Este mês, milhares de jovens entraram no Ensino Superior. Ao consultarem as faculdades nas quais ficaram colocados, uma pergunta levanta-se: onde vou viver?
Todos os meses são batidos novos recordes de preços médios por quarto, de aumentos de rendas, de pessoas a serem obrigadas a sair do centro da cidade, de jovens obrigados a desistir de estudar, de números de alojamento local e hotéis, de felicidade com o começo de um novo ciclo de estudos que rapidamente se transforma num sabor amargo para quem sabe que não pode suportar o preço das rendas. Nos últimos dois anos, milhares de quartos foram retirados do mercado de arrendamento e revertidos para o mercado turístico. Os resultados estão bem à vista: em Lisboa, o preço médio de um quarto atinge os 450 euros, podendo chegar aos 600 ou até aos mil euros.
Paralelamente, a resposta ao nível do alojamento estudantil é totalmente insuficiente. Cerca de 40% das pessoas que estudam nas instituições de Ensino Superior em Lisboa são estudantes deslocados. Apenas 15% destes estudantes têm lugares em residências universitárias. Todos os outros 85% são empurrados para um mercado de arrendamento selvagem, no qual as pessoas são a última prioridade. Aí, os estudantes deparam-se com quartos a centenas de euros, muitos sem contrato, outros tantos sem condições de salubridade. Alguns conseguem, a custo, suportar a situação. Tantos outros são obrigados a desistir dos seus sonhos e a abdicar de estudar na faculdade. O futuro da nossa geração está em pausa. Milhares são obrigados a terminar os seus estudos, outros obrigados a viver com os pais até aos 35 anos de idade, muitos forçados a partilhar quarto e a viver sem condições.
Se é importante nunca deixar de falar deste enorme problema, é também relevante que não deixemos de apontar o dedo a quem é responsável por ele. A quem o causou, a quem o ignora, a quem continua a pôr os jovens em segundo lugar. A quem coloca o negócio acima das nossas vidas. Por um lado, ao governo cujas promessas nunca se concretizam e cujos sucessivos pacotes de medidas pecam pela flagrante insuficiência e ineficácia. Queremos as 26 mil camas agora, queremos um Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior que resolva o problema agora, queremos controlo de rendas e habitação pública. Num país em que tantos e tantas são obrigados a desistir da persecução dos seus estudos devido à crise na habitação, não investir em alojamento estudantil é compactuar com o assalto ao futuro da nossa geração. Ao mesmo tempo, também a Câmara Municipal de Lisboa fica de braços cruzados enquanto assiste ao desastre na habitação. A sua inação neste campo torna-se cúmplice do regime das rendas absurdas, da cidade disneylândia onde não há espaço para quem cá estuda e trabalha. O presidente Carlos Moedas bem o disse: a sua prioridade são os investidores. Não temos dúvidas. Quando as pessoas saíram à rua pelo seu direito à habitação, lá estava ele com os donos do alojamento local. A sua política é a da especulação: despejando famílias, dificultando o licenciamento de residências estudantis, optando por não avançar com propostas de proteção às repúblicas estudantis, não aplicando medidas de urgências para o alojamento estudantil e, ao mesmo tempo, dando todas as facilidades aos promotores imobiliários privados e aos nómadas digitais.
A especulação imobiliária e a crise na habitação não são apenas o resultado de políticas irresponsáveis, são um projeto político – que une o PS à direita – de expulsar das cidades quem cá estuda e trabalha, transformando-as em espaços de negócio. Precisamos de medidas corajosas para contrariar a situação. Por isso, ao longo dos últimos meses, o Bloco de Esquerda tem apresentado propostas que têm sido sucessivamente rejeitadas. Precisamos de avançar com a requisição de imóveis do alojamento local e de hotéis para disponibilizar quartos a preços acessíveis, de impôr tetos aos valores das rendas, de reconverter casas vazias em habitação pública, de um plano de emergência para o alojamento estudantil, de acabar com a propina de vez. Não existe neutralidade possível: ou se está com os estudantes e as suas famílias que, todos os meses, sofrem para conseguir pagar a renda, ou do lado de quem especula com as casas e nos expulsa das nossas cidades. Queremos o nosso futuro de volta. Dia 30 de setembro, estaremos na rua, a lutar pelo direito à habitação.
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