Quando falta cerca de uma semana para a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão da TAP votar as conclusões finais, a proposta de relatório, do cunho da deputada socialista Ana Paula Bernardo, não se livra de fortes críticas de toda a oposição – ora, porque não apontará falhas à atuação de ex-governantes, como Pedro Nuno Santos, que se demitiu no final do último mês de dezembro devido ao caso de Alexandra Reis; ora, porque deixou de fora o incidente no gabinete do ministro das Infraestruturas, João Galamba, a 26 de abril, envolvendo as secretas.
De acordo com Filipe Luís, editor executivo da revista VISÃO, “Isto não é um relatório, é um ditado. Isto é, se o texto do relatório tivesse sido ditado pelos responsáveis de comunicação do Governo, ou pelo próprio António Costa, não seria muito diferente…“. “Independentemente do teor do relatório, fica a perceção pública. Tudo o que foi sendo revelado, tudo o que os portugueses foram sabendo – e que não está nas conclusões do relatório preliminar – já não pode ser apagado”, considerou, no Olho Vivo, podcast de análise política e económica.
Mais, Filipe Luís considerou que “há falhas, não apenas de omissão, mas factuais, neste relatório. Escreve-se nele que não houve interferência política na gestão da TAP. Ora, ficou demonstrado que houve diversas interferências. E que a tutela não acompanhou a par e passo o processo de saída e indemnização de Alexandra Reis, da TAP. Ora, ficou demonstrado que, pelo menos o secretário de Estado das Infraestruturas acompanhou tudo a par e passo”. “O relatório critica o processo de privatização – e é criticável – mas não se interroga sobre o processo de renacionalização, com os 55 milhões pagos a David Neeleman e que, a me ver, e na perceção de muitos dos deputados da CPI, não estão cabalmente explicados”, admitiu.
Aliás, questionou: “Se, de facto, os governantes que se demitiram fizeram tudo bem, como conclui o relatório, por que razão se demitiram? Que motivos tinham para tirar quaisquer consequências políticas? Ora, foram eles próprios, na CPI que, apesar de tudo, reconheceram falhas e explicaram porque se demitiram! Isso não vem refletido no relatório. Mais vale Pedro Nuno Santos, perante isto, pedir para ser reintegrado no Governo…“.
Para Nuno Aguiar, jornalista da revista Exame e também da VISÃO, “Qualquer ideia de credibilidade ficou ferida desde a constituição da comissão de inquérito e pela maneira como foi conduzida. E o relatório até é um reflexo adequado do que a CPI foI”. “Ela não tinha motivo material com dignidade para existir e encontrou poucas coisas materialmente relevantes para aquilo que estava a apurar”, defende, frisando que “o caso de Alexandra Reis é político”, envolvendo “um governante que julgou mal a aprovação de uma indemnização e que se demitiu por causa disso”.
“O relatório da CPI é partidarizado como toda a CPI foi um exercício de partidarização do tema. Os partidos fazem leituras políticas diferentes dos vários acontecimentos e este relatório é mais um reflexo disso”, acrescenta Nuno Aguiar. “Os deputados usavam o seu tempo na CPI para aumentar a pressão sobre o Governo e, nesse capítulo, foram eficazes. O Governo foi muito pressionado, nalguns casos devido a erros que cometeu”, conclui Nuno Aguiar.
Já Nuno Miguel Ropio, jornalista da VISÃO, referenciou que “António Costa disse que tiraria as conclusões politicas do relatório da CPI. Mas agora percebemos o que queria dizer: na verdade não haveria nada para tirar com consequência, perante o facto deste relatório não achar estranha a saída de Alexandra Reis, caso que deu origem à CPI”.
“Houve um ministro da tutela que se demitiu, com o seu secretário de Estado, por causa deste caso, assumindo que agira mal e e até alguma imprudência na liderança do seu próprio gabinete. Mas agora, a deputada do PS Ana Paula Bernardo, veio fazer tábua rasa disto”, disse, ao salientar que o mesmo aconteceu com o que aconteceu no Ministério das Infraestruturas, envolvendo as secretas, que também não consta no relatório apesar de o PS ter votado a favor das audições “que transformaram a CPI naquele festival infeliz”. “Não foi só esta CPI que acabou ferida, foi mesmo o ato democrático de fiscalização por parte do Parlamento”, acrescentou Nuno Miguel Ropio.
Declarações polémicas de Lagarde
Outra polémica na mira do Olho Vivo foi a declaração de Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE), que, na sua passagem por Sintra, avisou que se os europeus continuarem a exigir aumentos salariais, e a obtê-los, para fazer face aos custos de vida, a entidade que lidera não parará de aumentar os juros.
Filipe Luís tresleu naquelas palavras que “o BCE está a aplicar o que resulta dos tratados europeus. No limite, a decisão é sempre política”. “Se os governos forem sinceros nas suas críticas ao aumento das taxas de juros, que se reúnam e mudem os tratados – e assumam as respetivas consequências…”, disse, ao lembrar que o primeiro-ministro português, que agora veio criticar Lagarde, tinha a mesma perspectiva há cerca de um ano.
“António Costa, há um ano, dizia que aumentar os salários era uma ilusão e que iria provocar uma espiral inflacionista. Agora, parece que não. O que o levou a mudar de opinião? Há muita hipocrisia em toda esta discussão sobre o aumento dos juros”, relembrou.
Segundo Nuno Miguel Ropio, mais do que “perder o comboio da realidade” Lagarde volta a produzir declarações tão infelizes como aquelas, quando era presidente do Fundo Monetário Internacional, e foi a uma Grécia em crise para dizer que “a dívida dos gregos se devia ao facto de andarem muito na farra”.
“É estranho que além do poder de controlar as vidas dos europeus, a presidente do BCE condicione de sobremaneira a gestão dos governos do Estados membros, com essa grande arma que são as subidas de juros”, disse, admitindo ser necessário que o Conselho Europeu mostre que tem mão neste problema.
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