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Uma pequena trovoada de verão ribombou por cima do Governo sem que, até ver, algum raio tenha rachado a cabeça do primeiro-ministro ou a do ministro da Economia. Um vice-presidente da bancada do PSD, Carlos Abreu Amorim, desancou, via Facebook, a envergonhada hipótese governamental de ir para a frente com o… TGV. Um tema ao qual o PS, se não estivesse tão adormecido, devia ser mais sensível. Abreu Amorim, porém, estava bem acordado quando, espetando o dedo, bradou, como num conhecido sketch dos Gato Fedorento: “Ah, malvados!” E denunciou a escondida, dissimulada, arrependida intenção governamental, de vamos lá, não descartar completamente o TGV, um assunto dependente de uma decisão final, etc. Uma decisão final?! Mas a decisão não estava mais do que tomada quando Passos Coelho, o PSD, o CDS, atiravam o TGV – e “as grandes obras”, como lhes chamavam – para a santa fogueira da inquisição da dívida pública? O ministro (perdão, o Álvaro) foi a Espanha. Anunciou-se que desistiria da linha de TGV Lisboa-Madrid. Chegou lá, bebeu uma canha, aplaudiu umas sevilhanas, leu uns acordos bilaterais, ouviu umas ameaças e, mais ponderado, veio dizer que enfim, talvez, ainda vamos ver e – como diria o outro – é fazer a conta. Eu digo-vos o que se passou: o ministro ouviu uma exigência espanhola a que terá de ceder. E, para não perder a face, veio empatar.
Os partidos do Governo foram demasiado perentórios na oposição. Ah, mas se os fundos comunitários não forem aplicados no TGV, o País perde o direito a eles. E não perdia antes? E o défice? E a dívida? E o endividamento das gerações futuras? E é agora, depois de terem apelidado Sócrates de irresponsável para cima, de o acusarem de, por estas e por outras, ter enviado o País para a bancarrota, e de, com estes e outros argumentos, terem ganho as eleições, é agora que chegam lá e fazem, pela calada da noite – e da silly season – exatamente o mesmo? O adiamento do TGV era uma bandeira. Uma medida emblemática. Um cavalo de batalha eleitoral. A sua iminente reabilitação prova a ligeireza com que PSD e CDS abordaram a questão, a facilidade demagógica com que atacaram o anterior governo, o desconhecimento dos dossiês, e os truques com que convenceram um eleitorado tremelicante.
Já defendi, nestas linhas, que o TGV devia ter sido um desígnio do cavaquismo, quando, em pleno período de vacas gordas, se apostou tudo nas autoestradas. A ligação de alta velocidade à Europa era estratégica, e só a tacanhez de alguns governantes e o erro histórico do ministro Ferreira do Amaral – e dos que lhe sucederam, nos governos de Guterres – não viram isso. A teimosia de Sócrates chegou tarde de mais. O País deixou de dispor de recursos e os argumentos de PSD e CDS, ainda na pele do dr. Jeckyl, eram razoáveis. Mas eis que chegam ao Governo, e vestem o fato de mr. Hide.
Pior ainda é se o Governo titubear. Se admitir a hipótese, mas a gemer, batendo no peito, arrancando os cabelos. “As circunstâncias…” As circunstâncias não interessam. Se o Governo acha que o TGV é bom, faça-se. Se não, anule-se. Na primeira hipótese, porém, o primeiro-ministro deve passar uma manhã inteira, virado para o quadro negro, onde deverá escrever cem vezes: “Na próxima campanha, não enganarei os eleitores.”
E arranjar um para-raios.