Confesso que ainda não compreendi, com a devida profundidade e zelo, o escândalo gerado em torno do ex-CEO do SNS, o tenente-coronel médico Gandra D’Almeida. Acumulava funções, dizem. A Assembleia da República irá investigar do ponto de vista político, e o IGAS fará diligências semelhantes para apurar responsabilidades.
A inimaginável acumulação terá ocorrido enquanto desempenhava o cargo de diretor do INEM no Porto, trabalhando também como médico especialista em urgências hospitalares, em alguns hospitais algarvios. Ou outros.
A primeira dúvida prende-se com o verbo acumular: era diretor e também realizava urgências? E então? Não são esses mesmos serviços de urgência que frequentemente encerram ou funcionam de forma debilitada em determinados períodos do ano? Não é o próprio Ministério da Saúde que tenta contratar médicos em período de férias para colmatar falhas nos hospitais algarvios?
Relativamente ao próprio do “acumulador”, importa matutar: sendo especialista em urgências (quando é que passará a ser oficialmente uma especialidade médica em Portugal?), é perfeitamente natural que dirija o INEM, e que, além disso, realize algumas horas de serviço nos bancos hospitalares. Na especialidade em que é reconhecidamente bom e eficaz. Afinal, o verdadeiro problema só reside no dinheiro. Ganhava em várias frentes. Pois, mas trabalhava de sol a sol.
Se Gandra fosse voluntário, apenas porque é competente e gosta do que faz, ninguém se queixaria, nem denunciaria, levando-o à demissão. Isto confunde os portugueses?
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