No último artigo que escrevi para esta rubrica apresentei uma análise à crise inflacionista, argumentando por uma política fiscal que equilibre a monetária para prevenir a recessão, protegendo o poder de compra e expandindo a curva da oferta.
Desde então o BCE decidiu a maior subida de taxa de juro da sua história e o Governo aprovou pacotes de apoio às famílias e às empresas para mitigar os impactos da crise. Somando 2.400 e 1.400 milhões de euros, respetivamente, as medidas do Governo são mais do dobro, em percentagem do PIB, do pacote aprovado na Alemanha.
No espaço de um mês conheceremos ainda a proposta do Orçamento do Estado. A orientação, até agora revelada pelo Ministro das Finanças, é de um humanismo responsável. A época das taxas de juro quase-zero acabou e isso implica riscos para o financiamento da República que exigem prudência para manter contas certas – não por capricho, mas porque é a melhor forma de proteger o Estado Social. Todavia, a nossa experiência desde 2015 confirma que não há contas certas contra a economia e as pessoas – pelo que será necessário também dar novos horizontes de crescimento económico e proteção social.
Estes temas foram objeto de intensa partilha de experiências na cimeira Global Progress, em Toronto, na qual participei como orador sobre economia progressista. Dela trouxe, porém, a convicção e as evidências de que podemos encontrar um forte instrumento de combate à inflação na descarbonização do nosso setor energético.
Não é por acaso que o Inflation Reduction Act dos Estados Unidos da América é marcado essencialmente por medidas de política energética – entre reembolso para adquirir bombas de calor e outros eletrodomésticos para eletrificar e melhorar a eficiência dos consumos energéticos e uma dedução fiscal de até 30% dos custos de instalação de painéis solares.
Em Portugal, também sabemos bem as oportunidades que esta transição representa. Os leilões de capacidade fotovoltaica permitiram alcançar os preços mais baixos do mundo para produção elétrica. No entanto, temos ainda bastante potencial por explorar – não só no fotovoltaico como, sobretudo, com um espaço marítimo enorme, no eólico offshore flutuante, que o Governo pretende desenvolver com um leilão de capacidade já em 2023.
Sendo um país com elevados custos energéticos e uma proporção grande da população que não consegue pagar para aquecer adequadamente a sua casa, as oportunidades de poupança deste caminho são importantes para empresas e famílias.
Se há muito que desenvolvemos este tipo de políticas, a confiança que hoje temos nelas permitem financiar o investimento e distribuir o aforro ao longo dos anos para que mais pessoas possam a elas aderir.
No sul da Austrália, que desfruta de condições climatéricas semelhantes a Portugal, estima-se que entre um terço e metade das casas tenham painéis solares nos telhados. Estas constituem não só uma almofada contra a inflação como uma fonte de rendimento e riqueza para milhões de famílias de classe média.
Para as empresas, esta prosperidade energética também é importante, permitindo captar para o nosso país indústrias intensivas em energia, desde a industria química aos centros de dados. Sines demonstra já o interesse que os investidores estrangeiros têm por essa economia.
É pois nas energias renováveis que encontramos uma boa resposta para os desafios económicos dos próximos tempos – permitindo conjugar mais crescimento e menos inflação, de forma partilhada pela nossa economia. Tudo isto sem esquecer o importante contributo que estaremos, assim, a dar para um planeta mais seguro das enormes e assustadoras transformações das alterações climáticas.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.