1 Com o surgimento de vários movimentos que se reclamam da esquerda, a esquerda vai-se dividindo cada vez mais. Dividindo em nome da unidade, que em geral esses movimentos invocam e afirmam defender. Conseguirá algum daqueles movimentos, que deseja ser partido, constituir-se como tal? Um deles já resolveu o problema através da legenda do PTP, criado em 2009 e que nas últimas eleições europeias (ee) obteve 0,68% dos votos. Os outros, ver-se-á. Entretanto, recorde-se que com gente sobretudo saída do BE já se tinha constituído o MAS (0,38% nas ee), e gente da mesma procedência, ou próxima dela – como Rui Tavares – está na base do já partido Livre (2,18% nas ee) e de outros daqueles movimentos.
Tudo isto é legítimo e situa-se na “tradição” de uma certa esquerda, dita extrema. Em termos das legislativas, não parece que possam alcançar grandes resultados; ou até, dos novos, só por si, eleger algum deputado. Se o elegerem, será porventura “retirado” ao BE ou ao PS. E, mesmo não o elegendo, os votos que obtenham podem fazer com que seja a coligação PSD/CDS a ganhar deputado(s) em prejuízo do PS e/ou do BE. Por isso, o apelo ao “voto útil”, por parte deste dois partidos, será uma constante.
2 É neste contexto que António Costa afirma, tem de afirmar, que o PS não fará nenhuma aliança à direita. Primeiro disse que o PS nunca faria uma aliança com “este” PSD; mas, depois, apagou o “este” e generalizou a recusa. A explicação só pode estar no cenário acima descrito. Porque tendo o próximo Governo de ser maioritário, e podendo o PS ganhar as eleições sem maioria absoluta, não deveria afastar in limine a possibilidade de um acordo à direita, desde que um PSD com outra liderança aceitasse não inviabilizar o fundamental do programa com que se apresentará a sufrágio.
Isto é tanto mais assim quanto é certo ser tarefa muito difícil celebrar um acordo à esquerda, com o PCP e/ou o BE. Um dos erros históricos do PS, desde Mário Soares, foi sempre ter recusado alianças à esquerda, mesmo nas autárquicas, exceção feita em Lisboa com Jorge Sampaio; agora, o erro é de sentido inverso, negando qualquer hipótese de acordo à sua direita. Erro não na primeira formulação (recusa, imperativa, de uma aliança com “este” PSD), mas na segunda: sem prejuízo da fidelidade ao essencial, a avaliação do que é melhor para o País e as alianças só se pode(m) fazer no concreto, face à vontade expressa pelos cidadãos, aos resultados eleitorais e suas consequências nos próprios partidos.
3 Segundo as sondagens, o PSD terá com Miguel Albuquerque, nas eleições de domingo na Madeira, uma expressiva vitória que com Jardim já não teria. A ideia com que se fica é que o PS continua sem um líder regional forte – além de, como já aconteceu no Continente, o PSD conseguir dar voltas por dentro que lhe permite, ao aparecer com nova(s) cara(s), apresentar-se com as vantagens de ser outro, mantendo os benefícios de ser o mesmo… Isto significa também que se Passos Coelho, em prol do partido, resolvesse não se recandidatar nas legislativas, sendo substituído por Rui Rio, este teria grandes possibilidades de as ganhar. Mas sob este aspeto o PS pode estar descansado, pois o atual primeiro-ministro é daqueles que nunca abandonará o poder por sua própria decisão ou vontade.
4 Ainda não é hoje que falarei mais de espaço das presidenciais. Sublinho apenas que as suas perspetivas em nada são alteradas pela anunciada candidatura do estimável Henrique Neto (em cujas biografias não vejo referido, como se impõe sê-lo, a sua participação na oposição democrática à ditadura, em Leiria, ao lado de Vasco da Gama Fernandes e J. H. Vareda). Quero é deixar aqui uma nota final a propósito das numerosas críticas agora feitas ao governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, a propósito do BES, como há anos foram feitas ao seu antecessor, Vítor Constâncio, a propósito do BPN – e decerto serão feitas ao seu sucessor, se houver outro “caso” semelhante. Ora, sem excluir as falhas e omissões do regulador, o que se passa uma vez mais é querer culpar só ou sobretudo uma pessoa por situações que antes de tudo decorrem de um sistema – exatamente para o defender…