Na parte final de Engenheiros do Caos, sobre a ascensão do populismo digital, encontramo-nos num centro de resgate para gatos, cuja comunidade de gatos pretos disparou nos últimos tempos. O dono não sabia a razão, até que alguém tem uma explicação: as pessoas não querem gatos pretos porque parecem manchas em selfies, ao contrário dos brancos ou de outros de tons claros. Nesta ditadura da imagem e do narcisismo, impaciência e crueldade, a sociedade vai mudando de valores a um ritmo alucinante, num ato paralelo às alterações da própria democracia representativa.
O autor, Giuliano da Empoli, centra-se precisamente nalguns obscuros fazedores de realidades paralelas, agitadores de narcisismos e novos hábitos de consumo eleitoral, destrutivos dos mecanismos políticos tradicionais e que agiram na sombra de figuras como Beppe Grillo, Donald Trump, Boris Johnson, Jair Bolsonaro ou Viktor Orbán, como foram os casos de Gianroberto Casaleggio, editor do blogue do fundador do Movimento 5 Estrelas, de Dominic Cummings, diretor da campanha do Brexit, de Steve Bannon, que ajudou Trump a chegar à Casa Branca, ou de Arthur Finkelstein, que auxiliou o primeiro-ministro húngaro, depois de décadas a espalhar os seus métodos subversivos na política norte-americana ou israelita. O corolário desta rede de experimentalismos carnavalescos tem tido resultados surpreendentes para muitos observadores e efeitos perversos, difíceis de reverter, para milhões de cidadãos.