Todas as crianças são únicas, irrepetíveis, dignas e merecedoras de respeito. Carregam consigo uma história pela qual não respondem, mas trazem um potencial imenso que devemos permitir que se transforme em realidade. A educação é, por excelência, o caminho para concretizar esse potencial.
A infância é o período de maior vulnerabilidade da vida. Depende-se de outras pessoas para satisfazer necessidades básicas e ainda não se pode escolher quem assume esse papel. Quando a esta vulnerabilidade se somam características que a agravam, como acontece com crianças migrantes, as dificuldades multiplicam-se.
Instrumentos jurídicos internacionais — como a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (UE) e a Estratégia do Conselho da Europa para os Direitos da Criança — impõem princípios claros: o superior interesse da criança como critério primordial em todas as decisões; a proibição da detenção por motivos de imigração, privilegiando alternativas centradas na proteção; o direito à vida familiar e à unidade familiar; e a participação da criança nas decisões que lhe digam respeito, adequada à sua idade e maturidade.
O novo Pacto Europeu para as Migrações e Asilo reforça estas obrigações, exigindo mecanismos específicos para crianças, incluindo as não acompanhadas, desde a entrada até à conclusão do procedimento. Recomendações da Agência dos Direitos Fundamentais da UE, do Conselho da Europa e das Nações Unidas convergem em três ideias centrais: (i) separação clara entre funções de controlo de fronteiras e funções de proteção da criança; (ii) nomeação rápida de uma pessoa tutora independente para cada criança desacompanhada ou separada; (iii) acesso efetivo a representação legal especializada, distinta da função de tutela.
Em Portugal, a criança não acompanhada fica sob curadoria designada pelo tribunal. Porém, não existe uma estrutura de tutela profissionalizada e independente vocacionada para crianças migrantes. A fragmentação das responsabilidades entre tribunais, segurança social, serviços de migração e organizações da sociedade civil gera entropias que comprometem a proteção efetiva. É urgente, por isso, avançar para um modelo normativo que consagre uma entidade coordenadora nacional única, responsável por organizar o registo e acompanhamento de todos os casos; definir perfis e assegurar formação especializada contínua para tutores; articular com órgãos de polícia criminal, serviços de migração, proteção de crianças e rede de acolhimento.
Esse modelo deve incluir a obrigação da pessoa tutora de garantir a matrícula escolar atempada, de acompanhar todo o percurso educativo e a transição para a formação profissional, de assegurar acesso a cuidados de saúde física e mental sensíveis ao trauma e ao contexto migratório e de promover integração comunitária através de redes locais e programas de mentoria.
Num momento em que a mobilidade humana continua a crescer e as sociedades enfrentam novos desafios sociais e educativos, a NOVA School of Law promove, no próximo dia 12, uma conferência dedicada ao direito à educação como meio de inclusão das crianças migrantes.
Desta forma, pretende-se contribuir para práticas e políticas mais humanas, justas e adequadas ao desenvolvimento integral de todas as crianças. Só assim poderão construir um futuro promissor.
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