“O ano letivo arranca já com nuvens negras no horizonte: falta de professores, problemas na colocação, contestação que não cede e greves anunciadas”, diz Mafalda Anjos a propósito da educação, o primeiro tema em análise no Olho Vivo, o programa de comentário político e económico da VISÃO. Para a diretora da revista, “os problemas vão para lá das reivindicações dos sindicatos, que não têm feito quaisquer cedências – trata-se sobretudo do problema grave da falta de atratividade da profissão. Faltam, até 2030, mais 30 mil professores e não virão só pelo dinheiro”.
Um mal geral. “A situação é preocupante em relação à falta de professores”, considerou Rui Tavares Guedes, diretor-executivo da VISÃO, lembrando que o problema é global e afeta muitos outros países, mesmo aqueles, como a Alemanha, onde os docentes têm os salários mais elevados. “Há falta de vocação e, em Portugal, os conflitos constantes entre sindicatos e governo não contribuem para o resolver”, disse. “O foco está sempre centrado nas dificuldades da vida de professor e não naquilo que ela tem de melhor e que merece ser valorizada”.
Na opinião de Rui Tavares Guedes, o problema da falta de professores têm de ser encarado com um discurso de esperança e com soluções preocupadas com o futuro e não apenas centrado na resolução dos casos difíceis do passado. “Como o problema é transversal a toda a Europa, exigiria, porventura, a criação de um PRR para a educação, destinado a valorizar a profissão de docente e, dessa forma, angariar novos profissionais”.
Tiago Freire, diretor da Exame, sublinha que a problemática está desfocada. “Temos a discussão centrada nos professores e sobretudo em questões como a reposição do tempo de serviço, mas isso é muito redutor. É importante para os professores mas mesmo que isso resolva esse seu problema é uma ínfima parte dos problemas das escolas e do ensino público. Há muita coisa que é preciso mudar, nomeadamente a forma como se ensina – que está igual há décadas – e isso é que é preciso discutir. Mesmo que se reponha o tempo de serviço dos professores, os problemas das escolas continuariam todos lá”, afirma.
Um BCE numa encruzilhada
“Tradicionalmente dividem-se os membros do BCE entre falcões e pombas, mas agora eles parecem é galinhas sem cabeça, a correrem muito depressa mas sem saberem para onde ir. Acho que eles não sabem o que estão a fazer e o que poderá funcionar”, compara Tiago Freire. “Com esta subida das taxas de juro, o BCE está a seguir uma receita clássica e tradicional para resolver um problema num mundo muito diferente e mais complexo do que até aqui. Pede-se mais criatividade nas soluções, que até aqui passam pela fórmula simples de subir juros para deprimir a atividade económica, tentando assim fazer reduzir a inflação. É limitado”, argumenta.
“O BCE está numa encruzilhada. E tem de começar agora a ponderar se o doente pode morrer da doença ou da cura. O órgão não tem mandato para zelar pelo crescimento económico, e apenas para tomar conta da inflação. E está, apesar de ser colegial, bastante preocupado com a situação na Alemanha, a maior economia europeia, que tem o trauma da hiperinflação vivida no período entre-guerras. Controlá-la a todo o custo é sempre a prioridade”, sublinha Mafalda Anjos.
Rui Tavares Guedes também teme que as medidas do BCE levem a Europa a “morrer da cura”. Até porque, na sua opinião, o BCE está a adotar os mesmo remédios da crise financeira de 2008, mas esquece-se que o mundo agora está diferente: “A China está com dificuldades de crescimento, os EUA também não estão livres ainda de uma recessão e, por outro lado, há uma série de outros protagonistas em busca de espaço no plano internacional”, lembrou. “Os países do Golfo Pérsico, por exemplo, assentes na economia do petróleo, estão a encher os seus cofres graças à inflação. Por isso, não estão nada interessados com a inflação na Europa. Para eles, esta é até uma oportunidade para ganharem importância e influência”, sublinhou.
Para Rui Tavares Guedes, o mais preocupante é a falta de competitividade que se começa a manifestar na Europa, dando o exemplo da indústria automóvel alemã, cuja transição para os motores elétricos está muito atrasada em relação à China – que já inunda o continente europeu com automóveis elétricos de qualidade semelhantes aqueles que a Alemanha só prevê ter disponíveis lá para 2026 ou 2027. “A Europa consegue andar à frente nas ideias e nos regulamentos, mas começa a falhar na execução. A Europa até consegue impor à Apple um cabo universal para os iPhone, mas depois deixa-se ultrapassar por chineses e americanos quando se trata de acelerar a indústria”, considerou.
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