Há dez anos, na coluna que então tinha no Diário de Notícias, analisei a guerra em Gaza através de três ângulos (três D) que me pareciam inevitáveis, perante a opção israelita de não ocupar o território. Tal como agora, era Netanyahu o primeiro-ministro. Israel acreditava ter forçado a desmilitarização de Gaza por um longo período de segurança a sul, tal como o que se seguiu a norte desde o final da segunda guerra no Líbano (2006). O objetivo seria juntar ao primeiro D (destruição dos túneis) um outro: a desmilitarização de Gaza. Uma prolongada ocupação teria enormes riscos militares, civis e políticos, e o vulcão islamista que rodeava Israel não aconselhava esse tipo de aventuras.
Para desmilitarizar Gaza e assegurar que a intervenção não fosse a última antes da próxima, seria preciso fazer um intenso trabalho diplomático para aproveitar a convergência entre a frente anti-Hamas (Egito, Jordânia, Arábia Saudita), os EUA, a UE e as Nações Unidas. Israel tinha boas relações com a Rússia e a China para aprovar no Conselho de Segurança uma força de “manutenção da paz” em Gaza, com financiamento e meios suficientes para esvaziar militarmente o Hamas, as Qassam, a Jihad Islâmica e reconstruir a Faixa. Essa visão estratégica que Telavive e outros poderiam ter empregado aos territórios palestinianos carecia ainda de um terceiro D: devolver Gaza à Autoridade Palestiniana. Dar-lhe meios para pagar salários, administrar escolas, hospitais, polícia, esvaziando politicamente os grupos que só têm feito mal à região. Para concretizar tudo isso, Israel precisava, em paralelo, de fazer concessões na Cisjordânia. Infelizmente, escrevi então, “temo que nada disto esteja em cima da mesa”. E assim foi.