Israel anunciou, esta terça-feira, um cessar-fogo no Líbano. O gabinete de guerra israelita, em conjunto com o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, chegou a acordo para que haja uma trégua com efeitos a partir desta quarta-feira.
O cessar deverá estar em vigor durante 60 dias, e o primeiro-ministro israelita garante que se a milícia xiita Hezbollah quebrar o acordo, Israel “responderá energicamente a qualquer violação”. Por agora, diz que vai concentrar-se na “ameaça iraniana”.
Na prática, este decisão inclui a deslocação das forças do Hezbollah para norte e a garantia de uma zona tampão com Israel a sul. A segurança na zona deverá ser garantida pelas Nações Unidas e pelo exército do Líbano.
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No último ano, mais de 3750 pessoas foram mortas no Líbano e cerca de um milhão foram deslocadas. O Hezbollah já matou pelo menos 45 civis e 73 militares israelitas, durante o conflito.
O The Sovereign Portuguese Art Prize, um prémio anual organizado pela Sovereign Art Foundation (SAF), como forma de angariar fundos para ajudar crianças desfavorecidas ou em situações de risco, chegou à sua 3ª edição. De 27 de novembro a 14 de dezembro, a Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA) acolhe a exposição na qual são mostradas as obras dos 33 finalistas.
O vencedor, escolhido por um painel internacional de jurados composto por diretores de museus e instituições, leiloeiras e o vencedor do ano passado, será aununciado a 7 de dezembro e receberá um prémio de 25 mil euros.
O JL conversou com Howard Bilton, presidente do Sovereign Group e criador do The Sovereign Portuguese Art Prize.
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Portugal não é o primeiro país ao qual o Sovereign Art Prize chega. Há quanto tempo e por que razão decidiu criá-lo?
Criámos o prémio em 2003 e a minha motivação foi a de usá-lo como um veículo para angariar fundos, a fim de poder fazer o que realmente me interessa: ajudar crianças desfavorecidas. Poderia fazê-lo sem organizar um prémio de arte, é claro, mas desta forma consigo também ajudar os artistas.
De que forma é que o prémio ajuda estas crianças?
Das obras finalistas, exceto a vencedora, que passará a integrar a coleção da SNBA, 22 serão vendidas na exposição e 10 leiloadas pela Phillips num jantar de gala, dia 7, no Palácio da Bacalhôa. Tanto num caso como no outro, os artistas recebem 50% da venda, a mesma percentagem a que teriam direito numa galeria, e os restantes 50% revertem para projetos sociais que estamos a implementar em Portugal.
Quais?
Por exemplo, há dois anos que, em Estremoz, usamos a arte como forma de terapia e reabilitação para crianças em circunstâncias muito complicadas, seja porque têm problemas mentais, dificuldades de aprendizagem ou que são abusadas física ou psicologicamente. É uma ferramenta muito poderosa que podemos usar para ajudá-las a regressar ao sistema de educação convencional.
E por que razão decidiu trazer o prémio para Portugal?
Começou em Hong Kong, onde eu vivia em 2003, e chegou a África há cinco anos, após conseguirmos uma parceria com a Norval Foundation. Estamos em Portugal, há três, desde que eu vim para aqui viver. Naturalmente, queria fazer a diferença e um bom trabalho na minha nova casa. É uma escolha peculiar, porque, tendo apenas 11 milhões de habitantes, a base de colecionadores e a comunidade artística do país são reduzidas, mas, precisamente por isso, pensámos que o prémio poderia fazer realmente uma grande diferença, sobretudo para os artistas.
Só aceitam portugueses?
Aceitamos portugueses, quer vivam ou não em Portugal, e artistas de outras nacionalidades, desde que vivam em Portugal.
As candidaturas são espontâneas?
Não. Temos um grupo de “nomeadores” – diretores de museus, curadores, críticos e especialistas em arte – a quem pedimos que proponham aqueles que consideram ser os melhores concorrentes.
A Fundação compra obras a algum dos artistas?
Não, pois usamos todo o dinheiro angariado para investir nos programas artísticos na comunidade.
Durante todo o mês de novembro, as lojas iServices estão com descontos até 70% em produtos seleccionados, um best-seller semanal em promoção e 10€ em cartão cliente em todas as reparações.
Black Friday com mais descontos
Dia 29 de novembro acontecerá a Black Friday e apesar da iServices ter estado todo o mês com descontos em produtos, neste dia serão ainda mais. Além disso, os equipamentos recondicionados estarão a preços imperdíveis.
Descobre aqui alguns dos produtos que vão estar em desconto, para além dos que já estão atualmente:
A campanha de Black Friday da iServices é ideal para começar já a preparar as suas prendas de Natal e a pensar nisso a marca vai aumentar o prazo de troca nos produtos da marca própria até 31 de janeiro de 2025. Além disso, fique atento, porque dezembro vai trazer outras novidades…
No âmbito do quinto pagamento a título do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR), a Comissão Europeia aprovou esta terça-feira o desembolso de 2,9 mil milhões de euros a Portugal.
Segundo um comunicado, o montante – dividido em 1,65 mil milhões de euros em subvenções e 1,25 mil milhões de euros em empréstimos – foi aprovado após uma avaliação positiva da UE ao cumprimento das 15 metas e 27 marcos requeridos a Portugal. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) – que integra várias medidas de investimento e de reforma – será financiado em 22,2 mil milhões de euros – dos quais 16,3 mil milhões em subvenções e 5,9 mil milhões em empréstimos.
O Mecanismo de Recuperação e Resiliência é uma das medidas centrais do plano NextGeneration para fortalecer a UE após a crise provocada pela pandemia da covid-19.
No início de 2014, quase três anos depois de chegarem a Coimbra vindos de Belo Horizonte, Isabella Gonçalves e Fábio Merladet pareciam levitar com a nova vida académica na velha cidade universitária. Além de partilharem na internet fotos boémias, com cravos, ramos de flores e beijos aparentemente apaixonados, com o aqueduto de São Sebastião em fundo, o casal de namorados seguia enfeitiçado com a sua condição de doutorandos, no mítico Centro de Estudos Sociais (CES).
A aura do orientador ajudava. Boaventura de Sousa Santos, espécie de guru das Ciências Sociais e das teses emancipatórias da esquerda latino-americana, era, para ambos, o pináculo do pensamento. Nesse tempo, quando o sociólogo proferia alguma conferência, os alunos da instituição eram mobilizados para encher a sala onde esta decorresse.
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Casarão Bella Gonçalves à direita de Boaventura, no ano em que diz ter sido assediada. Este restaurante de Coimbra era o “quartel–general dos encontros afetivos” do sociólogo com alunos e colaboradores
“Boaventura fizera-se à ‘Bella’, mas ela ficou perturbada e não tinha forças para fazer disso assunto público”, conta um amigo da deputada estadual brasileira, que denunciou o alegado assédio do sociólogo nos tempos do CES
Na noite de 23 de janeiro, após um seminário, no qual Boaventura fora anfitrião do amigo José Geraldo de Sousa Júnior, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, “Bella” e Fábio, na companhia de amigos brasileiros e portugueses, rumaram ao restaurante O Casarão, “quartel-general dos colóquios afetivos” do sociólogo com alunos e colaboradores, na expressão do conferencista daquela tarde. No fim do repasto, veio a foto da praxe: Boaventura, de cachecol vermelho ao pescoço, rodeado pelos devotos, posou com Isabella ao lado, que sorria, com a mão esquerda no ombro do “mestre”. Atrás de ambos, o namorado dela.
Por alguns meses, a brasileira ainda manteve, nas redes sociais, a veneração pelo ídolo, ora o assinalando em debates ora elogiando um “maravilhoso artigo”. De repente, o culto extinguiu-se. Quase sem se dar por isso, Boaventura, que “Bella” conhecera em Coimbra no contexto dos intercâmbios científicos entre Brasil e Portugal, “desaparecera” das redes digitais da investigadora brasileira.
A agora deputada estadual do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), em Minas Gerais, precisou de quase dez anos de dor, anonimato e silêncio para explicar a razão pela qual o seu mundo – na versão dela e negada pelo visado – desmoronou em 2014. “Bella” Gonçalves contou à Agência Pública, do Brasil, que, certo dia, durante uma reunião no apartamento de Boaventura, o sociólogo lhe pousou a mão na perna e sugeriu que ela teria vantagens caso decidisse “aprofundar a relação”. Ainda meio zonza com a proposta de “contrato” de cariz sexual, saiu porta fora. No dia seguinte, Boaventura terá chamado Isabella e o namorado para conversar. “Humilhou nossos trabalhos.” Fábio chorou à frente do diretor do CES e “Bella” entendeu a descompostura como punição pela recusa.
Assédio e abusos na Academia
Ela tinha 26 anos, ele 70.
A brasileira já notara abordagens mais subtis por parte do orientador, mas, a partir daí, nada ficou igual. Na época, o núcleo mais restrito de amigos e de colegas do casal recebeu a notícia de que a brasileira ia embora. Motivo? “O Boaventura fizera-se a ela, mas ela ficou perturbada e não tinha forças para fazer disso assunto público”, recorda à VISÃO um confidente desse tempo. Quem tinha de saber soube, incluindo professores do CES. Para espanto dos mais próximos, Fábio, o namorado, terá sugerido que ela relativizasse o caso.
A relação já não estava bem e terminou logo depois.
Isabella Gonçalves foi a primeira vereadora lésbica a ser eleita em Belo Horizonte. Casou-se em 2018 com a atual companheira e doutorou-se no CES, anos depois, com outro orientador. “Quis a vida que as coisas dessem errado. O errado mais acertado da minha vida”, escreveu, no Facebook. Também doutor pela mesma instituição, o ex-namorado – que não respondeu ao contacto da VISÃO – coordena, no Rio Grande do Sul, a Universidade Popular dos Movimentos Sociais (UPMS), de que o sociólogo português é fundador. Fábio cita-o nas entrevistas e artigos, e se nada, entretanto, se alterar, Boaventura participará num debate em Porto Alegre, dia 28, em representação da UPMS.
A revelação do caso da atual líder do PSOL em Belo Horizonte surgiu na sequência de alegadas práticas de assédio, denunciadas por três ex-alunas do CES (Lieselotte Viaene, Catarina Laranjeiro e Miye Nadya) num capítulo “autoetnográfico” da renomada publicação científica Routledge sobre más condutas sexuais e outros abusos no meio académico. As autoras não citam nomes, mas a narrativa refere pistas, casos e episódios de abusos de poder, “extrativismo intelectual e sexual” e “impunidade”, que Boaventura (“professor-estrela”) e o antropólogo Bruno Sena Martins (ex-namorado de uma das investigadoras e referido como “aprendiz”) assumem como lhes sendo dirigidas, a eles e ao CES. Negam tais práticas, prometem recorrer aos tribunais e suspenderam funções até à conclusão do inquérito de uma comissão independente, por decisão da instituição.
Uma das histórias incluídas no artigo é a de “Bella” Gonçalves, embora sob anonimato. A repercussão mundial da polémica gerou novas acusações contra Boaventura, uma delas protagonizada pela ativista indígena argentina Moira Millán. Depois, foi a vez de a deputada brasileira desvendar a sua identidade.
“Abalado, constrangido e triste” com o caso, que ignorava, amigo de Boaventura e coautor de artigos científicos em parceria, José Geraldo Júnior conheceu “Bella” Gonçalves em Coimbra e segue os seus mandatos e ação política. “Dou inteiro crédito a tudo que ela diz, assim como acho que a atitude mais compatível com a ética emancipatória é ter como procedentes todos esses depoimentos, trabalhar pela responsabilização de toda e qualquer violação e construir mecanismos que coíbam sua repetição”, esclarece o ex-reitor da Universidade de Brasília, antecipando à VISÃO o teor de um artigo que publicará na sua coluna “O Direito Achado na Rua”, no jornal Brasil Popular. Para ele, Isabella Gonçalves deu “a mais viva expressão de seu engajamento democrático: transformar a dor numa ação para a blindagem de toda uma nova geração de mulheres, para que nenhuma violação siga impune, para que nenhuma mulher fique sem o atendimento adequado. Esse deve ser o compromisso de todos nós”, defende.
Academia, versão “Rei Leão”
As histórias sórdidas da Academia são tão velhas como a própria, sobretudo quando consumadas. A elas não falta, claro, a inevitável galeria de notáveis e de personalidades públicas sempre protegidos pelos cenáculos, o espírito de alcateia, os “consensos” ou as dependências, medos, sobrevivências e precariedades de quem poderia denunciá-los.
“O perfil de heterossexual, nascido entre 1940 e 1960, que assedia alunas e investigadoras ao longo de anos é muito comum. Mas até há pouco tempo era tudo mais ou menos consensual, sem que elas se descrevessem como vítimas de assédio, mesmo quando não beneficiaram dessas relações”, descreve um deputado e comentador televisivo ligado à Universidade de Lisboa (UL).
A declaração pede rigor científico, pelo menos a montante. Ei-lo: “A história mostra-nos como, longe de ser neutral, o domínio administrativo e epistémico da Academia tem sido detido por – e garantido para – sujeitos categorizados como homens, de classe média-alta, brancos, fisicamente capazes e heterossexuais, seja ao nível das expectativas, acesso e sucesso ao longo do percurso académico, seja ao nível da construção da carreira na pesquisa, produção de saberes, liderança e reconhecimento social”, lê-se no artigo Desigualdades de Género no Ensino Superior Português: Desconstruindo os tijolos patriarcais da velha torre de marfim, da autoria de Nuno Santos e de Liliana Rodrigues, da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto.
Ah!, se tu gritas assim com uma palmada no braço, queria ver, se alguma coisa te entrasse por aí adentro, como é que tu ias gritar…
Professor da Universidade do Minho para uma aluna (citação extraída de uma dissertação de mestrado)
Disse-me que se sentia sozinha e perguntou-me se gostava de ‘pito’
Denúncia anónima de um aluno da Universidade do Minho sobre professora com quem mantinha aula por Zoom
Se tivermos algo mais, estou disposto a dar-te as respostas [do exame] para teres positiva
Disse J., docente na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, a uma caloira a quem dava explicações de matemática
Eu já não sei comprar roupa interior
Historiador e ex-deputado do PS dirigindo-se a uma subalterna da academia, num jantar, na tentativa de levá-la para casa
As meninas ficam na fila da frente para as ver melhor
Professor de Engenharia Eletrónica da Universidade do Minho, segundo denúncia anónima de um aluno
Catedráticos de História Medieval, monárquicos, por vezes ligados à Opus Dei, casadíssimos e com descendência numerosa, despedem secretárias quando estas engravidam ou protegem favoritas, desde as cadeiras de mestrado às vagas para assistente, em alguns casos até chegarem a diretoras de faculdade.
Dinastias também as há: catedráticos de Medicina que aplainam o terreno para os filhos dirigirem as instituições onde fizeram o seu percurso, por exemplo. E não faltam misoginias célebres: além das relações com várias subordinadas, um professor e investigador do Instituto de Ciências Sociais da UL ficou famoso pela forma como destratava o sexo feminino para gáudio dos ouvintes. Outro, da mesma instituição, contratava prediletas, mesmo quando destratado em público pela performance sexual.
Professores oriundos da Universidade Autónoma de Lisboa, com ambições políticas, não se livraram da suspeita de assinarem livros académicos para os quais pouco ou nada contribuíram e muito menos se coibiram de pagar a renda do apartamento a ex-alunas vertidas em vedetas de televisão. Na Universidade Nova de Lisboa, também circularam, entre antigos estudantes, vídeos das atividades extracurriculares de um catedrático com alunas e investigadoras, sem que as puras almas académicas se sobressaltassem. Plagiadores reincidentes, “nódoas das Relações Internacionais”, só foram expulsos da Academia ao fim de uma dúzia de casos detetados e depois de fazerem parte da comissão editorial de uma revista académica, por receio dos departamentos das próprias instituições, que, em alguns casos, até perseguiram quem alertara atempadamente para as situações.
A mancha do professor
Acusações de assédio põem em xeque carreira de prestígio de Boaventura Sousa Santos, o sociólogo que aprendeu com o mundo que palmilhou
Aos 22 anos, Boaventura Sousa Santos ainda não conhecia o mundo para lá dos livros. Nascido e criado em Coimbra, filho de uma família humilde, o então recém-licenciado em Direito, pela Universidade de Coimbra (UC), com média de 17 valores – a melhor em 1963 –, aproveitou uma bolsa académica para rumar a Berlim Ocidental (cidade dividida pelo Muro), resolvido a prosseguir os estudos em Filosofia. “Lembro que eu nunca tinha saído de Portugal, tinha apenas feito uma visita de estudo, no final do Ensino Secundário, ao Algarve (…). Foi o primeiro grande trauma da minha mãe, o seu filho único, muito mimado (…)”, recorda, numa entrevista à Revista Crítica de Ciências Sociais, em 2018, por altura dos 40 anos do Centro de Estudos Sociais (CES), conduzida pelo “aprendiz” Bruno Sena Martins. Para trás deixava o convite para lecionar na faculdade, onde observara, com notório desagrado, como os agora colegas “ganhavam muito (…) nos célebres pareceres”, elaborados para “pessoas importantes, que podiam pagar bons advogados”. “Às vezes, até ficava escandalizado como era possível ganhar tanto dinheiro em tão pouco tempo”, confessa na mesma conversa. Ligado ao Movimento Católico de Estudantes – desgostoso com o salazarismo –, apenas os diálogos com professores como Miguel Baptista Pereira ou Vítor Matos (que lembra como “mestres”) ainda o seguravam na cidade. Mas seria numa Alemanha partida em blocos que viria a despertar para a política, posicionando-se no campo do marxismo ocidental, ou socialismo democrático, opondo-se, simultaneamente, ao capitalismo norte-americano e à ditadura soviética. Leitor ávido de Marx, Trotsky, Ivan Illich e Ernst Bloch – autor de O Princípio Esperança, que descreve como “uma bíblia” –, o académico desenvolveu e consolidou o seu conceito de “justiça social”, após doutorar-se em Sociologia do Direito, na conceituada Universidade de Yale, nos Estados Unidos da América, em 1973, ano em que ajudou a fundar a Faculdade de Economia da UC, onde criaria o curso de Sociologia. Com trabalho de campo em vários países do mundo (com presença ilustre no Brasil), tornar-se-ia autor reconhecido e premiado, com textos traduzidos numa dezena de línguas. Antes das acusações de assédio de que é alvo, Boaventura Sousa Santos só havia levantado o véu da intimidade através da poesia, paixão que sempre alimentou. Do último verso de Nature Boy [“The greatest thing you’ll ever learn/ Is just to love and be loved in return”], imortalizado pela voz de Nat King Cole, diria ser “o poema de amor mais bem-feito” que alguma vez ouvira, e inspirador. Hoje, porém, aos olhos do público, parece mais longe de lograr esse propósito.
Foto: Gonçalo Rosa da Silva
No Departamento de História de uma faculdade no Norte do País, ouviam-se há uns anos, nas reuniões informais, sugestões para barrar a entrada de alunos com deficiências. Os preconceitos de género e raciais, dirigidos a mulheres e a estudantes brasileiros ou das ex-colónias, eram frequentes mas também contestados. E há ainda o caso de um ex-governante, do Conselho Científico de uma instituição a sul, que apressou o despedimento da professora convidada que, entretanto, engravidara. “Eu já não sei comprar roupa interior”, justificara, por seu lado, um historiador e deputado socialista por três legislaturas, quando tentou encaminhar uma subalterna para a sua casa, sem sucesso.
O #MeToo do Minho
Em 1997, quando Regina Leite começou a estudar o assédio sexual na Academia, a ideia da atual docente na Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho (UM) e investigadora do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS.NOVA) da instituição gerou desconfiança e perplexidade. “Não é um tema sério”, ouviu. Quando muito, seria “assunto da periferia, arredado do mainstream da investigação”. Talvez até “veleidade ou bizantinice” da então jovem colega e investigadora, “uma americanice” sem aplicação à nossa realidade. Temeu-se, porém, que procurasse “esqueletos no armário” ou que desencadeasse uma “caça às bruxas”. Geraram-se boatos, conversas de corredor, discussões em surdina. “Artigos internacionais eram deixados, em segredo, no meu cacifo”, lembrou, numa conferência recente sobre o tema.
Quase três décadas depois, o que mudou? “A universidade, enquanto espaço público, continua a ser um lugar de violência e de opressão para a voz e o corpo feminino”, assume. Ignorado durante anos, “porque se supunha que não existisse nas universidades”, o problema não desapareceu por milagre. “A caixa de Pandora tardou em ser aberta, mas ainda é um tema à margem das preocupações da ‘torre de marfim’, profundamente machista”, refere.
Protestos Da Universidade do Minho à Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, milhares de jovens manifestaram-se, nos últimos anos, contra os assédios nas instituições de ensino. Mudanças à vista? Foto: LUSA
Em 2021, Celeste Amorim, então estudante do Instituto de Ciências Sociais da UM, verteu para a dissertação de mestrado o resultado de um inquérito a 35 estudantes finalistas de cursos de 1º e 2º ciclos, a maioria do sexo feminino, com média de 23 anos. Foram relatadas situações sistemáticas de assédio, dentro e fora do campus. Porém, o lado mais sombrio da Academia estava por destapar: “Identificaram-me três professores catedráticos com comportamentos de assédio sexual. Dois de Ciências Sociais e um de Gestão. Ao que sei, continuam por lá”, revelou à VISÃO a autora do estudo, numa esplanada do Porto, onde agora trabalha.
[O processo disciplinar de que fui alvo] foi uma mensagem muitíssimo eficaz, criando um clima de medo e de suspeição. Daí a FDUL ter tido tão poucos casos de denúncias [de assédios], após o processo (…) que seria arquivado
Miguel de Lemos Assistente convidado na FDUL
As denúncias referiam também funcionários da UM e incluíam relatos expressivos. “Tenho um professor (…) bastante conhecido por gostar de tocar em meninas, por subir notas a meninas que vão de decote, fazer comentários sobre a beleza eterna das mulheres (…). Já fomos avisadas por alunas do 3º ano. É uma situação que decorre há, pelo menos, uma década”, narrou uma inquirida. “Ah!, se tu gritas assim com uma palmada no braço, queria ver, se alguma coisa te entrasse por aí adentro, como é que tu ias gritar…”, ouvira outra. “Comentários sexistas e machistas, toques indesejados nas mãos, cara ou cabelo e atenção sexual indesejada são alguns comportamentos de assédio cometidos pelos professores”, refere Celeste Amorim. “Mais do que os rapazes, elas identificam as relações de poder e a desigualdade de género na universidade. Sentem-se inferiores, acham que os professores dão mais atenção aos rapazes, mesmo quando elas querem participar. No caso dos assédios, sentem-se impotentes e desamparadas, porque não acreditam na penalização dos agressores.”
No interior das instalações da UM ou fora delas, em ambientes académicos mais protegidos ou festivos, jovens inquiridas descreveram ainda as “armas” de prevenção que transportavam, todos os dias, como se fossem para a guerra: chaves dissimuladas entre os dedos, gás-pimenta, desodorizante, navalhas e outros objetos pontiagudos, e até um bastão de metal.
Em novembro de 2021, a UM afastou um trabalhador, após denúncia de assédio sexual. Vieram a público outros casos. A reitoria reforçou a segurança, reportou às autoridades, mas, a 2 de dezembro, centenas de alunos manifestaram-se em Braga, na universidade, contra o assédio sexual. Uma página criada no Instagram reuniu, de forma anónima, quase centena e meia de relatos, uma parte envolvendo professores e até uma professora. Durante uma aula online na plataforma Zoom, através de um chat privado, uma docente do curso de Línguas e Literaturas Europeias terá enviado a um aluno fotos pornográficas. “Disse-me que se sentia sozinha e perguntou-me se gostava de pito”, descreveu o visado, que, por vergonha, não se queixou aos órgãos da UM.
As situações problemáticas vinham de trás.
A 5 de junho de 2020, um grupo de 17 alunas reportou à Comissão de Ética da UM o aparecimento de uma página aberta, na internet, com o nome completo de todas as estudantes do 3º ano de licenciatura em Ciências da Comunicação, entre outras. O site reproduzia uma espécie de competição para avaliar as jovens com atributos mais atraentes, ao estilo “Liga dos Campeões”, a eliminar, para deleite dos rapazes. Além da eventual violação de dados e de direitos de personalidade, estavam em causa os códigos da própria instituição. As queixosas enfatizaram, por email, “o efeito nefasto e psicologicamente destrutivo” do sucedido, até pelo facto de os autores serem “colegas com quem partilhavam o quotidiano”. Apesar da assunção de culpa por parte de alguns rapazes, o caso foi reportado à Reitoria. “Nunca nos responderam”, recorda uma das denunciantes. E muito estará por fazer. Em fevereiro último, uma ação de sensibilização promovida pelo Instituto de Educação da UM, levada a cabo pela GNR, teve um público quase exclusivamente feminino.
Face a alegadas práticas de assédio moral e sexual, a UM garantiu à VISÃO ter recebido apenas uma queixa formal, em 2021. De momento, a instituição operacionaliza orientações do grupo de missão para a prevenção e combate ao assédio, apresentadas em dezembro daquele ano. Já existem, entretanto, linhas para denúncias anónimas e apoio psicológico especializado para vítimas de violência.
Mais a sul, conhecemos a experiência de Carla (nome fictício), que, com apenas 19 anos, em 1998, decidiu frequentar explicações tendo em vista a realização do exame de Matemática I, uma das cadeiras mais temidas entre os caloiros da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Uma amiga sugeriu-lhe o nome de J., docente naquela faculdade. Durante meses, tudo correu normalmente. Uma vez por semana, ao final da tarde, a jovem ia ao apartamento do “professor J.”, homem nascido na década de 1960, onde, a cada sessão, procurava domar números e equações. “Até àquele momento, nada de esquisito se passara”, refere Carla, que, à VISÃO, recorda como “o explicador tinha até já referido estar noivo e tinha intenções de se casar brevemente”.
Na véspera do exame, a aluna chegou ao apartamento do professor, situado num vale florido da cidade, como habitualmente, mas, desta vez, J. convidou a jovem aluna a sentar-se no sofá da sala “para conversarem um bocadinho”. Tema? O exame de Matemática I do dia seguinte. “Foi tudo muito incomodativo. Aproximou-se de mim, começou a agarrar-me, dizendo-me: ‘Sinceramente, acho que não estás preparada [para ser aprovada no exame]… mas, se tivermos algo mais, quem sabe, estou disposto a dar-te as respostas para teres positiva”. Passados 25 anos, Carla não lembra com exatidão as palavras que lhe saíram naquele momento, apenas que pegou na mochila e correu escada abaixo, abandonando o local, a tremer e a chorar, sem nunca olhar para trás. Só quando chegou a casa é que conseguiu rebobinar o sucedido. “Contei a amigos, apenas. Nunca apresentei queixa, com receio de que não acreditassem em mim, de que fosse prejudicada no curso por outros professores”, alega. “Sentia grande revolta e impotência, claro, mas era a palavra de uma caloira contra a de um docente de uma faculdade, que eu frequentava há poucos meses…”.
O episódio durou apenas minutos, mas, durante muitos anos, Carla não se esqueceu da sensação de terror. Aprovada no exame, concluído o curso, permaneceu na cidade, não muito longe do apartamento onde foi atacada. Um dia avistou o professor, ao longe, a brincar num parque infantil na companhia de uma criança.
“Ambiente tóxico” na FDUL
Em novembro de 2021, a intervenção de Catarina Preto, à época recém-eleita presidente da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), no Conselho Pedagógico da instituição, virou a faculdade “de pernas para o ar”: anos de silêncio, assédios e medo terminariam naquele mandato, prometeu. Criado um canal próprio (uma minuta) para receber denúncias, as queixas chegaram, visando assistentes e professores da “casa”. Ano e meio depois, o ambiente na FDUL continua “tóxico”, com referências a um clima de “guerra surda” ou de “paz podre”. “Tudo ficou na mesma”, dizem.
Várias alunas e alunos apontaram o dedo a práticas de assédio sexual e moral na FDUL. Docentes foram visados, sem consequências. Por proposta do assistente Miguel de Lemos, lançou-se um canal de denúncias da própria faculdade. Em 11 dias entraram 51 queixas de assédio sexual e moral visando dez por cento dos professores. Os números levaram à constituição de um gabinete de apoio à vítima, com o apoio jurídico de Rogério Alves, indicado pela Ordem dos Advogados, a pedido da faculdade. Mas a experiência frustrou-se: o contrato do causídico terminou no fim do ano passado, sem renovação, e o único caso que entrou na Justiça acabou arquivado pela Procuradoria. “Chegaram poucas queixas ao gabinete. Era expectável. Só um maluco confiaria neste mecanismo. Percebo pouco de segurança informática, mas, acredito, será fácil contornar o anonimato de uma queixa”, diz fonte da FDUL. O medo mantém-se.
Estudantes da Universidade do Minho denunciaram, numa dissertação de mestrado, publicada em 2021, o assédio sexual e as atitudes sexistas de três professores catedráticos da instituição
Tudo piorou, quando, explicam à VISÃO, “professores com responsabilidades de gestão ou com uma rede de influências externa e interna, que permite controlar quem a gere, adotaram posição defensiva na tentativa de conter a situação, abafando relatos das vítimas e desacreditando denunciantes”. Foi o caso de Miguel de Lemos, alvo de processo disciplinar após denunciar alegada tentativa de coação a Catarina Preto. O processo, refere o próprio à VISÃO, serviu para “tentar silenciar o único docente que, ao tempo, ousou falar publicamente sobre estes comportamentos. Foi uma mensagem muitíssimo eficaz: criou um clima de medo e suspeição” que, assinala, afetou docentes e alunos. “Daí a FDUL ter tido tão poucos casos de denúncias após o meu processo disciplinar, que durou oito meses, e viria a ser arquivado”.
Miguel de Lemos garante conhecer “casos de assédio moral e sexual por parte de membros do corpo docente da escola, tendo como vítimas alunas e alunos, bem como investigadores e assistentes”. E fala de conivências. “Nunca a FDUL promoveu mecanismos de investigação junto dos alunos e docentes, que expuseram casos de assédio moral e sexual”, nem quando surgiram na Imprensa. Miguel acusa os órgãos de gestão de agir na defesa da “autopreservação e da manutenção do statu quo, num contexto marcado por uma intrincada rede de interesses de alguns dos membros do corpo docente”.
A “dupla bitola”
À VISÃO, alunos da FDUL insistem na veracidade das situações de assédio sexual e moral. Referem, por exemplo, o caso de explicações privadas noturnas a um estudante, ocorridas numa sala da faculdade, e o caso do docente que, nas aulas ao 1º ano, chama “burros” aos alunos e diz: o curso “não é para gente pobre”.
O medo de represálias impede as queixas, asseguram as fontes da VISÃO. Se não surpreende, talvez os nomes envolvidos servissem de alerta. “Muitos docentes têm dupla bitola. Escrevem em jornais, têm intervenções magníficas, de abertura extrema, mas cá dentro comportam-se exatamente como os outros: de forma machista, misógina, autoritária e amputando a expectativa e a esperança dos mais jovens.”
Raio-x à UL: maioria sofre assédio laboral
Inquérito à revelia da reitoria da universidade gera polémica
No dia 7 de março, o reitor da Universidade de Lisboa tentou travar, através de uma mensagem de correio eletrónico enviada ao conselho de coordenação universitário, um inquérito desencadeado por professores e investigadores da “casa” destinado a apurar os níveis de assédio laboral e moral nas instituições da UL. “O dito inquérito não foi sujeito a validação por qualquer Comissão de Ética, não menciona os promotores, não refere o fim a que se destina nem a política de dados em que se baseia, encontrando-se em violação clara das normas das escolas para este tipo de estudos”, escreve o reitor Luís Ferreira no email, a cujo teor a VISÃO teve acesso. Movido pelos crescentes relatos e denúncias sobre o tema que têm sido difundidos nos corredores das faculdades e noutras instituições da UL, o grupo que decidiu levar a cabo o estudo sobre assédio laboral e moral a docentes e investigadores da universidade solicitou respostas por correio eletrónico até 20 de março e garantiu a validade científica do questionário, sustentado, alega, na escala de mobbing [trad.: assédio moral] de Leymann (LIPT-60), que calcula o índice global de mobbing, adaptado para o contexto português.
A iniciativa do reitor terá, no entanto, dissuadido potenciais respostas quando as mesmas decorriam a bom ritmo, mas os promotores da auscultação garantem que a mesma será divulgada publicamente em breve. Ao que apurou a VISÃO, os resultados preliminares apontam para 55 por cento de casos de assédio, num universo próximo de 200 inquéritos validados.
A preocupação em relação ao modo como está a ser feito este estudo, levou Luís Ferreira a levantar a suspeita de uma eventual violação de dados, pois, sustenta, “não é conhecida a forma como foram obtidos os endereços de email dos professores e investigadores”. O reitor aproveitou ainda a mensagem enviada para desincentivar respostas ao inquérito.
As palavras de Elvira Fortunato, há dias, também levantaram a fervura. A ministra do Ensino Superior descartou a criação, para já, de uma estrutura nacional para resolver casos de assédios: “Há várias entidades dentro das instituições que podem ajudar e receber todas essas denúncias”, afastando assim o cenário de medo e de represálias. Comentários “absolutamente lamentáveis e demonstrativos do desconhecimento do funcionamento das instituições”, refere Miguel de Lemos. Sem prejuízo da presunção de inocência, “também é importante ter a noção de que, ao fazer tal ‘profissão de fé’, põe em causa a palavra de dezenas de profissionais do Ensino Superior e as narrativas circunstanciadas de centenas de alunos, investigadores e assistentes universitários – as vítimas”, assinala.
“Basta!” Denúncias de assédio na FDUL trouxeram alunos para a rua, em protesto, em abril do ano passado Foto: LUSA
A advogada e professora Inês Ferreira Leite, voz ativa na denúncia de práticas de assédio moral e sexual na Academia, e com uma experiência de 20 anos na FDUL, destaca que “o assédio moral é o prevalecente” na instituição. “Permite que, por vezes, também surjam situações de assédio sexual.” O presente, aliás, não será muito diferente do passado. “Não houve mudança de perceção em relação a estas coisas, nos últimos 50 anos. Se questionar ex-alunos ou antigos docentes da FDUL sobre professores com poder e influência na instituição, vão dizer-lhe que a faculdade vive em meados do século XX, não evoluiu, não conheceu mudança de mentalidades”, refere. “Os professores fascistas, que tinham colaborado com o Estado Novo e a PIDE, regressaram todos, pouco depois do 25 de Abril, até mesmo aqueles que não tinham mérito. Ainda hoje, pensam e educam da mesma forma, para que os alunos e assistentes pensem como eles”, relata.
A antropóloga Elsa Peralta sofreu assédios e reclama uma comissão independente, como a da pedofilia na Igreja, para limpar a Academia: “Caso contrário, é a mesma coisa do que pôr os padres a investigar o que lá se passa”
No início do mês passado, um grupo de professores decidiu levar a cabo um estudo sobre assédio laboral e moral a docentes e investigadores da Universidade de Lisboa, solicitando respostas por correio eletrónico, até 20 de março. Os autores garantem a validade científica do questionário, mas o reitor da UL, Luís Ferreira, discorda. Logo no dia 7, Ferreira fez chegar um email ao Conselho de Coordenação universitário [cujo teor reproduzimos em caixa nestas páginas], pondo em causa a validade científica e a legalidade da iniciativa. A mensagem travou o ritmo das respostas, mas fonte próxima dos promotores da iniciativa garante: o relatório será divulgado em breve e incluirá perto de 200 questionários validados e níveis de assédio laboral e moral da ordem dos 55%.
Enquanto isso, a Universidade do Porto validou, no seu portal de denúncias, desde junho passado, 19 queixas e reclamações da comunidade académica, cinco das quais relativas a assédio moral e sexual. “As universidades devem investigar até ao fim todos os casos apresentados, doa a quem doer, e tirar consequências do que for apurado”, defendeu, há dias, o Conselho de Reitores.
Os relatos escutados são transversais a várias instituições. E de norte a sul ouvem-se casos relativos a outros pecados da Academia: endogamia e compadrios. A VISÃO acedeu a pormenores de um concurso na Universidade da Beira Interior, alvo de impugnação judicial, em que os vencedores terão sido orientados por um docente, que integrava o júri do concurso. Embora a prova documental e testemunhal pusesse em dúvida partes dos currículos dos candidatos, a ordenação final manteve-se. Pormenor ou talvez não: os certificados adicionais dos vencedores terão sido emitidos e assinados por dois elementos do júri, um deles o tal orientador de doutoramento dos candidatos.
São outros, porém, os casos a ter alcance mediático.
“As situações de assédio, que têm vindo a ser denunciadas, são particularmente graves porque implicam e reproduzem a já assimétrica relação de poder entre homens e mulheres. Mas desengane-se quem pensar que este é apenas um assunto de género. Algumas das mais bárbaras situações de assédio laboral a que assisti, ou vivi na pele, nas várias instituições por que passei, foram perpetradas por mulheres”, escreveu Elsa Peralta no Facebook.
A antropóloga e investigadora do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da UL reclama “uma reflexão e uma ação mais vasta sobre os modos de governo das instituições da Ciência e do Ensino Superior”, sobre as endogamias que gera e as formas de precarização laboral que as sustentam. De outro modo, crê, “tudo isto não passará da novela mediática do momento, ou, pior, do pretexto, para que algozes cavalguem sobre a miséria alheia”. À VISÃO, Elsa Peralta sugere a criação de uma comissão independente para iluminar as trevas da Academia, idêntica à que tratou dos casos de pedofilia na Igreja Católica. “Caso contrário, é a mesma coisa do que pôr os padres a investigar o que lá se passa.”
Artigo publicado originalmente na VISÃO em abril de 2023.
De 27 de novembro a 14 de dezembro, a Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA) acolhe a exposição da 3ª edição do The Sovereign Portuguese Art Prize, prémio anual organizado pela Sovereign Art Foundation (SAF), que ajuda crianças desfavorecidas ou em situações de risco usando as artes como forma de reabilitação, educação e terapia.
Em mostra estarão as obras de 33 finalistas, que concorrem por um prémio de 25 mil euros, atribuído a 7 de dezembro por um painel internacional de jurados.
Entre eles contam-se os nomes de Tim Marlow, diretor executivo do Design Museum, em Londres, David Elliot, escritor, curador e diretor de museus de arte moderna e contemporânea; Philippe Vergne, diretor do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Vicente Todolí, diretor artístico da Fundação Pirelli HangarBicocca, em Milão, Maura Marvão, diretora da Philips em Portugal e Espanha, João Paulo Queiroz, presidente da direção da SNBA, e Cassio Markowski, artista e vencedor do Sovereign Portuguese Art Prize 2023.
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Uma vez que, além de angariar fundos, o prémio quer mostrar o que de melhor se faz em Portugal e ainda não é conhecido lá fora, as candidaturas não são espontâneas. Aceitam-se artistas portugueses, quer vivam ou não em Portugal, e artistas de outras nacionalidades, desde que vivam e trabalhem em Portugal, mas todos eles são sugeridos por um grupo de “nomeadores” – diretores de museus, curadores, críticos e especialistas em arte – que apontam 200 concorrentes, depois reduzidos a 33 finalistas.
Entre os finalistas de 2024 contam-se nomes como Luísa Jacinto, Francisco Trêpa, Maja Escher, Tomek Sadurski, Maria Luísa Capela, Waisted Rita e José Pedro Cortes.
Projeto de responsabilidade social em Estremoz
Criado em 2003 por Howard Bilton, presidente da consultora Sovereign Group, o prémio surgiu como um veículo de angariação de fundos, usados para ajudar crianças desfavorecidas. “Poderia fazê-lo sem organizar um prémio de arte, é claro, mas desta forma consigo também ajudar os artistas”, explica Bilton.
Essa primeira edição começou em Hong Kong, onde Howard vivia, chegou a África há cinco anos, após uma parceria com a Norval Foundation, e a Portugal, há três, desde que o presidente da Sovereign Group veio viver para cá.
[Portugal] é uma escolha peculiar, porque, tendo apenas 11 milhões de habitantes, a base de colecionadores e a comunidade artística são reduzidas, mas, por isso mesmo, penso que o prémio pode fazer realmente uma grande diferença, sobretudo para os artistas
Howard bilton – presidente sovereign foundation
“Naturalmente, queria fazer a diferença e um bom trabalho na minha nova casa”, conta, admitindo que o nosso país “é uma escolha peculiar, porque, tendo apenas 11 milhões de habitantes, a base de colecionadores e a comunidade artística são reduzidas”. Mas, precisamente por isso, Howard pensou “que o prémio poderia fazer realmente uma grande diferença, sobretudo para os artistas”.
A fórmula é simples. Das 33 obras finalistas, exceto a vencedora, que passará a integrar a coleção da SNBA, 22 serão vendidas na exposição e 10 leiloadas pela leiloeira Phillips num jantar de gala, dia 7 de dezembro, no Palácio da Bacalhôa, ao qual podem aceder todos os que comprarem bilhete, enviando um e-mail à fundação.
“Tanto no caso das obras leiloadas como no caso das vendidas, os artistas recebem 50% da venda, a mesma percentagem a que teriam direito numa galeria, e os restantes 50% revertem para projetos sociais que estamos a implementar em Portugal”, sublinha o presidente.
Os projetos em questão, implementados há dois anos em Estremoz, prendem-se com a utilização da arte como forma de terapia e reabilitação para crianças em circunstâncias muito complicadas, seja porque têm problemas mentais, dificuldades de aprendizagem ou que são abusadas física ou psicologicamente. “É uma ferramenta muito poderosa que podemos usar para ajudá-las a regressar ao sistema de educação convencional”.
Apesar de, pessoalmente, ser um grande colecionador de arte, Howard Bilton sublinha que a Fundação não compra obras aos artistas, pois usa todo o dinheiro angariado para investir nos programas artísticos na comunidade.
Este ano, além das obras a concurso, Jorge Queiroz, vencedor do primeiro Sovereign Portuguese Art Prize, ofereceu uma edição limitada de impressões da obra com que ganhou o prémio, as quais serão vendidas a 3800 euros cada e cujo valor reverterá na totalidade para os projetos da Fundação em Estremoz.
No último dia da exposição será também revelado o vencedor Prémio do Voto do Público, no valor de dois mil euros, escolhido através de uma votação online, já a decorrer, e dos votos presenciais daqueles que passarem pela SNBA nos próximos dias.
The 2024 Sovereign Portuguese Art Prize > Sociedade Nacional de Belas Artes, R. Barata Salgueiro, 36, Lisboa > T. 21 313 8510 > 27 nov-16 dez, seg-sex 12h-19h, sáb 14h-19h > grátis
“Em termos do crescimento médio da despesa líquida, Portugal respeitou a trajetória de referência que foi fornecida a Portugal, de aumento médio anual de 4,5%, e, portanto, em geral, [o plano] está em conformidade com os requisitos” com as novas regras orçamentais da União Europeia, disse Valdis Dombrovskis, vice-presidente executivo da Comissão Europeia, à agência Lusa.
A avaliação ao primeiro plano orçamental português a médio prazo, enviado por Lisboa a Bruxelas em outubro, foi apresentado à margem da sessão plenária do Parlamento Europeu, que decorreu hoje em Estrasburgo. “Ao longo do período de vigência do plano [2025-2028], o orçamento de Portugal deverá manter um excedente, o que constitui certamente uma indicação de uma situação orçamental sólida e, correspondentemente, o rácio da dívida em relação ao PIB deverá diminuir bastante”, salientou Dombrovskis.
O Executivo português refere, no documento, que os compromissos orçamentais de Portugal representam, em média, um crescimento das despesas líquidas igual ou inferior a 3,6% no período de 2025 a 2028 – o que coincide com a trajetória de referência transmitida pela Comissão Europeia. O Governo estima ainda no plano um crescimento económico na ordem dos 2,1% em 2025, de 2,2% em 2026, de 1,7% em 2027 e 1,8% em 2028.
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É ainda projetada, na trajetória orçamental a quatro anos, uma queda de cerca de 12,7 pontos percentuais na dívida pública, que desce para os 83,2% do Produto Interno Bruto em 2028 – ou seja, uma redução média de 3,2 pontos percentuais por ano.
A Comissão Europeia já tinha antecipado, nas previsões económicas publicadas na semana passada, o crescimento económico de Portugal de 1,7% este ano e 1,9% em 2025. Percentagens abaixo dos 1,8% e 2,1% estimados pelo Governo. Foi ainda projetada uma dívida pública de cerca de 95,7% do PIB em 2024 e que deverá baixar para os 92,9% do PIB em 2025 e 90,5% em 2026.
Boaventura de Sousa Santos, fundador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES), demitiu-se esta terça-feira acusando a direção de o querer “expulsar” e de “promover o [seu] linchamento”. O académico diz ainda que a direção o quer condenar “antes que os tribunais se pronunciem” sobre os alegados casos de assédio sexual em que está envolvido. A notícia foi avançada hoje pelo Diário de Notícias, que cita um email enviado pelo sociólogo aos membros do CES.
“Já não confio que possa haver no CES qualquer tipo de julgamento imparcial e não tenho quaisquer dúvidas de que o objectivo da direção do CES é (e sempre foi) expulsar-me. Não tenho dúvidas de que a direção do CES age de modo parcial, com total violação das regras do direito democrático (presunção de inocência), politicamente motivada, devido às disputas internas na instituição, e quer condenar-me publicamente, antes que os Tribunais se pronunciem sobre os casos que estão a ser tramitados”, lê-se.
O sociólogo refere ter ficado a conhecer do desfecho do processo de averiguações interno da instituição contra si e afirma que vai divulgar publicamente “todos os documentos que sustentam a minha versão dos factos” e que “um dia a verdade fale mais alto”.
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Os alegados casos de assédio sexual foram tornados públicos no ano passado após três investigadoras do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra o acusarem de abuso no livro “Má conduta sexual na Academia – Para uma Ética de Cuidado na Universidade“. A publicação levou à suspensão de Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins dos cargos que ocupavam no CES, em abril de 2023.
Meses depois, a direção do Centro anunciou a criação de uma comissão independente para investigar as denúncias, tendo divulgado um relatório, a 13 de março deste ano, em que confirmou a existência de padrões de conduta de abuso de poder e situações de assédio. Foram realizadas 78 denúncias totais – por 32 denunciantes – e denunciadas 14 pessoas.
Boaventura de Sousa Santos anunciou ainda um novo processo nos tribunais contra o “coletivo de vítimas”.
Mehmet Oz junta-se a nomes como Robert F. Kennedy Jr., Elon Musk e Tom Homan, anunciados por Donald Trump, para integrarem a sua administração a partir de janeiro do próximo ano. O vencedor das eleições norte-americanas tem vindo a anunciar as diversas pessoas – e respetivos cargos – que irão chefiar os diferentes departamentos dos EUA durante o seu segundo mandato, e as suas escolhas têm gerado alguma surpresa.
Uma vez confirmada a sua nomeação pelo senado, Oz ficará responsável pelos Centros de Serviços Medicare e Medicaid (Centers for Medicare and Medicaid Services), seguros de saúde que possibilitam o acesso a cuidados médicos a milhões de norte-americanos idosos ou com baixos rendimentos. Os Estados Unidos não possuem um Sistema Nacional de Saúde, pelo que é necessário ter seguro de saúde de forma a ter acesso a cuidados médicos e hospitalares. “O Dr. Oz será líder no incentivo à prevenção de doenças, pelo que obteremos os melhores resultados do mundo por cada dólar gasto em cuidados de saúde no nosso grande país”, defendeu Trump, na rede social Truth Social.
O Medicaid é um seguro de saúde federal destinado a pessoas com mais de 65 anos ou com deficiência. Já o Medicaid possibilita que pessoas com baixos rendimentos tenham acesso a cuidados de saúde, e é financiado pelo governo norte-americano, em conjunto com os estados. Estes programas estão associados ao Affordable Care Act – lançado durante a administração Obama – que permite que milhões de norte-americanos tenham planos de seguro de saúde, mesmo que não se qualifiquem para um seguro de saúde.
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Ao liderar a agência de programas de seguros, Mehmet Oz vai trabalhar em conjunto com Robert F. Kennedy Jr., nomeado para a chefia do departamento da saúde. “Ele é um médico eminente, cirurgião cardíaco, inventor e comunicador de classe mundial, que tem estado na vanguarda da vida saudável durante décadas”, explicou Karoline Leavitt, porta-voz republicana, no comunicado que anunciou a sua nomeação.
Apelidado como o “médico da América”, Mehmet Oz é um cirurgião cardiovascular que se tornou conhecido pelo público norte-americano por dar conselhos médicos nos programas de televisão The Oprah Winfrey Show (em 2004) e, mais tarde, no seu próprio programa The Dr. Oz Show, com início em 2009 e término em 2022. Apesar do sucesso televisivo – que lhe valeu 13 temporadas de programa – Oz, de 64 anos, não deixou de praticar medicina, tendo realizado cirurgias até 2018 e a sua licença permanece, até hoje, ativa no estado da Pensilvânia, segundo a Associated Press.
Oz é ainda autor de bestsellers do New York Times, apresentador de um programa de rádio, fundador de uma organização nacional sem fins lucrativos e vencedor de nove prémios Emmy para o seu programa diurno. No mesmo ano em que se despediu do mundo televisivo, Oz foi homenageado por uma estrela no passeio da fama em Hollywood, de forma a assinalar o fim do seu programa. Nascido no estado do Ohio, nos Estados Unidos, Oz é também filho de um pai turco, e chegou a integrar o exército turco de forma a manter a dupla nacionalidade.
Em 2022, o profissional de saúde, formado em Harvard, foi o candidato republicano, pelo círculo eleitoral da Pensilvânia, ao Senado dos Estados Unidos. Uma tentativa que, apesar de falhada, contou com o apoio de Donald Trump, que já tinha aparecido, em 2016, no seu programa televisivo, antes do seu primeiro mandato presidencial.
No decorrer da sua carreira televisiva, o cirurgião esteve no centro de diversas polémicas, alimentadas pelos seus conselhos de saúde e por promover produtos médicos sem evidências científicas. Um estudo de 2014, publicado na revista BJM, analisou as recomendações médicas dadas por Oz no seu programa e concluiu que cerca de metade dos seus conselhos não estavam ancorados em descobertas médicas.
Em 2012, por exemplo, Oz abordou no seu programa os benefícios de uma dieta à base de comprimidos de grãos de café verdes, defendendo que seriam “a cura mágica para a perda de peso”. “Pode pensar que a magia é um faz-de-conta, mas existem cientistas que dizem que este pequeno feijão é a cura mágica para a perda de peso para todos os tipos de corpo. … Este comprimido milagroso pode queimar gordura rapidamente”, disse num episódio emitido nesse ano.
Já em 2014, Oz recorreu ao congresso norte-americano, queixando-se que várias pessoas estavam a utilizar o seu nome para vender produtos de perda de peso. Mas o Senado considerou que a estrela de televisão fazia “parte do problema”, evocando o episódio das dietas de grãos de café verdes. “Quando apresenta um produto no seu programa, cria o que se tornou conhecido como o ‘Efeito Dr. Oz’ – aumentando drasticamente as vendas e levando os burlões a aparecerem da noite para o dia, utilizando anúncios falsos e enganadores para vender produtos questionáveis”, disse a senadora Claire McCaskill, numa audiência do Senado.
Em resposta, Oz disse acreditar “pessoalmente nos assuntos de que falo no programa” e reconheceu que “muitas vezes, eles não têm o peso científico necessário para serem apresentados como factos”. “A medicina é uma ‘guerra civil’ travada entre os médicos convencionais e aqueles que estão abertos a curas alternativas para doenças que vão desde a ansiedade ao cancro”, disse a um jornalista. Em outubro de 2014, segundo o Washington Post, todas as menções sobre os grãos de café verde foram apagadas do seu site.
Noutra polémica, em 2020, durante a pandemia de Covid-19, o médico afirmou que os responsáveis do governo deviam tomar hidroxicloroquina – um fármaco usado, na prevenção e tratamento de malária – apesar de não existirem provas sobre a sua segurança e eficácia contra o vírus. Donald Trump, na altura, declarou mesmo ter tomado o medicamento. Afirmações que levaram a agência norte-americana responsável pelos medicamentos a revogar a autorização de utilização de emergência da hidroxicloroquina.
Para além dos grãos de café, Oz promoveu no seu programa uma série de suplementos com, alegadamente, benefícios para a saúde que foram desmentidos pelas autoridades norte-americanas. Por exemplo, em 2012, afirmou que o selénio – um mineral com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias – seria eficaz na prevenção do cancro, uma associação que nunca foi comprovada cientificamente. Já noutro episódio o médico alegou que colocar uma barra de sabão de lavanda na cama, por debaixo dos lençóis, poderia ajudar a aliviar as dores nas pernas.
Oz esteve ainda no centro de polémica após defender que algumas das marcas de sumo de maçã tinham arsénico na composição. Um episódio dedicado à reconversão de pessoas homossexuais esteve também no centro de intensa contestação.
Luís Montenegro afirmou, esta terça-feira, que Portugal é um dos países mais seguros do mundo. “É preciso dizer às portuguesas e aos portugueses que nós temos razões para confiar nas nossas polícias, nós temos razões para confiar nos nossos serviços públicos e nós temos razões para dizer alto e bom som que somos um país seguro, um dos mais seguros do mundo”, disse.
Apesar disso, o chefe do Governo admitiu preocupação com problemas como delinquência juvenil ou a criminalidade grupal, devendo-se apostar no combate à corrupção ou o tráfico de drogas internacional e interno. “Mas também não deixemos de dizer que um dos maiores fatores de competitividade que o país tem é ser seguro, e é seguro porque temos pessoas e instituições habilitadas, qualificadas, para poder garantir essa segurança”, disse.
“Cabe-nos a todos, com os instrumentos que temos, garantir que continuamos a ser um país seguro e um país que tem, nos seus valores, a salvaguarda da dignidade da pessoa, a salvaguarda dos direitos das mulheres e dos homens que vivem, trabalham ou passam por cá”, disse.
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Luís Montenegro falava durante a tomada de posse do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Orlando Carvalho, e do diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, que decorreu no Ministério da Justiça, em Lisboa. O líder elogiou os recém-empossados, “ambos personalidades com provas dadas e com a ambição de fazer mais e melhor ainda no futuro”.