Parece um “castelo de cartas a desmoronar”. Em nove meses este Governo já viu dez demissões, incluindo as de dois ministros pesos pesados – e, para Mafalda Anjos, “isto é um ritmo inaudito e insustentável”. “Está de vez desfeita a ideia de que uma maioria absoluta traz estabilidade, e a oposição começa a bater na tecla da ‘trapalhada’, fazendo lembrar outros casos e casinhos – os dos velhos tempos de Santana Lopes, que determinaram a dissolução da Assembleia”, diz a diretora da VISÃO. “São situações muito diferentes, com legitimidades democráticas diferentes, mas a ideia começa a pairar no ar: e se?… E se continuar tudo assim? É suposto o país habituar-se a isto?”, questiona.
No entanto, falar-se uma dissolução é uma fantasia. Para Filipe Luís, “o simples facto de se recordarem os casos de Santana Lopes e de se pôr a hipótese de uma dissolução da Assembleia da República é muito significativo do estado a que chegou o Governo”. “É verdade que há pontos comuns com os tempos de Santana: a sucessão de trapalhadas e de casos, incluindo no círculo político mais restrito do primeiro-ministro, por exemplo. Só que, no tempo de Santana, não estavam em causa arguidos – como Miguel Aves – nem a gestão de dinheiros públicos, como a indemnização de Alexandra Reis…” E continua: “No tempo de Santana, também havia uma maioria absoluta, embora de coligação, a apoiar o Governo. Mas há duas diferenças fundamentais: Santana não estava pessoalmente legitimado pelo voto e Costa tem uma legitimidade fortíssima. Por outro lado, Sampaio dispunha de uma alternativa forte, na oposição. Hoje, segundo todos os estudos de opinião, Marcelo não pode contar com isso”.
“Pedro Nuno Santos cai por culpa própria. Mas, com a sua saída, perde o Governo e perde o próprio”, aponta o jornalista Nuno Aguiar. “Quatro anos é muito tempo para ficar afastado dos holofotes, idealmente sairia mais tarde para preparar a sua sucessão a António Costa. Para o Governo, significa ficar mais pobre. Pedro Nuno era um dos poucos ministros com força política, capaz de mobilizar e capturar a agenda mediática. O único outro governante com força é Fernando Medina, que ainda está a recuperar de uma derrota eleitoral inesperada.”
“O Governo fica ainda mais dependente da figura de António Costa. Se antes já se revelava difícil recrutar. Onde estão nomes com força política? As experiências com independentes não estão a correr muito bem, ativos como Alexandra Leitão estão a comentar na televisão. Estes podem ser quatro anos penosos”, antecipa Nuno Aguiar.
Agora o tempo surtirá os seus efeitos. “E Pedro Nuno Santos vai andar por aí, com potencial para causar grande mossa. Ressentido, acossado e pronto a fazer o seu caminho, vai juntar-se a Alexandra Leitão e Pedro Siza Vieira, um trio de críticos internos que não vão fazer a vida fácil a António Costa”, sublinha Mafalda Anjos. Para a diretora da VISÃO, uma coisa é essencial: “António Costa tem de recentrar-se, corrigir os erros, emendar a mão. Tem de fazer um ‘CTRL + ALT + DELETE’, meter ordem na casa e recomeçar”.
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