Eça de Queirós começou a escrever “Os Maias” por volta de 1875. Nunca utilizou a palavra “corrupção” nesta sua obra. Porém, evidencia um Portugal oitocentista em que o Estado era instrumento privado de empregos, concessões e honras, para benefício próprio ou do respetivo círculo.
Esta visão de um país com instituições frágeis, elites interessadas na sua autossubsistência e um Estado fraco está fortemente associado a menores níveis de desenvolvimento, diminui o investimento, aumenta custos e desvia recursos para rendimentos ilícitas, reduzindo o crescimento do PIB per capita e fomentando o aumento do preço nos consumidores.
A corrupção é um círculo pernicioso e vicioso: instituições fracas acabam por aumentar a corrupção, a qual, por sua vez, sucessivamente enfraquece ainda mais as instituições.
No Índice de Perceção da Corrupção 2024 (IPC) da Transparency International, Portugal obteve 57 pontos, fixando-se na 43ª posição, ao lado de países como o Botswana e o Ruanda.
Infelizmente, este é o pior resultado, tendo decrescido desde o primeiro registo, que foi de 63 pontos em 2012 (e obteve 64 pontos em 2018 e 2015).
Num momento em que é anunciado um novo pacote legislativo de combate a corrupção e novos instrumentos informáticos por parte do MENAC, convém evidenciar a relevância de reforçar o processo educacional contra a corrupção.
Reforçar o processo educacional ao nível dos diversos ciclos escolares obrigatórios, adaptado ao desenvolvimento etário dos alunos e que abranja igualmente o ensino superior, no sentido de criar cidadãos capazes de reconhecer práticas ilícitas, exigir transparência, igualdade e uma cultura de integridade.
Só cidadãos informados e exigentes, com formação ética, podem prevenir e reduzir o incentivo de recorrer a “favores” como estratégia de sobrevivência.
E por isso mesmo, a relevância de um elevador social que funcione para que a origem familiar pese menos no destino dos filhos e estes possam ter educação de qualidade, habitação condigna, mercado de trabalho e proteção. Senão, tal como na Idade Média, a condição dos pais determinará fortemente as oportunidades dos filhos, como um sistema imutável.
No seu reverso, é preciso que as instituições se mostrem à altura das suas funções constitucionalmente consagradas. E por isso mesmo, que cumpram a obrigação de prestar contas de forma transparente sobre ações, decisões e uso de recursos, permitindo o escrutínio e responsabilização por parte dos cidadãos a quem servem bem como outras instituições estatais.
A transparência e a accountability são pilares essenciais para que exista confiança nas instituições. Países com altos índices de transparência e accountability mais robusta têm uma menor perceção de corrupção.
Que no nosso dia-a-dia todos estejamos à altura das nossas responsabilidades!
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