A autoridade é um trunfo a usar em momentos urgentes, quando todas as outras ferramentas já se esgotaram. Tem um custo emocional alto e, praticada de forma sistemática, torna-se insustentável. Felizmente, cada vez mais treinadores e diretores percebem que liderar equipas de alto rendimento não é apenas definir estratégias ou repetir mantras motivacionais. É criar ambientes onde todos sintam que têm o seu papel, espaço para crescer, objetivos ambiciosos e, acima de tudo, fazem parte de algo identitário. E é aí que o desempenho coletivo ganha outra dimensão, fica mais consistente, mais contagiante, mais transcendente.
Basta olhar para quem já o faz bem. Carlo Ancelotti não impõe! Conquista o balneário com confiança, respeito e inteligência emocional. O resultado? Quatro Ligas dos Campeões como treinador. Phil Jackson, nos Chicago Bulls e nos Lakers, construiu relações de confiança inabaláveis com jogadores tão diferentes como Michael Jordan e Kobe Bryant. Já Steve Kerr, nos Golden State Warriors, reinventou o modelo coletivo da NBA dando liberdade real aos jogadores, e em troca, obteve lealdade, compromisso e títulos.
Na Europa, Xabi Alonso tem sido a prova de que o futuro da liderança no desporto passa também por saber ouvir. No Bayer Leverkusen, com uma equipa jovem, diversa e subvalorizada, conquistou o primeiro campeonato da história do clube sem uma única derrota. Fez os jogadores acreditarem mais em si mesmos e uns nos outros. Criou um clima onde o erro não era punido com medo, mas aproveitado como oportunidade de melhoria.
Por cá, vi sinais semelhantes no Rúben Amorim, que mesmo jovem, foi capaz de transformar o Sporting numa equipa unida, com cultura forte, onde os jogadores queriam ficar e evoluir. Mais do que carisma ou disciplina, o que todos estes treinadores têm em comum é a capacidade de criar segurança psicológica. Algo que hoje sabemos ser o verdadeiro segredo das equipas excecionais.
E este ponto é ainda mais relevante quando falamos das novas gerações de atletas. Jovens mais sensíveis ao ambiente, menos dispostos a aceitar lideranças autoritárias e mais exigentes quanto à coerência entre discurso e prática. Cresceram a ouvir falar de saúde mental, diversidade, bem-estar e propósito. Querem sentir-se parte de algo em que acreditam. Exigem mais escuta, mais feedback, mais transparência.
Não se trata de abdicar da exigência. Pelo contrário: ambientes seguros emocionalmente permitem assumir mais riscos, dar mais feedback, debater decisões, admitir erros e continuar a crescer. Equipas com esta cultura rendem mais, duram mais e formam líderes em todos os níveis.
É urgente termos mais profissionais preparados para ajudar a construir este tipo de ambientes. Profissionais com conhecimento técnico, mas também inteligência relacional e pensamento sistémico. E sim, os psicólogos do desporto têm aqui um papel decisivo, seja a trabalhar com os atletas, com as lideranças ou com toda a cultura organizacional.
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