Rúben Oliveira, conhecido como “Xuxas, foi, esta sexta-feira, condenado a 20 anos de prisão. Considerado o principal narcotraficante português, “Xuxas” estava acusado de liderar uma organização criminosa, desde 2019, que se dedicava a introduzir toneladas de cocaína provenientes da América do Sul, através de portos marítimos portugueses e do aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa.

O coletivo de juízes, presidido pela juíza Filipa Araújo, considerou que “era o arguido Rúben Oliveira quem coordenava de forma diretas as operações” ligadas ao narcotráfico. O tribunal condenou “Xuxas” a 12 anos de prisão pelo crime de tráfico de droga, 15 anos por associação criminosa e quatro anos e meio por branqueamento de capitais, o que se traduziu num cúmulo jurídico de 20 anos de cadeia (o tribunal teve em consideração que o arguido não tinha antecedentes criminais).

Dércio Oliveira, irmão de “Xuxas”, foi condenado a 13 anos de cadeia. Ricardo Macedo, cunhado e braço-direito de Rúben Oliveira, recebeu a mesma pena. José Afonso, conhecido como “Xulinhas”, que planeava a compra e venda de cocaína com fornecedores brasileiros, foi condenado a 15 anos de prisão.

O arguido Luís Firmino, responsável por adquirir e entregar telemóveis encriptados aos membros da organização e de transportar cocaína no interior de veículos, foi condenado a 10 anos de prisão. José Cabral foi condenado a 10 anos e quatro meses e Luís Ferreira, que acompanhava o transporte e armazenamento da droga, a 10 anos e seis meses. Punil Narotamo, primo de “Xuxas”, que foi funcionário da Portway, empresa de handling, entre 2014 e 2020, e mantinha acesso aos aviões no aeroporto Humberto Delgado, foi condenado a 12 anos. Vasco Soeiro, que também fazia parte da organização, apanhou 10 anos de cadeira.

António Freitas, licenciado em Direito, considerado o “cérebro” por trás do esquema de branqueamento dos capitais do narcotráfico – através de duas empresas – foi condenado a três anos e seis meses de pena suspensa. O tribunal condenou ainda a mulher de Rúben Oliveira, Carla Paradela, a dois anos de prisão, com pena suspensa, também pelo crime de branqueamento de capitais.

O império de “Xuxas”

O tribunal deu como provado que Rúben Oliveira liderava uma organização criminosa que se dedicava a introduzir cocaína em Portugal, através de empresas importadoras de frutas e de outros bens alimentares e não alimentares, fazendo uso de contentores marítimos. A droga também entrava em território nacional em malas de viagem, por via aérea, desde o Brasil até Portugal.

Dessas ligações faria parte Sérgio Roberto de Carvalho, um narcotraficante conhecido como o “Escobar brasileiro”, atualmente detido na Bélgica. Em tribunal, a juíza disse que Rúben Oliveira teria contactos com o Comando Vermelho, uma organização criminosa do Brasil.

“Xuxas” tinha sido detido pela Polícia Judiciária no dia 24 de junho de 2022, depois de ter regressado a Portugal (vivia no Dubai, Emirados Árabes Unidos). A detenção foi feita no bairro dos Olivais, em Lisboa, onde nasceu e cresceu, quando ali se deslocara para visitar familiares e amigos, antes de voltar para a segurança do Médio Oriente. Nas ruas onde tudo começou, Rúben Oliveira seria travado, deitado no chão de cimento, com o rosto colado ao chão e, finalmente, algemado com as mãos atrás das costas, num momento que seria filmado, por uma testemunha, a partir de uma varanda de um prédio vizinho, e se tornaria viral nas redes sociais.

Desde essa data, que “Xuxas” permanece detido na cadeia de alta segurança de Monsanto, com direito a vigilância apertada dos guardas prisionais. Agora, já sabe que vai continuar na cela.

Luís Neves, diretor da Polícia Judiciária, explicou esta manhã, em conferência de imprensa, a operação que levou à detenção de Fernando Ribeiro, um dos cinco fugitivos da prisão de Vale dos Judeus, em setembro deste ano. Segundo a PJ, o homem, de 65 anos, foi capturado em Castanheira da Chã, Trás-os-Montes, uma localidade perto da fronteira com Espanha, com o colaboração da Guarda Nacional Republicana. Quando abordado pelas autoridades, o cidadão português, que se encontrava sozinho numa habitação, terá tentado fugir, “mas sem qualquer hipótese de sucesso”.

Na sua posse, segundo Manuela Santos, diretora da Unidade Nacional de Contraterrorismo, também presente na conferência, encontravam-se “equipamentos tecnológicos que lhe permitiam comunicar” – como walkie talkies -, binóculos, uma arma com silenciador e várias munições. Equipamentos que as autoridades acreditam que possam ter sido utilizados durante a fuga do estabelecimento prisional. “É mais um sinal do elevado grau de preparação, de apoios tecnológicos que estas pessoas têm, sobretudo neste momentos em que têm uma pena pesadíssima de prisão para cumprir”, referiu Neves.

Para saber mais – Vale de Judeus: Crónica de uma fuga anunciada

O diretor da Polícia Judiciária avançou ainda que as operações para a recaptura do recluso decorreram com cautela e “em silêncio”, descrevendo-as como ” bastante complexa”. Uma estratégia que já tinha sido bem-sucedida na detenção de Fábio “Cigano”, recapturado em outubro. “O trabalho silencioso, no passado, levou-nos à captura de um dos evadidos, em Marrocos”, sublinhou o diretor da PJ.

Fernando Ribeiro Ferreira cumpria uma pena de 24 anos no estabelecimento prisional de Vale de Judeus, condenado pelos crimes de associação criminosa, tráfico de estupefacientes, roubo, furto e rapto. Esta foi a quarta vez que fugiu da cadeia. O recluso seguirá agora para o estabelecimento prisional de alta segurança de Monsanto, segundo Manuela Santos que acrescentou que a Polícia Judiciária já entrou em contactou os países de origem dos três reclusos que ainda se encontram foragidos e a que a UNC está a desenvolver “todas as diligências” para apurar as circunstâncias da fuga.

“Temos encetado desde a primeira hora contactos a nível internacional não só com os países de origem dessas pessoas, mas também com todos os outros por onde entendemos que possa haver algum tipo de contacto”, destacou. Permanecem a monte o argentino Rodolfo José Lohrmann, o britânico Mark Cameron Roscaleer e o georgiano Shergili Farjiani.

Palavras-chave:

O Tribunal da Relação de Évora confirmou, esta sexta-feira, as penas a que tinham sido condenados 11 dos 23 arguidos no processo do roubo e da recuperação das armas militares dos paióis de Tancos. O acórdão teve de ser repetido por causa da “lei dos metadados”, depois de, em fevereiro de 2023, os juízes terem decidido anular a sentença do Tribunal Judicial de Santarém, uma vez que a prova conseguida através dos metadados foi considerada inválida.

Ainda assim, o tribunal considerou válidas as declarações proferidas em sede de julgamento, mantendo a decisão da primeira instância. Na leitura do acórdão, o presidente do coletivo, Nélson Barra, afirmou que o tribunal “eliminou as referências ao metadados”, mas entendeu que “as declarações dos arguidos, em sede de audiência, constituem meios de prova e são suscetíveis de serem valoradas”. O coletivo de juízes manteve assim “tudo o que foi dito aquando do acórdão inicial” do processo.

A decisão apanhou de surpresa a defesa, que considerava que a anulação das provas que estavam ligadas à geolocalização dos telemóveis iria fragilizar a tese da acusação. Isso não aconteceu.

O autor confesso do furto aos paióis de Tancos, João Paulino, mantém a condenação a oito anos de prisão efetiva. João Pais a cinco anos de prisão e Hugo Santos a sete anos e seis meses.

Em liberdade, mantêm-se Luís Vieira (condenado a quatro anos de prisão com pena suspensa), o major Vasco Brazão (a cinco anos de pena suspensa), Pinto da Costa e Lima dos Santos (condenados a cinco anos), Lage de Carvalho e Bruno Ataíde (a três anos) e Batista Gonçalves (a dois anos e seis meses).

O “filme” de Tancos

Recorde-se que o assalto a Tancos ocorreu na noite de 28 de junho de 2017. No dia seguinte, o exército português tornou público o desaparecimento de material de guerra de dois dos paióis nacionais. O caso provocou um “terramoto” nos universos político e militar – com o então ministro da Defesa, Azeredo Lopes, no olho do furacão (chegou a ser arguido, mas foi absolvido dos crimes de denegação de justiça, prevaricação, favorecimento pessoal praticado por funcionário e abuso de poder.).

No dia 18 de outubro de 2017, a Polícia Judiciária Militar (PJM) anunciou que intercetara o material roubado na região da Chamusca, Santarém, “com a colaboração do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé”, numa altura em que o caso já tinha passado para a alçada da Polícia Judiciária (PJ). O desfecho apanhou todos de surpresa – uma vez que teria resultado de uma investigação paralela ao caso, ordenada pelo então diretor da PJM, Luís Vieira, à revelia da PJ e do Ministério Público (MP). As “discrepâncias” entre material desaparecido e encontrado, que foram sendo dadas a conhecer nas semanas seguintes, “embrulharam” ainda mais o caso, não permitindo amainar (nem um pouco) a polémica, e obrigando à intervenção do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que veio a terreiro exigir o “esclarecimento cabal” de todo o processo.

Quase um ano depois, a 5 de setembro de 2018, a Polícia Judiciária levaria a cabo a “Operação Húbris”, que culminou com a detenção do diretor-geral da PJM, Luís Vieira, e de três militares da GNR de Loulé (entre oito mandados de detenção que visaram ainda outros militares da PJM e um civil). No âmbito das investigações, o MP pediria também a detenção do porta-voz da PJM, Vasco Brazão, que se encontrava em missão na República Centro-Africana (Brazão regressaria ao país e seria detido para interrogatório a 1 de outubro).

Precisamente um mês depois da “Operação Húbris” (a 4 de outubro de 2018), o semanário Expresso daria mais pormenores do caso, noticiando que a recuperação do material não terá passado de uma encenação da PJM, em conivência com o autor do furto e a GNR de Loulé, e que até o próprio Azeredo Lopes teria conhecimento do plano – uma informação dada por Vasco Brazão durante o seu primeiro interrogatório (negada pelo ministro da Defesa).

Pressionado pela oposição, Azeredo Lopes acabaria por cair. No dia 12 outubro de 2018, demitia-se do cargo, justificando querer evitar que as Forças Armadas fossem “desgastadas pelo ataque político” e pelas “acusações” de que dizia estar a ser alvo. João Gomes Cravinho assumiria, assim, a pasta da Defesa.

Apenas a 26 de junho de 2020, os 23 arguidos do processo de Tancos souberam que iam a julgamento. Nove dos arguidos acusados de planear e executar o furto do material militar e os restantes 14, entre eles Azeredo Lopes e os dois elementos da PJM, da encenação que esteve na base da recuperação do armamento. O julgamento arrancou a 2 de novembro – No dia 7 de janeiro de 2022, o Tribunal Judicial de Santarém condenou 11 dos 23 acusados, decisão que seria anulada devido à nova “lei dos metadados”.

A Relação de Évora mantém agora a decisão da primeira instância. Conheça os condenados e respetivas penas:

1. Luis Vieira, 68 anos, coronel, ex-diretor da PJM. Foi condenado a quatro anos de prisão com pena suspensa, pelos crimes de favorecimento pessoal. Fica ainda impedido de desempenhar funções públicas durante três anos;

2. Vasco Brazão, 50 anos, antigo coordenador de investigação criminal da PJM, era o porta-voz desta polícia. Foi condenado a cinco anos de prisão com pena suspensa, por favorecimento e falsificação. Fica ainda impedido de desempenhar funções públicas durante dois anos e seis meses;

3. Roberto Pinto da Costa, 50 anos, major, ex-inspetor-chefe da PJM, foi condenado a cinco anos com pena suspensa. Segundo a investigação, teria sido informado que se preparava um roubo aos paióis um mês antes do furto. Terá tido papel importante na farsa da recuperação do armamento. É ainda afastado da carreira durante dois anos;

4. Caetano Lima Santos, 44 anos, sargento, antigo chefe do Núcleo de Investigação Criminal (NIC) da GNR de Loulé. Foi condenado a cinco anos de prisão com pena suspensa e está proibido de desempenhar funções públicas durante dois anos;

5. Bruno Ataíde, 35 anos, guarda da GNR de Loulé, investigador do NIC de Loulé. Foi condenado a três anos de prisão com pena suspensa por favorecimento pessoal praticado por funcionário – foi este militar que recebeu a informação sobre a localização do material roubado (encontrado na Chamusca). O tribunal considerou que não deve ser suspenso de funções;

6. Mário Lage de Carvalho, 45 anos, primeiro-sargento da GNR, investigador da PJM. Seria o elo de ligação entre PJM e GNR em todo o processo de recuperação do armamento. Foi condenado a três anos de pena suspensa por favorecimento pessoal praticado por funcionário;

7. José Gonçalves, 35 anos, guarda da GNR de Loulé, investigador do NIC de Loulé. Faria parte do grupo que preparou a farsa da localização das armas. Foi condenado a dois anos e seis meses de pena suspensa, também pelo crime de favorecimento pessoal praticado por funcionário;

8. João Paulino, 35 anos, ex-fuzileiro, conhecido das autoridades por ser traficante de droga, é o autor confesso do furto do armamento. Foi condenado a oito anos de prisão por terrorismo e tráfico de droga;

9. João País, 34 anos, amigo e cúmplice de Paulino, conhecido por “Caveirinha” e “gadelhas” – por usar cabelo comprido –, também já era um velho conhecido das autoridades por ligações ao tráfico. Foi condenado por terrorismo, em coautoria com Paulino, a cinco anos de prisão;

10. Hugo Santos, 37 anos, também amigo de Paulino, cúmplice no tráfico, foi condenado a sete anos e meio de prisão por terrorismo e tráfico;

11. Jaime Oliveira, 38 anos, conhecido de “Pisca”, dono de um restaurante em Aveiro, chegava a esta fase acusado de tráfico de droga, mas acabou condenado apenas por consumo. Tem de pagar uma multa de 300 euros.

Palavras-chave:

Desde que foi anunciada a vitória republicana nas eleições norte-americanas que a plataforma social X, detida por Elon Musk, tem vindo a registar um grande êxodo de utilizadores. De figuras bem conhecidas do público, a órgãos de comunicação internacionais, vários utilizadores estão a abandonar a plataforma na sequência do apoio mostrado pelo dono da Tesla a Donald Trump – que lhe valeu uma nomeação para administração republicana – e do papel desempenhado pela rede social na disseminação de conteúdos que considerados discriminatórios e incitadores ao ódio. Outras mudanças levadas a cabo nas políticas e funcionamento da app nos últimos meses – como o restabelecimento de contas banidas ou a alteração do sistema de verificação (agora premium) – também levaram muitas pessoas a procurar alternativas ao anterior Twitter.

Esta “migração” de utilizadores online levou a que plataformas como a Bluesky ou o Threads, do Instagram, tenham registado, nas últimas semanas, um maior crescimento, tendo já alcançado a liderança do top de aplicações gratuitas mais descarregadas da App Store da Apple. O X encontra-se na 46ª posição.

O fluxo de novos utilizadores, sobretudo de pessoas da América do Norte e do Reino Unido, levou a Bluesky a alcançar já os 20 milhões de utilizadores do mundo inteiro. De acordo com um relatório divulgado pela empresa Similarweb – a mesma que registou a saída de 115 mil utilizadores do X num só dia – a Bluesky teve um aumento na ordem dos 519% de utilizadores dos Estados Unidos na semana de 5 de novembro comparativamente aos primeiros dez meses de 2024. Já no Reino Unido, o crescimento foi de 352 por cento. “[A Bluesky] tornou-se um refúgio para as pessoas que querem ter o tipo de experiência nas redes sociais que o Twitter costumava proporcionar, mas sem todo o ativismo de extrema-direita, a desinformação, o discurso de ódio, os bots [perfis falsos] e tudo o resto”, disse Axel Bruns, investigador de redes sociais ao The Guardian.

Mas esta não foi a primeira vez que a Bluesky ganhou utilizadores vindos do X. Em agosto deste ano, após a proibição da rede social no Brasil, a plataforma ganhou cerca de 2,6 milhões de utilizadores, dos quais, segundo a empresa, 85% eram brasileiros.

O que é a Bluesky?

Criada em 2019 por Jack Dorsey, a Bluesky começou como um projeto de microblogging dentro do próprio Twitter. O objetivo, segundo o Dorsey – também fundador do Twitter – passava por, com uma “pequena equipa independente” de apenas alguns trabalhadores, “construir um padrão aberto e descentralizado” para as plataformas sociais.

Em 2021, a app passou para a liderança de Jay Graber, diretora executiva da plataforma, que permanece no cargo até hoje. Depois do processo de compra do Twitter por Elon Musk, em 2022, a empresa tornou-se um projeto independente e “propriedade da própria equipa, sem qualquer participação detida pelo Twitter”. Contudo, e apesar de Graber garantir que detém o “maior controlo” no trabalho desenvolvido na plataforma, a mesma é gerida como sendo de utilidade pública dos Estados Unidos.

“A Bluesky é uma rede social aberta que dá aos criadores independência das plataformas, aos programadores a liberdade de construir e aos utilizadores uma escolha na sua experiência”, lê-se numa publicação dos criadores. 

Como funciona?

Até ao início deste ano, a aplicação era fechada apenas a convidados, tendo sido disponibilizada totalmente em fevereiro. Muito semelhante ao X, a Bluesky manteve um funcionamento e linha estética muito idênticos à app original. A plataforma de microblogging permite aos seus utilizadores interagirem através de publicações (chamados skeets) – até 300 caracteres – que podem ser alvo de “gostos”, comentários ou partilhas, à semelhança do que acontece noutras redes sociais. É ainda possível enviar mensagens diretas a outros utilizadores e partilhar fotografias.

Todas as publicações surgem na “skyline” – nome dado à página inicial (ou feed) – da aplicação que, organizada por ordem cronológica, é personalizável. De acordo com a empresa, a Bluesky é “personalizada para o que gosta de ver, ao mesmo tempo que lhe dá uma visão do que é tendência na rede”. O utilizador pode escolher o tipo de conteúdo que quer que surja na sua “skyline”, optando por conteúdos no feed de “descoberta” – publicados por qualquer pessoa -, conteúdos de apenas as pessoas que segue (os conhecidos “mutuals”) ou até escolher dividir o conteúdo que consome por assuntos e temas.

Outra novidade são os “pacotes de iniciantes” que qualquer pessoa pode subscrever e que oferecem uma lista de pessoas com os mesmos interesses, organizada por outros utilizadores. Estas listas são especialmente úteis para o utilizador seguir os assuntos por que mais tem interesse ou até para bloquear pessoas com conteúdos com os quais não quer interagir. A rede permite ainda que o utilizador personalize totalmente o seu “handle”, criando um domínio próprio para cada pessoa. 

Palavras-chave:

O VOLT Live é um programa/podcast semanal sobre mobilidade elétrica feito em parceria com a Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE).

Em destaque no VOLT Live, episódio 89, gravado a 21 de novembro de 2024:
– A chegada da Dongfeng e as suas três marcas a Portugal pelas mãos da Salvador Caetano
– O final do Campeonato de Portugal de Novas Energias – PRIO
– O novo Hyundai Ioniq 9
– Em Polo Positivo e Polo Negativo comentamos a ultrapassagem, por muito, da marca dos 100 mil 100% elétricos em Portugal e um concurso público da Câmara Municipal de Ovar para instalação de postos de carregamento
– Em Carrega Aqui revelamos as novidades mais importantes na rede de carregamento
– Em eDicas fazemos uma recomendação importante para quem carrega o veículo elétrico em casa

Versão Podcast

Pode adicionar este e outros podcasts da Exame Informática à sua aplicação preferida de podcasts:

No Spotify

No Apple Podcasts

A pele branca, os cabelos negros soltos, os pés descalços. Os braços cruzados abaixo do peito. Ahoo Daryaei despiu-se até ficar de roupa interior à porta de uma universidade no Irão. Quem a rodeia evita olhar. Ela anda para trás e para a frente, com uma rigidez de estátua. E, no entanto, é como se a sentíssemos tremer debaixo daqueles braços que se apertam, como se se estivesse a segurar para não se partir. O seu corpo é uma arma. E por muito medo que sinta neste momento, são os que a rodeiam que estão apavorados.

“As mulheres metem medo”. Dou por mim a escrever esta mensagem a uma amiga que se queixa de como é atacada de cada vez que dá uma opinião. “Medo”. É interessante que o escreva. O que há a temer? Penso nos apedrejamentos contra as adúlteras, nas fogueiras que queimaram as bruxas, nos trolls que nos perseguem na internet, em como uma motorista de Uber me explicou que vai sempre trabalhar de fato de treino e sem maquiagem para evitar (como tantas vezes acontece apesar disso) que lhe façam propostas para se prostituir. Em todos os casos, há um exercício de poder para impor a submissão.

“Não devemos entregar as nossas responsabilidades às mulheres. Eu admiro as mulheres, não as diminuo, de todo. Mas elas devem estar lá para nós, devem ser um grande apoio”. Esta frase foi dita há uma semana por Alexander Lukashenko e até há pouco tempo poderíamos pensar que esta afirmação descarada de uma misoginia que quer manter as mulheres prisioneiras das tarefas de cuidado seria apenas uma extravagância própria do Presidente de um país como a Bielorrússia. Mas esse tempo acabou.

Pete Hegseth, o homem que Donald Trump quer a liderar o Pentágono, já deixou claro que considera as mulheres militares um empecilho. “Não devíamos ter mulheres em posições de combate. Isso não nos tornou mais eficazes nem mais letais, e veio complicar o combate”, disse na mesma entrevista em quem se referiu às políticas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) no exército, lançadas no início da década de 1960 por John F. Kennedy, como “merdas woke”.

Elon Musk, um dos mais influentes conselheiros do recém reeleito Presidente Donald Trump, não hesitou em partilhar no X um post sobre como “mulheres e homens com baixa testosterona” não são capazes de pensamento livre porque “não se conseguem defender fisicamente”. O post original apareceu no 4chan, uma rede social de supremacistas brancos misóginos de extrema-direita. Musk partilhou-o com a frase “observação interessante”.

Muito “interessante” também é esta promessa de Donald Trump: “Vamos proteger as mulheres, quer elas queiram ou não”. Fica claro o que estes homens pensam sobre o direito à autodeterminação das mulheres, infantilizadas, incapazes de decidir sobre os seus destinos, a precisar de proteção para, claro, servir e apoiar machos alfa cheios de testosterona.

A organização Human Rights Watch está a levar a sério este tipo de sinais. E nem precisa de especular sobre o futuro da Administração Trump para antever a ameaça sobre dos direitos das mulheres. Basta recorrer ao passado. Macarena Sáez, a diretora do departamento de direitos das mulheres da Human Rights Watch, lembra os estragos que a primeira passagem de Trump fez ao atacar as políticas para combater a discriminação salarial ou a discriminação na educação e dificultar o acesso ao aborto (por exemplo, recuperando uma lei de 1873 sobre o envio por correio de “material obsceno” para impedir mulheres de encomendarem pílulas abortivas de estados em que são legais). “Espero que os ativistas pelos direitos humanos e outros que lutam contra os autoritarismos percebam que lutar pelos direitos das mulheres é lutar pela democracia”, diz Macarena Sáez.

Andamos há demasiado tempo a ignorar o que existe mesmo à nossa frente. Iludidos pelo ruído dos conservadores e das suas guerras culturais, tem-nos passado ao lado a forma como cada vez mais homens se organizam em tribos como os incels (celibatários involuntários), dispostos a ver o mundo como uma guerra biológica, com machos alfa e mulheres que têm de ser submetidas.

Susanne Kaiser, uma jornalista alemã, traça um retrato profundo e surpreendente desse submundo em A revolta do homem branco, um livro que explica como se multiplicam em fóruns online movimentos a favor da legalização da violação e de apologia da violência machista como uma forma de repor uma certa ordem patriarcal tradicional, num mundo que estes grupos misóginos acreditam estar a retirar direitos aos homens.

Ao ler Kaiser, percebemos a importância que tem assumido o ataque ao chamado “wokismo” por parte de grupos conservadores. Em Portugal, onde não há registo de alguém alguma vez ter sido verdadeiramente cancelado por ser misógino, racista ou homofóbico, estas lutas parecem-nos por vezes quixotescamente ridículas. Mas há um propósito na narrativa que apresenta os homens brancos heterossexuais como vítimas de um feminismo agressivo que supostamente os quer oprimir.

“A violência raramente se justifica quando somos nós quem começa. Mas é sempre justificada quando nos estamos a defender de uma injustiça”, escreve Susanne Kaiser, citando o sociólogo feminista Michael Kimmel, que explica como a violência é usada contra as mulheres para repor o controlo, de uma forma que os mesmos homens nunca pensariam usar contra, por exemplo, os chefes que os humilham e maltratam, porque acreditam que essa humilhação decorre de uma hierarquia natural e aceitável.

A ideia de que há uma guerra entre géneros só favorece os homens que odeiam as mulheres. E eu acredito que nem todos os homens odeiam as mulheres. Mas por algum motivo estamos a deixar que regresse uma retórica bafienta que pensávamos enterrada num passado de horrores. Mesmo que não pareça, este é o tempo de falar de amor. E de olhar para o exemplo de Ahoo Daryaei, abraçando-nos para segurar o medo que temos por dentro, enquanto enfrentamos quem nos teme. Não, não temos de nos esconder.