As Esquinas de Vítor Sobral, Epur by Vincent Farges, Zunzum de Marlene Vieira, Nunes Real Marisqueira e Maré de José Avillez (no Guincho). Para acompanhar, serão servidos vinhos da região de Lisboa.

O chefe italiano Moreno Cedroni, do La Madonnina del Pescatore (2 Estrelas Michelin) e do Clandestino Susci Bar. Foto: DR

Além dos menus informais (pratos €5 a €20), servidos numa área com 700 lugares sentados, vão realizar-se os chamados Banquetes – almoços e jantares a quatro mãos, que vão juntar, por exemplo, Quique Dacosta, do restaurante com o mesmo nome em Dénia, Espanha, com 3 Estrelas Michelin, com José Avillez (2 Estrelas no Belcanto, 1 no Encanto). Moreno Cedroni, do La Madonnina del Pescatore (2 Estrelas Michelin) e do Clandestino Susci Bar, ambos em Itália, cozinhará com André Lança Cordeiro (Essencial, Lisboa); Rafa Costa e Silva, do Lasai, no Rio de Janeiro, com João Oliveira do Vista (Algarve); e Justa Nobre e Vítor Adão vão preparar um almoço transmontano neste domingo, 6, último dia do festival.

Doca da Marinha em Lisboa

O programa inclui ainda tertúlias (sobre espécies de peixe desconhecidas, os efeitos do turismo e se há crise na restauração), apresentações de cozinha ao vivo com chefes e aulas de cozinha (com Cristina Manso Preto). Todas as noites haverá concertos, numa celebração da lusofonia, com a cabo-verdiana Lura (dia 3), o angolano Matias Damásio (dia 4), os portugueses GNR (dia 5) e a brasileira Mallu Magalhães (dia 6).

O festival é uma iniciativa do grupo Lean Man que explora a Doca da Marinha, dirigido por Bernardo d’Orey Delgado, e é produzido pela Essência Company, de Nuno Guedes Vaz Pires.

Heróis do Mar > Doca da Marinha > 3-6 out, qui-sex 17h-24h, sáb 12h-24h, dom 12h22h > entrada €5 (inclui um copo Riedel de oferta, uma degustação de vinho e duas águas), pratos €5-€20, Banquetes €150, €250 (jantar do dia 5, com Quique Dacosta e José Avillez) > programa completo aqui

Pedro Nuno Santos sabe ao que vai em S. Bento, no encontro com o primeiro ministro: receber uma proposta irrecusável. E se é irrecusável, então é incontestável, indiscutível, inegável, irrefutável. Aqui elencam-se sinónimos e não antónimos.

O líder do PS não pode, por isso, em nome da lealdade, da boa-fé e do sentido de responsabilidade fazer de conta que não ouviu a proposta. Que não tomou nota. Que não percebeu o sentido. Estamos perante um dogma político: não se pode recusar o que é irrecusável. Entendidos?

O país escolheu este Governo, estabilidade e sensatez. Por agora, ninguém está a pedir uma Cúpula de Ferro. Caberá ao líder da oposição deixar passar o Orçamento para 2025 na sua versão indubitável. O que não poderá acontecer, neste dia especial, é o PM dar dois passos em frente e Pedro Nuno Santos recuar os mesmos dois passos. Não dá. Assim nunca se encontrarão. É uma Lei da Física e não da Química Política.

Nem o país, nem o mundo, está para crises de angústia, estratégias falhadas, passos trocados. Já basta o que temos, e vamos ter, lá fora. PM e PNS que se entendam.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

O Chega continua a liderar o “campeonato” das redes sociais, entre os partidos. André Ventura não inventou nada, mas as técnicas de comunicação modernas que importou dos movimentos da direita radical populista continuam a resultar. Os números não mentem. O Chega é líder no Instagram, com 194 mil seguidores, a rede social mais utilizada pelos portugueses. No TikTok, tem 55 mil. Os vídeos de André Ventura e de Rita Matias tornaram-nos “estrelas” entre os mais novos. O guião está definido, passa pela exploração de sentimentos negativos ou emotivos, na linha com o que fazem todos os partidos do mesmo espectro político. O diálogo online permitiu acentuar a tendência para criar “narrativas”, capazes de criar verdades alternativas e perceções. Nada disto, porém, é feito ao acaso. “[As fake news e a desinformação] são uma estratégia política”, admitem atuais e antigos militantes do Chega. E não há dias de folga. Fonte que conhece bem o quotidiano do partido explica, à VISÃO, que “não há nada que seja publicado [nas plataformas online] por dirigentes ou deputados que André Ventura desconheça ou não controle”. “Pode haver, claro, um comentário individual, espontâneo, numa rede social, mas tudo o que é, de facto, importante para o partido passa sempre pelo aval do presidente do Chega”, assegura. À VISÃO, um militante do Chega, que pede anonimato, explica como tudo se processa. “Normalmente, os pedidos chegam diretamente da assessoria de comunicação, próxima de André Ventura. Os conteúdos são partilhados através dos grupos de WhatsApp das distritais e das concelhias [do Chega]. A partir dali, as mensagens são reenviadas para outros grupos, formados por militantes e apoiantes.

As coisas espalham-se, então, muito rapidamente nas diferentes plataformas.” E detalha: “É sempre pedido que se partilhe tudo o que o André [Ventura] publica; mas também outros conteúdos.” Próximos do presidente André Ventura, os deputados Patrícia Carvalho (antes assessora do partido) e Ricardo Regalla são apontados como “dois dos principais responsáveis pela partilha de conteúdos via WhatsApp”. A prática existe “desde sempre”, explica Nuno Afonso, vereador da Câmara Municipal de Sintra, ex-número 2 do Chega, que, entretanto, se zangou com André Ventura e cortou com o partido (foi candidato por Lisboa, nas últimas legislativas, pela coligação Alternativa 21, formada por Aliança e MPT). Até à sua saída, em dezembro de 2021, Lucinda Ribeiro, fundadora e ex-militante número 6, foi responsável por administrar dezenas de páginas de apoio a André Ventura e ao partido nas redes sociais, tendo, através delas, arregimentado milhares de militantes, ao mesmo tempo que os mobilizava para partilharem os conteúdos do partido. Programadora informática, referência do setor cristão evangélico do partido, Lucinda Ribeiro abandonou o Chega, mas deixou escola. Ainda passou pelo partido ADN, embora durante pouco tempo. Entretanto, tornou-se próxima do movimento Habeas Corpus, liderado pelo ex-juiz Rui Fonseca e Castro. Com a saída de Lucinda, os conteúdos do Chega nas redes sociais deixaram de ter intermediários, passando a ser diretamente controlados e partilhados pela cúpula do partido. Hoje, o Chega tem três “pontas de lança” nesta área: o inevitável André Ventura e ainda Rita Matias e Pedro Frazão, capazes de arrastar multidões de seguidores e criar tráfego de relevo. O discurso anti-imigração ganhou fôlego. Depois de semeado, floresceu. Que o diga Iqbal Hossain, o imigrante do Bangladesh que furou a bolha da comitiva do Chega, na campanha para as europeias, e conseguiu confrontar Ventura cara a cara. Alvo de uma campanha de ódio online, precisou de aguardar pelo mau resultado (viral) do Chega nas europeias para voltar a ter paz.

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Três crianças saem de casa com roupa colorida e mochilas às costas. Fazem o percurso até ao elevador, descem à garagem, põem os pertences no carro, sentam-se nas cadeiras e apertam os cintos. Na imagem seguinte, entramos no banco de trás de um carro com motorista. A sequência de imagens, com música de fundo, serve para Miguel Pinto Luz mostrar como arranca o dia do ministro das Infraestruturas. O post no Instagram acaba como os de muitos influencers, com uma pergunta pensada para gerar aquilo a que na linguagem das redes se chama engagement, ou seja, envolver os seguidores, levando-os a dar likes e a fazer comentários e partilhas. “Quem mais faz questão de ir levar os miúdos à escola antes do trabalho?”, pergunta o ministro, que entretanto até desativou os comentários da publicação e não quis explicar à VISÃO os motivos que o levam a expor assim os filhos.

Ministros Paulo Rangel é muito ativo. E Pinto Luz até já recebeu, no ministério, a turma de um dos filhos

Não é a primeira vez que o faz e, no Governo, diz-se que “é o estilo de Miguel Pinto Luz” ter esse registo nas redes sociais. “Já era assim em Cascais”, justifica-se, explicando que, apesar de haver algumas diretivas em termos de mensagem política e um “apelo ao bom senso”, cada governante tem bastante margem de manobra para dar o seu cunho pessoal à sua presença digital. O post que mostra a saída para a escola é, entre os recentes, um dos que mais gostos têm no Instagram de Pinto Luz, que tem quase cinco mil seguidores naquela rede, onde os vídeos e fotografias do trabalho ministerial e os anúncios de medidas e investimentos nas Infraestruturas convivem com imagens dos filhos a andar de bicicleta ou com a apresentação do Sonic, o buldogue francês bebé que veio aumentar a família em agosto.

Às vezes, o plano familiar e o político confundem-se, como quando partilhou um reels com fotos da visita que lhe fez a turma do filho António às instalações do Ministério das Infraestruturas no Campo Pequeno, a 24 de julho, pouco antes de o Governo se mudar para o novo edifício Campus XXI. “É importante abrir o Governo à sociedade, e ainda mais aos mais jovens. Eles têm de perceber o que fazemos, para quem fazemos e porque o fazemos”, lê-se na publicação, que teve 152 likes.

O lado mais pessoal que transparece no perfil de Miguel Pinto Luz no Instagram não tem, porém, nada de amador. A página está cheia de vídeos bem editados, com banda sonora, legendas e planos pensados para mostrar dinamismo e trabalho, mesmo que muitas vezes com um toque de informalidade calculada.

De Costa a Montenegro

O Governo tem a noção da importância de produzir conteúdos com qualidade para as redes sociais e a maior parte dos ministérios tem equipas próprias para pensar os guiões, fazer as fotografias e os vídeos e trabalhá-los para estas plataformas. A famosa “central de comunicação de António Costa” ainda funciona, embora não exatamente da mesma forma, na era Luís Montenegro. Costa aproveitou o Centro de Gestão da Rede Informática do Governo (CEGER) para aí montar um organismo que centralizasse e profissionalizasse a comunicação do executivo e para o qual foram contratados técnicos para tratar de vídeos, multimédia e redes sociais. Montenegro manteve a estrutura, com algumas diferenças: em vez dos 15 funcionários que lá estavam no tempo de Costa, agora trabalham ali apenas oito, alguns dos quais (de perfil mais técnico) já lá estavam no tempo do anterior governo. “Alguns saíram por sua iniciativa ainda antes de assumirmos funções”, conta à VISÃO uma fonte de São Bento, admitindo que a principal diferença é que este CEGER ainda não tem um diretor de comunicação. “Para já, não encontrámos ainda o nosso Cepeda.” O homem que centraliza e supervisiona toda a comunicação do Executivo é Pedro Esteves, o principal assessor de imprensa de Luís Montenegro, com quem João Cepeda, o diretor de comunicação de Costa que estava à frente do CEGER, chegou a ter uma reunião de transição de pastas depois das legislativas.

A centralização da comunicação deixa, contudo, espaço para que cada governante encontre o seu registo. E há vários dentro deste Governo. Poucos têm o grau de à-vontade nas redes sociais que demonstram Miguel Pinto Luz e Paulo Rangel, que já fez um vídeo em mangas de camisa a bordo de um avião para antecipar a reunião em que ia participar na ONU e outro a declamar poesia, num corredor do Palácio das Necessidades, para anunciar o encerramento de um encontro literário no Museu do Oriente.

“O que é pedido aos ministros é, acima de tudo, bom senso, tato e cuidado com o timing”, resume outra fonte do Governo. “Agora, se me perguntarem se há indicações de cima? Não, isso não há.” Os ministros com experiência como eurodeputados destacam-se na produção destes conteúdos. O ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, e a ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, têm uma presença ativa nas redes sociais. “Foi algo que trouxeram de Bruxelas e Estrasburgo. Têm a consciência de como é importante comunicar bem”, diz a mesma fonte. O registo informal online adotado por alguns governantes “não causa desconforto”, refere. “Os ministros têm liberdade, naturalmente. Não diria autoridade para publicar o que querem, mas total autonomia para o fazer, desde que sigam as regras básicas”, conclui.

O recorde de Montenegro

Luís Montenegro há muito que percebeu o poder das redes sociais. Ainda era líder da oposição quando fez uma volta pelo País, na qual passava uma semana por mês numa capital de distrito diferente, pernoitando num alojamento local. Nessa altura, eram recorrentes os vídeos que começavam com a imagem de Montenegro a carregar a sua própria mala, de porta-fatos na mão. Tudo era registado pelo fotógrafo oficial do PSD, que ia mostrando momentos mais descontraídos a par de visitas oficiais.

Hoje, o primeiro-ministro – que tem mais de 39 mil seguidores no Instagram e um alcance de cerca de 287 mil – recorre sobretudo a vídeos editados para mostrar ação, dinâmica e proximidade com as populações. Apesar disso, a famosa imagem de Luís Montenegro, a bordo de um barco durante as buscas no rio Douro das vítimas de um acidente com um helicóptero que combatia incêndios, não passou pelas redes de Montenegro. Foi partilhada com jornalistas e circulou a partir daí.

Proximidade Todos procuram comunicar com os seguidores olhos nos olhos

Quando quer passar mensagens mais políticas, como os seus antecessores, recorre ao X (o antigo Twitter). Mas numa e noutra rede partilha, sempre que a ocasião o permite, fotografias com atletas. Quem trabalha na comunicação do Governo já percebeu que as imagens com desportistas fazem disparar o alcance das publicações e isso traduz-se num aumento do número de seguidores. Foi o que aconteceu, por exemplo, durante os Jogos Olímpicos. Ou no Europeu de Futebol. Aliás, a partilha que mais alcance e reações teve até agora no seu Instagram foi a que tirou com o guarda-redes Diogo Costa na passagem aos quartos de final do Euro 2024.

As farturas de Pedro Nuno

Quando chegou ao Largo do Rato, uma das primeiras decisões internas de Pedro Nuno Santos foi reforçar a equipa de comunicação. Hoje, há cerca de dez pessoas a pensar, a produzir, a publicar e a monitorizar conteúdos para as redes do PS, a mesma equipa que organiza os eventos e produz materiais como flyers e outdoors. A coordenação com o gabinete do secretário-geral socialista é intensa porque, como explica fonte do PS, o objetivo é “criar conteúdo substantivo do ponto de vista político, rigoroso e detalhado”.

Muitos desses conteúdos são criados a partir de briefings políticos e a sensibilidade política é critério de seleção para quem trabalha nesta equipa. O resultado está num perfil de Instagram em que Pedro Nuno Santos aparece com uma imagem bastante institucional, quase de governante, sem ceder a trends e piadas. Mas é quando surgem vídeos mais informais que o sucesso dispara: umas imagens de Pedro Nuno a fritar farturas na Feira de São Mateus, em Viseu, tiveram 200 mil visualizações. Mas na equipa que trabalha com o líder assegura-se que essa foi uma imagem espontânea.

A “central de comunicação de António Costa” ainda funciona. Montenegro manteve a estrutura, mas em vez dos 15 funcionários que lá estavam, agora há apenas oito

Também não planeada (e, já agora, não partilhada pelas redes do PS) foi uma das imagens mais divulgadas deste verão, aquela em que Pedro Nuno Santos aparecia de sombrero mexicano, na praia, ao lado de um vendedor de bolas de Berlim. “Há um apetite por esses conteúdos, mas apostamos numa comunicação mais séria, que se aproxima de um estilo mais governamental, que é o que é o PS”, nota-se no Largo do Rato. E dentro dessa linha, o que é que funciona melhor? “A capacidade de observar as contradições e lacunas nas estratégias dos adversários e a capacidade de sermos propositivos.” Exemplo disso foram os posts feitos no arranque da sessão legislativa com as cinco propostas que o PS fez aprovar no Parlamento, como o fim das SCUT ou a descida do IVA da eletricidade. “Esse momento foi bom para nós”, diz quem trabalha nas redes do PS, reconhecendo que o sucesso, claro, se faz “num público com afinidade eletiva” com os socialistas. Dentro desse público e segundo as métricas a que o PS tem acesso, “há uma afinidade grande com Pedro Nuno Santos”, mas também com Alexandra Leitão.

Apesar de o PS e de Pedro Nuno Santos estarem no TikTok, a equipa que faz as redes socialistas ainda está a adaptar-se a essa linguagem e com algumas cautelas. “Existem características dessa rede que sugerem conteúdos de outra natureza e temos tentado apostar nisso. Mas não podemos adaptar os políticos às redes sociais.” Por isso, é improvável que se vá ver Pedro Nuno Santos a fazer uma dancinha, mas quem trabalha nesta equipa afiança: “Acompanha ativamente [o trabalho para as redes] e gosta de dar ideias.”

Truques para ter seguidores

Misturar temas é uma fórmula para levar o algoritmo das plataformas a trazer novos seguidores, com interesses diferentes. Joana Mortágua já o percebeu e também é por isso que há no seu Instagram vídeos em que faz bolos ou omeletes enquanto discorre sobre temas políticos. “Ultimamente, não tenho feito. Mas cozinho bastante e há muito tempo que faço vídeos a cozinhar, só com receitas. Só que houve um dia em que me apetecia falar e decidi ir mandando uns bitaites enquanto cozinhava. Resultou muito bem, as pessoas agarram-se”, explica à VISÃO a deputada do BE, garantindo que o seu Instagram “é completamente amador” e que o único esforço que faz é o de ir publicando com alguma regularidade. “Tento ser regular. Há alturas em que não me apetece, mas o algoritmo não gosta disso.”

Por ser uma rede “pessoal”, Joana Mortágua entende fazer sentido partilhar alguns aspetos mais pessoais, como imagens das férias, sem nunca entrar na sua intimidade. E com alguns cuidados. “Publico coisas fora de tempo, porque não gosto que saibam onde estou”, explica, justificando-o com o facto de Catarina Martins e a sua irmã e atual coordenadora do BE, Mariana Mortágua, já terem tido stalkers por causa das redes. De resto, só bloqueia pessoas (e fá-lo mais no X) quando “entram no insulto pessoal”.

INFLUENCIÓMETRO

Dos que partilham mais vídeos aos que nem aparecem

Os mais ativos

No seio do Governo, são estes os ministros com maior atividade e vídeos partilhados nas redes sociais. Mas há coisas que, embora com grande impacto nas redes, não aparecem nos vídeos filtrados pela comunicação do Governo. O maior exemplo foi o da participação de Luís Montenegro, numa lancha, nas buscas às vítimas do acidente de helicóptero na zona de Lamego. Já Miguel Pinto Luz é um dos que mais misturam a atividade governativa com a vida pessoal, sendo exemplo o recente vídeo (montado de forma profissional e com música de fundo…) em que mostra como leva os filhos à escola.

Luís Montenegro, primeiro-ministro

Miguel Pinto Luz
, ministro das Infraestruturas

Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros

Margarida Balseiro Lopes, ministra da Juventude e Modernização

Os institucionais

Aqui, estão os ministros que, embora partilhem um número considerável de vídeos, o fazem sempre nua registo menos descontraído, ou pessoal, mas mais institucional. Ainda assim, alguns destacam-se, quer pelo número de publicações (José Manuel Fernandes), quer pela revelação dos bastidores do seu trabalho (Maria da Graça Carvalho).

Nuno Melo, ministro da Defesa

Rita Júdice, ministra da Justiça

António Leitão Amaro, ministro da Presidência

Maria da Graça Carvalho, ministra do Ambiente e Energia

José Manuel Fernandes, ministro da Agricultura

Os ausentes

Estes são os ministros sem atividade oficial conhecida nas redes sociais. Discretos, alguns têm páginas privadas, outros nem isso. Um exemplo curioso é o da ministra da Saúde, que tem Instagram pessoal, mas que deixou de fazer publicações desde que é ministra. Pedro Duarte, Fernando Alexandre, Pedro Reis e Dalila Rodrigues também têm páginas pessoais.

Joaquim Miranda Sarmento, ministro das Finanças

Manuel Castro Almeida, ministro Adjunto e da Coesão Territorial

Margarida Blasco, ministra da Administração Interna.

Pedro Duarte, ministro dos Assuntos Parlamentares

Fernando Alexandre, ministro da Educação

Ana Paula Martins, ministra da Saúde

Pedro Reis, ministro da Economia

Maria do Rosário Palma Ramalho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

Dalila Rodrigues, ministra da Cultura

F.L.

Bernardo Blanco, da IL, é outro adepto de misturar temas e usar fórmulas já testadas para captar mais atenção no Instagram. Já fez um vídeo em que dava toques numa bola enquanto respondia a perguntas sobre temas europeus e está a pensar em usar o registo dos vídeos de fitness para defender a importância de emagrecer o Estado e apresentar as propostas liberais para o Orçamento. “Tento olhar para o que outros estão a fazer e copiar esses formatos introduzindo conteúdos políticos”, admite à VISÃO o deputado da IL que, enquanto está a ver o seu feed, vai guardando ideias usadas por influencers para as adaptar à política.

A estratégia parece vencedora: Blanco tem mais de 56 mil seguidores no Instagram. E acredita que isso tem que ver com a forma como mistura a política com outras linguagens. “Só eu, a falar de fato e gravata, nunca teria aqueles seguidores. A maioria ganhei devido a vídeos que se tornaram virais.”

Um desses vídeos tem cinco  milhões de visualizações e 150 mil likes e é um excerto de um debate com António Costa no Parlamento, no qual Bernardo Blanco faz um trocadilho com os “queques” – como Costa se referiu aos liberais – e o “’que é que’ o PS fez” para resolver os problemas do País. Os limites de Blanco? “Não faço praticamente nada de trends e dancinhas. Tento sempre passar conteúdo em formato apelativo. Não exponho praticamente nada da vida privada.”

O à-vontade de Bernardo Blanco nas redes sociais já trouxe, porém, dores de cabeça à IL, quando o deputado convidou dois youtubers a visitar o Parlamento e um deles fez um vídeo a insultar António Costa no hemiciclo. Hoje, tanto o responsável pelas redes dos liberais, Ricardo Pais de Oliveira, como Blanco admitem o erro. “Foi um episódio infeliz. Devíamos ter feito um check ao vídeo que foi publicado antes da publicação”, admite Bernardo.

“Ali havia uma tentativa de aproximar de outros públicos, mas fugiu um bocado do controlo. Serviu o objetivo, mas é evidente que causou transtorno”, reconhece Ricardo Pais de Oliveira que, além de gerir as redes da IL desde 2018, é o número dois do partido, o que, como o próprio afirma, lhe dá “autonomia total e autoridade estratégica”. E isso traduz-se em maior rapidez na publicação. “Quase 100% dos conteúdos saem diretos do meu iPhone todos os dias.” O que não significa que não haja toda uma equipa, que inclui três equipas de design, fotógrafos e videógrafos e grupos de consulta técnicos e políticos, entre os quais se encontra Bernardo Blanco, que é apontado como “crítico” para a produção de conteúdos.

Ricardo Pais de Oliveira diz que uma das suas preocupações é manter uma estética IL, que se reflete nas cores e em “referências de cinema e música”, mas também no uso recorrente de tabelas e gráficos. E, claro, na irreverência que é imagem de marca do partido e que dá margem a que, nas europeias, o candidato João Cotrim de Figueiredo tenha feito um vídeo a escolher, com a ajuda de uma feirante, um vestido para levar à apresentadora Cristina Ferreira, que ia entrevistá-lo no dia seguinte na TVI. “Claro que isso aumenta o engagement.”

Outras formas de seduzir seguidores passam por ter propostas para nichos. “Fizemos uma proposta sobre e-sports, para que os jogos eletrónicos passassem a ser vistos como de alta competição, e essa comunidade ficou mais atenta à IL”, exemplifica Pais de Oliveira, reconhecendo que o algoritmo tem dificultado a tarefa de chegar a novos públicos. “No início, sempre que fazíamos uma publicação fora da bolha notávamos o crescimento, agora já não se nota tanto.”

Feijoada à transmontana

No Bloco de Esquerda também se está atento a formas de chegar a novos públicos. Na campanha das legislativas, foi partilhado um vídeo que simulava uma conversa de café, nos termos em que ela é feita pelos populistas da extrema-direita, mas para passar uma mensagem de esquerda. E o perfil do BE no Instagram está cheio de vídeos com montagens de mensagens dos adversários políticos, legendas garridas, bastante humor e até um “Isto ou aquilo” em que a deputada Marisa Matias vai sendo obrigada a escolher entre iguarias da comida portuguesa, para se chegar à conclusão de que gosta de feijoada à transmontana acima de qualquer outro petisco nacional.

“Temos registos muito diferenciados, dependendo do tema e do objetivo”, comenta à VISÃO o dirigente bloquista Jorge Costa, explicando que todos os conteúdos partem de uma reunião semanal que junta as equipas do Esquerda.net, das redes sociais e dos assessores de imprensa para debater a semana e preparar os temas e a comunicação. “O objetivo é utilizar uma linguagem que não é típica da comunicação política.” Um exemplo? Um vídeo de ASMR (Autonomous Sensory Meridian Response), de sons pensados para ser relaxantes, com uma mensagem em defesa da semana de quatro dias. Isso, seguido de bloopers da gravação, com José Soeiro a dizer “isto é uma palhaçada” e Marisa Matias e Joana Mortágua a dizerem “é ridículo”. Teve quase 1 400 likes.

Quem trabalha na comunicação do Governo já percebeu que as imagens com desportistas fazem disparar o alcance das publicações. A foto com Diogo Costa bateu recordes

Surpreender é uma das maneiras de aumentar o alcance das publicações, mas Jorge Costa sabe que essa não é uma ciência exata. “As redes sociais são dominadas por um algoritmo que ninguém conhece e que vai mudando. Todas as teorias são especulativas e temporárias”, diz, notando que há “uma vulnerabilidade” na dependência das redes para fazer comunicação política. “Está sempre nas mãos do dono [da plataforma].” E isso nota-se. “Há flutuações muito grandes no alcance das publicações, que são cíclicas. Tudo indica que isso corresponde mais a alterações do algoritmo do que ao comportamento das pessoas nas redes”, observa.

O tipo de rede também traz condicionantes. Por exemplo, o TikTok ainda não é usado no Governo e a maioria dos políticos e partidos não consegue ter aí muitos seguidores, porque o algoritmo promove apenas conteúdos muito específicos, pouco compatíveis com a mensagem política, e obriga a uma enorme produção. “Tem uma lógica de produção contínua. E nós usamos as redes dentro de um quadro político, que não é o de um adolescente que faz dez publicações por dia”, nota Jorge Costa.

O problema do PCP com Zuckerberg

O PCP está em todas as redes (incluindo TikTok e Telegram), mas já desistiu de usar os envios massivos de mensagens de WhatsApp (tem ativo apenas um canal) por causa dos recursos que isso envolvia. “É uma gestão de meios e possibilidades”, diz à VISÃO Carina Castro, da Comissão Política do PCP, que conta apenas com uma equipa de cinco pessoas, a que somam os contributos das várias organizações regionais do partido, para alimentar todas as plataformas.

Apesar dessa presença digital, os comunistas querem que as redes sejam só uma forma de chamar pessoas ao partido. “Reconhecemos as potencialidades que têm para chegar aos nossos e também aos outros e garantir que é o PCP que fala em nome do PCP, mas não achamos que esse contacto é um fim em si mesmo”, declara Carina Castro, que dá como exemplo disso a forma como o partido está a comunicar um abaixo-assinado para reclamar um aumento de salários a Luís Montenegro, mas não aceita assinaturas digitais. “Não é possível assinar online, porque não queremos apenas a assinatura. Queremos ouvir as pessoas, saber que problemas têm. Há algo de profundamente consciente, organizador e potenciador de ação em estarmos presencialmente. E é também um ato de resistência.”

Estrela Isaltino Morais é personagem principal em vídeos promocionais de Oeiras

Nos últimos meses, os comunistas aperceberam-se dos limites que o algoritmo impõe para alguns conteúdos políticos, nomeadamente no que toca à causa palestiniana. “Sentimos que há conteúdos que são barrados”, denuncia Carina Castro. E há um problema que só o PCP tem em Portugal: o partido não aparece nas buscas de perfis do Instagram. Porquê? Porque o seu nome é também a sigla de uma droga, o “angel dust” (como é conhecido nos EUA). Até há pouco tempo, a pesquisa dava esse alerta, mas era possível encontrar o partido. Agora, só se chega lá pelo histórico do Instagram e isso é algo que o PCP está a tentar mudar junto da empresa de Mark Zuckerberg. “Estamos a discutir isto com a Meta.”

Os comunistas também resistem às trends do momento, por acreditarem ter “o dever de não estupidificar as pessoas”, mas já usaram as redes para partilhar excertos de uma entrevista em que Paulo Raimundo fala do percurso da sua família ou da sua experiência pessoal com um baixo salário. “Não foi um golpe de marketing”, assegura Carina Castro, que diz que “não é preciso cumprir um estereótipo para ser político neste partido” e que aquele registo corresponde ao perfil de Raimundo. “Aquilo também correspondeu às características do Paulo, o Paulo fala assim e não tem problema nenhum em mostrar o bairro [social] onde mora. Ele sentia-se à vontade e isso também tem conteúdo político.”

Um mundo (digital) com regras apertadas

Não há especialista que abdique das redes sociais para fazer chegar a mensagem “mais rápido” e “mais longe”, mas todos alertam para a importância de os atores políticos usarem as “ferramentas” online com “bom senso e inteligência emocional” – as únicas regras quantificáveis. No caso dos governantes, a questão é ainda mais delicada. Se algo falhar, não é apenas o indivíduo que fica em xeque, podendo todo o executivo ser “contaminado”.

“Hoje em dia, um político que não tem presença nas redes sociais é como um carro ao qual falta uma roda. Ele até pode chegar ao destino, mas terá sempre muito mais dificuldades. O caminho será feito aos tropeções e muito mais devagar do que o de todos os outros.” A analogia automobilística de Fernanda Sarkis resume, num pequeno parágrafo, a opinião de todos os especialistas de comunicação ouvidos pela VISÃO. A investigadora e especialista em Comunicação Política não desvaloriza o papel das outras plataformas neste tipo de comunicação, mas destaca que esta se tornou a forma “mais rápida” de passar uma mensagem e de a levar “mais longe”.

A presença dos políticos portugueses nas redes sociais parece normalizada. A linguagem que, a determinada altura, chegou a parecer exclusiva de André Ventura e do Chega , a partir do guião importado da direita radical, conhece agora novos protagonistas e novas linguagens. A tradição já não é o que era.

Existem, porém, regras a cumprir, num equilíbrio difícil de definir. A presença de um governante nas redes sociais, por exemplo, pode ser vista “como ponto de partida, algo positivo, muito bom”, realça Edson Athayde. O problema continua a ser… “o ponto de chegada”. “Se não forem tomados alguns cuidados, é possível que a presença digital, bem-intencionada, possa causar problemas. Um governante que queira manter a comunicação com os cidadãos nas plataformas digitais tem de cumprir regras, ter bom senso, ter cuidado com os timings, ter contenção em relação ao que diz e à forma como o diz. Os cidadãos deixam de ver o homem para passarem apenas a ver o governante. As publicações passam a ter um valor documental. E, se alguma coisa correr mal, não afeta apenas o governante, mas também vai contaminar todo o executivo”, refere.

A Ciência pode ajudar, mas o publicitário e consultor de marketing e comunicação brasileiro, radicado em Portugal há mais de três décadas, sublinha que “a comunicação não cabe numa folha de Excel”. Ora, a receita pode variar conforme o paladar. E o fato digital nunca assenta da mesma maneira aos protagonistas.

“Desde que a comunicação seja bem feita, a presença nas redes sociais é sempre vantajosa. De facto, a grande dificuldade é que não existem regras para medir o certo e o errado, de forma 100% objetiva. Claro que há análises que podem ser feitas, mas cada figura pública tem um percurso pessoal e profissional distinto, uma maneira de ser e de estar, e por isso o que se adequa a uma pode não se adequar a outra”, relata Edson Athayde. “O importante é cada político encontrar o seu registo, percebendo que as redes sociais são um espaço de partilha e diálogo entre os utilizadores”, acrescenta.

“Bom senso e inteligência emocional”

É, precisamente, este diálogo que alguns políticos portugueses não abdicam de estabelecer. Se o Chega e o Bloco de Esquerda parecem conhecer a língua, a desenvoltura de alguns dos atuais governantes configura uma novidade.

“O Governo é eleito para governar e não para comunicar. Mas para governar bem, tem de manter os cidadãos informados”, afirma, à VISÃO, António Cunha Vaz.

O especialista em Comunicação, com vasto currículo em Comunicação Política, alerta que, “cada vez mais, os cidadãos dos 35 anos para baixo estão presentes nas redes sociais”, o que, do seu ponto de vista, faz com que “a presença dos membros de um governo nas plataformas digitais deixa de ser uma opção, para passar a ser um dever”. “A comunicação pelas redes sociais passa a ser um ato de transparência da atividade política”, diz.

Decorridos seis meses, António Cunha Vaz elogia a prestação do Executivo de Luís Montenegro no campo da comunicação, destacando “alguns ministros que comunicam bastante bem”. “O ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, ou o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, têm demonstrado como se pode comunicar online, sem perder a dignidade institucional. De facto, não é algo muito tradicional em Portugal, mas parece-me muito positivo e que vem inaugurar uma nova era na relação entre governantes e cidadãos”, descreve.

O especialista tem ainda palavras para Miguel Pinto Luz, que gosta de misturar a faceta pessoal e a profissional. Arriscado? “Sim, mas funciona.” O ministro das Infraestruturas e da Habitação “é um homem de grande bom senso e inteligência emocional”, refere. Cunha Vaz recorda que o registo online de Miguel Pinto Luz “vem de quando era vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais”, o que lhe permite “arriscar um bocadinho”, uma vez que “os seguidores já estão habituados”. “Bom senso e inteligência emocional”, repete, como mantra, para evitar escorregadelas virais.

“É mais fácil e rápido chegar às pessoas através das redes sociais. Acho que [os ministros] fazem bem em apostar nesta forma de comunicação. Para resultar, em primeiro lugar, é preciso que os governantes tenham consciência de que não se representam apenas a si mesmos, mas que representam todo o executivo”, alerta.

O mérito, no entanto, não é apenas de quem protagoniza os conteúdos digitais, mas também do know-how de “especialistas”. Cunha Vaz reconhece, por dentro, a rápida (mas discreta) evolução que tem acontecido no setor. E reparte os elogios por quem faz o trabalho de bastidores. “Os gabinetes estão a ser dotados de profissionais, muitos deles muito jovens, que se movimentam muito bem neste campo, que são capazes de fazer análises das redes sociais, que estudaram os algoritmos das plataformas, que percebem as virtudes e os defeitos destas ferramentas, todos os truques que podem utilizar”, revela.

Ainda assim, há sempre margem de erro, e “todo o cuidado é pouco”, alerta o especialista. “Às vezes, quando nos deixamos ir, podemos, eventualmente, perder o controlo da coisa. Não noto, para já, que isso tenha vindo a acontecer no Governo de Luís Montenegro”, sentencia.

A comunicação não se esgota online

O mundo não vai nunca reduzir-se ao online. Essa é, pelo menos, a convicção é de Fernanda Sarkis, que considera que a comunicação das figuras públicas – políticos incluídos – “é hoje feita de forma dinâmica, através de multiplataformas”. “Na minha opinião, não existe uma primazia das redes sociais, em relação a outras ferramentas. Por exemplo, a direita radical sabe mover-se muito bem no meio digital, mas não é por isso que abdica das outras vivências. Como se vê, as suas figuras estão presentes na TV, nos jornais e nas revistas, e, principalmente, nas ruas. De facto, só assim é que as coisas funcionam verdadeiramente”, reforça a especialista.

Sarkis garante “que existem muitas vias para uma comunicação de sucesso”, que “podem e devem coexistir”. “A diferença”, diz, “é a habilidade que cada pessoa tem”, para existir em cada uma das realidades.

“Tem de haver capacidade técnica para que um político, seja de um governo, seja de um partido, possa adequar a linguagem a cada formato, produzindo fontes de informação, conseguindo expandi-las, fazendo com que os conteúdos circulem, ganhem relevância”, explica. Abdicar de uma plataforma, garante, “é um erro para alguém que precisa de ou quer comunicar”. “Redes sociais são fundamentais, mas o objetivo é chegar ao maior número de pessoas possível. E, na verdade, o que se comenta na mesa do café não é diferente daquilo que se comenta no Twitter”, conclui.

— João Amaral Santos

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O espetáculo é sobre o quê? A interrogação repete-se ao longo da peça e abre portas para novas leituras de Antígona. A obra clássica foi abordada ao longo dos séculos por vários autores dramáticos, de Kleist a Jean Anouilh, de Cocteau a Júlio Dantas e António Pedro, sempre na defesa de uma ideia do bem e da justiça, entre muitas metáforas.

O Teatro Praga vem agora dizer que a Antígona é mais complexa do que a sua utilização ou o seu afunilamento para vincular determinadas ideias”, aponta André e. Teodósio, que assina a criação com José Maria Vieira Mendes. Em RE: Antígona, seguem a tradição do início do séc. XX de espetáculos de sátira a outros espetáculos, agarram neste ícone dramático e apresentam-no com diferentes perspetivas, interpretadas pelo elenco (André e. Teodósio, Inês Vaz, Maria João Vaz, Paula Diogo e Paulo Pascoal).

“Essa distribuição não tem só a ver com devolver alguma humanidade ou complexidade à figura, mas também enquanto sociedade desenvolvermos a capacidade de termos ferramentas para lidar com coisas que são o oposto daquilo que defendemos ou com o qual não sabemos lidar”, sublinha Teodósio. “Atualmente há uma necessidade de fazer espetáculos que confirmam aquilo que sabemos, enquanto comunidade. Os espetáculos precisam de alguma radicalização outra vez. Estamos fartos de atualizações… Queremos que o espetáculo falhe, porque ao falhar um herói, nós também podemos falhar”, acrescenta.

À maneira do Teatro Praga dos anos 90 (a companhia faz 30 anos em 2025), misturam os formatos de entretenimento associados à baixa cultura com os temas debatidos na alta cultura, e criam uma “contracultura”, “um esmagamento das duas coisas.” Uma ideia reforçada pela cenografia de Tiago Alexandre, colocando estátuas gregas montadas em motos.

RE: Antígona > Centro Cultural de Belém > Pç. do Império, Lisboa > 4-6 out, sex 20h, sáb 19h, dom 17h > €6 a €15

Pega-se num indivíduo, homem ou mulher para o caso é indiferente, muito embora alguns considerem que o processo é mais rápido no caso dos homens, e tira-se-lhe tudo.

Completamente tudo: família, casa, forma de ganhar a vida, comida, segurança, país, dignidade. Quanto mais despojado estiver, mais fácil será a transformação. Há quem defenda até retirarem-se-lhe alguns órgãos, mas isso fica à vontade de quem o prepare e não alterará a receita. O que pode transformar este processo de fazer um terrorista num outro muito mais elaborado e eficaz – transformá-lo numa máquina de guerra e ódio, capaz de atribuir Estrelas Michellin no menu da desumanidade, é a idade do indivíduo em causa.

Quanto mais jovem, mais tenro, mais frágil, mais fácil de manipular e maior será a permanência do ódio, essencial à finalidade do processo.

Depois é só esperar até estar pronto a explodir.

Serve-se em sangue quente.

Com conflitos um pouco por todo o mundo, há duas verdades insofismáveis: a primeira é o enriquecimento de grandes companhias de armamento. A segunda é a perpetuação do clima de crispação e ódio por gerações

Uma criança, um jovem que desde muito cedo teve que deixar para trás a segurança da infância, que teve que se tornar adulto à força de lutar por um lugar para viver, por um prato de comida, por um pouco de água, jamais esquecerá o que é ser proscrito, abandonado, estar só. Jamais entenderá palavras como “amor” e “fraternidade” pois nunca soube o que de facto significa “normalidade”.

Ao longo da História e dos conflitos que a talharam, uma das primeiras preocupações foi proteger os mais fracos e entre estes as crianças. Colocá-las a salvo era uma prioridade elas eram o garante do futuro.

Mas a sistematização, a organização desta proteção só começou verdadeiramente com as grandes guerras que assolaram o último século.

Na guerra de 1914/1918, embora tivesse existido uma evacuação das crianças das áreas de conflito, esta não foi organizada e por isso mesmo os números relativos ao êxodo destas são escassos.

Com a Guerra Civil de Espanha, o processo passou a tomar contornos de sistematização e profissionalismo. Estima-se que, durante esta guerra fratricida, 30 a 35 mil crianças tenham sido transferidas das zonas republicanas para países considerados na altura seguros, como França ou a União Soviética.

Na Segunda Grande Guerra, aí sim, a evacuação foi levada a cabo por organizações especializada como a Cruz Vermelha ou a Pied Piper no Reino Unido.

Ao todo, estima-se que tenham sido deslocadas dos cenários de guerra dois milhões de crianças levadas para países em paz, que as acolheram.

Um deles foi Portugal.

Este tipo de acolhimento foi sempre temporário porquanto a adoção só seria possível em casos em que, terminado o conflito, a reunificação com as famílias de origem não fosse possível.

O mundo vive hoje o maior e mais sangrento momento desde os conflitos relatados.

Não tenhamos ilusões: os fluxos de deslocados aumentarão para cifras não imaginadas.

Criar um corredor humanitário com prioridade para crianças e menores abandonados e sós, ou que os seus pais queiram colocar a salvo até ao final do conflito, não é algo novo, mas é urgente refazer. Sem burocracias, sem receios, com todo o cuidado securitário mas pensando no futuro

Os números, que começam já a ser divulgados, dão conta de que, desde 7 de Outubro de 2023, foram mortas 5.500 crianças em Gaza e 33 em Israel. O conflito provocou ainda pelo menos 17.000 órfãos, segundo a UNICEF.

A guerra contra o Hezbollah, que ainda agora começou, já fez 50 mortos entre as crianças e forçou a deslocação de 175 mil, também segundo a UNICEF.

Não precisamos dum grande exercício de imaginação para entender o nível de trauma, raiva, desespero, desamparo, solidão que acompanhará para sempre estas crianças e suas famílias.

Não será, pois, de admirar que esses meninos, arrancados à sua meninez, se tornem terroristas num futuro próximo. Não admirará que sejam presas fácil do radicalismo e das redes de tráfico.

Estamos a criar os novos assassinos, os novos senhores da guerra, que jamais quererão outra coisa que não seja a aniquilação do inimigo.

Estamos a criar uma geração que não entenderá a palavra PAZ.

Perante a inoperância da ONU e da UE na resolução de nenhum destes conflitos, perante o receio de tomar decisões que possam pôr em causa o poder arrecadado em urna, perante tudo isto só uma solução empreendida pela sociedade civil poderá garantir o futuro.

Criar um corredor humanitário com prioridade para crianças e menores abandonados e sós, ou que os seus pais queiram colocar a salvo até ao final do conflito, não é algo novo, mas é urgente refazer. Sem burocracias, sem receios, com todo o cuidado securitário mas pensando no futuro.

Temos o exemplo de Jorge Sampaio que, com um projeto duma simplicidade desconcertante, conseguiu que centenas de jovens sírios continuassem os seus estudos fora do clima de guerra, aqui neste país pequenino, mas que sabe dar grandes lições, quando a isso se propõe.

Com esse projeto evitou – estou certa! – muitas radicalizações, muitas mortes e fez mais pelo combate ao terrorismo e ao tráfico que muitos projetos megalómanos. Pensando apenas com o coração e com a firme convicção de que todas as leis têm como objetivo servir a humanidade novamente e não interpor-se a ela.

Portugal pode fazer o mesmo, agora, já!

Criando uma rede de famílias tutelares que recebam estas crianças à semelhança do que aconteceu com os meninos austríacos na II GG, Criando uma rede consular que se articule e promova este corredor. Fazendo jus a Aristides de Sousa Mendes, Jorge Sampaio e aos anónimos que ficam na historia dos corações que salvaram.

É possível fazermos a diferença. Só é preciso um pouco de coragem, rapidez e sair à rua tentando caminhar com os sapatos ou os pés nus dos outros

Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

No ataque do Irão de terça-feira à noite contra Israel, o maior de sempre, foram lançados 200 mísseis. O Irão garante que cerca de 90% atingiram os seus alvos, mas Israel diz que as suas defesas anti-aéreas intercetaram a maioria.

Vários relatórios apontam que Teerão tem milhares de mísseis de cruzeiro e balísticos – capazes de ultrapassar os limites da atmosfera antes de a ogiva se separar e mergulhar de volta em direção ao seu alvo. Especialistas ouvidos pela CNN sobre o ataque de terça-feira acreditam que o Irão usou variações dos mísseis balísticos Shahab-3, com base nos vídeos que circularam nas redes sociais. Segundo o The Missile Threat Project, o Shahab-3, que começou a ser usado em 2003, transporta uma ogiva com 760 a 1200 quilos. Já o Iran Watch, que monitoriza o armamento iraniano, adianta que os modelos Ghadr e Emad, variações do Shahab-3, têm uma precisão de cerca de 300 metros em relação ao alvo.

Todas as atenções estão, no entanto, viradas para um novo míssil, que os meios de comunicação iranianos afirmam que foi usado no ataque de terça-feira: o Fattah-1, que Teerão descreve como um “míssil hipersónico”.

O míssil Fattah-1

Com 12 metros de comprimento e um peso entre os 3 500 aos 4 100 quilos, o Fattah-1 é capaz de acertar em alvos que se encontrem a 1 400 quilómetros de distância e de se deslocar a cinco vezes a velocidade do som – cerca de 6 100 quilómetros por hora. Característica que não impressionou os analistas ouvidos pela CNN, que apontam que a maioria dos mísseis balísticos chega a velocidades hipersónicas, sobretudo na parte do “mergulho” em direção aos alvos.

Designado “Fattah,” o nome do míssil faz referência ao líder da religião islâmica – Alá – descrito no Corão como o “Al-Fattah”, que significa “o vitorioso” e “o que traz a vitória”. O projétil, anunciado em 2023, integra a estratégia militar do Irão para melhorar as suas capacidades de guerra ao apostar num arsenal mais sofisticado. O desenvolvimento deste míssil coloca o Irão “entre as quatro nações globalmente capazes de produzir este tipo de armamento avançado”, destacou a agência de notícias iraniana.

Sendo um míssil balístico, esta arma faz parte da sua trajetória no espaço, ou seja, fora da atmosfera da terra. Desde modo, quando se dá a queda no alvo terrestre, e devido à força da gravidade, a velocidade do míssil aumenta exponencialmente, acabando por provocar mais danos na sua aterragem. Estes mísseis são ainda capazes de carregar explosivos e ogivas nucleares com um peso máximo de 500 quilos.

Segundo Fabian Hinz, investigador do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, que escreveu sobre o tema no ano passado, para além da distância e rapidez o Fattah-1 parece ter ainda outra característica muito importante: a possibilidade de ajustar a sua trajetória quando já está a dirigir-se ao alvo para escapar às defesas antiaéreas. Tal deve-se ao facto de estarem equipados com sistemas de orientação avançados, que aumentam a sua precisão no ataque.

Particularidades que tornam estes projéteis alvos especialmente difíceis de intercetar pelos sistemas de defesa.

Mas os analistas da CNN mostraram-se céticos quanto à possibilidade de o Irão ter utilizado o novo míssil pela primeira vez na noite de terça-feira: “É um dos seus mais recentes mísseis balísticos e eles têm muito a perder com a sua utilização”, disse Trevor Ball, antigo técnico superior de engenhos explosivos do exército norte-americano. “Israel ficaria com uma ideia das suas capacidades só por ser utilizado. Há também a possibilidade de não funcionar, dando a Israel uma ideia ainda maior das suas capacidades. Ganham propaganda gratuita e não arriscam nada ao dizer que foi utilizada”, acrescentou.

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A manifestação teve início pelas 12 horas desta quinta-feira junto à Assembleia da República, em Lisboa, com recurso a latas de fumo e ao som de heavy metal e rock n’roll. Cerca de uma hora mais tarde, centenas de bombeiros sapadores fardados subiram as escadarias e tentaram invadir o Parlamento, mas foram travados por um cordão da polícia.

Apesar da ordem policial para abandonarem a escadaria, os manifestantes continuaram a formar e a libertar fumos de foguetes, acabando por se sentar nos degraus e por cantar o hino nacional. Foram ainda incendiados vários pneus, rebentados petardos e queimado um fato de trabalho dos bombeiros no final da escadaria.

Ricardo Cunha, presidente do Sindicato Nacional dos Bombeiros Sapadores, referiu que não estava prevista esta forma de protesto, em declarações à agência Lusa. A organização esperava mais de mil bombeiros na ação de protesto.

Os bombeiros sapadores reivindicam a regulamentação do horário de trabalho, a atualização do salário, um regime de avaliação específico e outras condições de trabalho.

Também Domingos Morais, vice-presidente da Associação Nacional dos Bombeiros Profissionais, em declarações à SIC Notícias, referiu que o Governo não “tomou atenção” às reivindicações dos bombeiros”. “É preocupante termos que chegar a este ponto, mas é uma necessidade que o Governo olhe para este setor e olhe para os bombeiros com respeito e dignidade que merecem”, disse.

Os manifestantes cumpriram, mais tarde, um minuto de silêncio em homenagem aos bombeiros que morreram nos incêndios de agosto no centro e norte do país.

Os bombeiros sapadores prometem continuar na escadaria do parlamento até que sejam ouvidos pelo Governo. Uma nova manifestação foi marcada para dia 10 de outubro.