A proposta do Livre que, entre outras coisas, prevê o fecho da Avenida da Liberdade aos domingos e feriados e a redução do limite de velocidade em 10 quilómetros por hora em várias artérias da cidade esteve em análise esta semana no arranque do Olho Vivo, o programa de comentário político e económico da VISÃO. Ficou decidida a realização de estudos técnicos e de uma consulta pública, mas pelo caminho esgrimiram-se argumentos que dão que pensar: será que fechar a Avenida da Liberdade aos domingos e feriados vai gerar uma vaga de centenas de despedimentos, como alegou Carlos Moedas? E reduzir a velocidade nas cidades não é desejável? Ou, como afirmou Álvaro de Covões, “ninguém vai a Louis Vuitton de metro?”
Apesar de se estar a fazer do tema uma guerra cultural e ideológica, este é o caminho do futuro, defende Mafalda Anjos. “É claro que as cidades têm de ser pensadas para as pessoas, mas este é o caminho que está a ser feito nas grandes cidades da Europa e que vai ter, mais tarde ou mais cedo, de acontecer por cá. Estamos a tentar parar o vento com as mãos. Medidas deste tipo serão inevitáveis. Isto é como deixar de fumar, custa no início mas depois percebemos que nos faz bem.”
Porém, o caminho tem de ser avaliado e ponderado. A proposta do Livre para limitar em 10km/h a velocidade máxima em Lisboa e encerrar a Avenida da Liberdade todos os domingos não vinha acompanhada de um estudo, pelo que não sabemos o que impacto terá na poluição e no comércio, tirando teorias e exemplos internacionais. “O que sabemos é que os comerciantes tendem a opor-se a estas medidas, mesmo quando acabam por ser beneficiados por elas”, nota o jornalista Nuno Aguiar. “Um ponto que o presidente da câmara tem sublinhado é que estas medidas não podem ser feitas “contra as pessoas”. É verdade que os portugueses gostam muito de utilizar o carro e os dados sugerem que são os que menos parecem dispostos a mudar as suas opções de mobilidade a favor da sustentabilidade ambiental. Estas coisas são difíceis de fazer, por isso é que é necessária liderança política para explicar e apresentar soluções e alternativas.”
Para Filipe Luís, “há leviandade de ambos os lados”. “Na proposta do Livre, de encerramento da Avenida da Liberdade ao domingo, não há qualquer estudo sobre o impacto do trânsito desviado noutras vias. E Carlos Moedas que agita o fantasma da perda de empregos no comércio, parece ignorar que ninguém vai de carro às compras à Av. da liberdade, porque ser tão difícil estacionar… As pessoas deixam o carro no parque subterrâneo do Marquês de Pombal… Pelo contrário, como os comerciantes da Rua Augusta bem sabem, a circulação de peões corresponde sempre a mais entrada de clientes, a mais negócio… e a mais emprego”, explica.
As polémicas altas patentes na reserva
Outro tema em análise no programa de comentário político e económico da VISÃO foram os “generais comentadores.” O País descobriu algumas das nossas altas patentes militares, que povoam espaços de comentários nas televisões, e percebeu o que pensam sobre o mundo a propósito da guerra na Ucrânia.
“Muitos evidenciam, nos comentários de estratégia militar, um notório alinhamento pelas posições do Kremlin, outros defendem a rendição da Ucrânia, muitos têm interpretações pessoais sobre a história da região ou a estratégia a seguir que podem evidenciar – vamos colocar a coisa assim – alguma confusão de valores democráticos”, diz a diretora da VISÃO. “É legítima a questão: são, como os próprios alegam, porta-vozes de comentários ‘neutrais’ com base na doutrina militar e geoestratégica, ou serão estes generais portugueses perigosamente ‘putinistas’ e pró-Rússia?”, lança Mafalda Anjos, citando exemplos de declarações do major general Agostinho da Costa sobre “o lado certo da História” ou do major general Carlos Branco sobre “a guerra proxy entre os EUA e a Rússia”. “Olham o mundo como se estivessem parados algures no final dos anos 80 e este fosse um tabuleiro de xadrez entre dois blocos, num jogo onde não contam nem a soberania e nem a autodeterminação dos povos.”
Independentemente de possíveis motivações ideológicas, a opinião destes generais enquadra-se naquilo que se tem chamado uma corrente “realista” de análise de relações internacionais e desta guerra em específico. “Essa corrente olha para os governantes e os Estados como se fossem folhas que flutuam ao vente à mercê dos acontecimentos à sua volta, como se fossem autómatos, sem motivações ideológicas ou visões do mundo”, refere Nuno Aguiar. “Mais: passa por cima do direita dos ucranianos para decidirem o seu destino, por exemplo aproximando-se da União Europeia.”
Talvez o momento em que estas opiniões se tornam mais chocantes seja quando pedem que a Ucrânia termine a guerra, “como se não tivesse o direito a lutar por cada centímetro do seu território”. “Só os ucranianos sabem até onde e até quando querem lutar e o que, eventualmente, estão dispostos a ceder.”
“Os militares no ativo estão impedidos de fazer comentários políticos públicos. Normalmente, são os militares na reserva que expressam as opiniões da hierarquia. Ora, era muito importante que a hierarquia viesse esclarecer se concorda ou não com o discurso capitulacionista e anti NATO destes generais comentadores”, defende Filipe Luís. E continua: “O tema é delicado: Portugal é um País da UE e da NATO e está obrigado à fidelidade aos seus compromissos políticos e militares. Depois da eclosão da guerra, aliás, já foram enviados militares portugueses para a Roménia. E as chancelarias diplomáticas estrangeiras também ouvem estes comentários e enviam os seus relatórios – o que é válido para os países da Aliança e para a Rússia. O que é que as Forças Armadas portuguesas têm a dizer sobre isto? Qual e a sua posição perante a crise da Ucrânia e perante os ossos aliados?”
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